Rio de Janeiro, 22 de Novembro de 2024

Rio reabre o Cais do Valongo, marco da escravidão no país

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Segunda, 20 de Novembro de 2023 às 15:06, por: CdB

Exatos 200 anos depois, em 2011, obras de reurbanização levaram ao resgate do sítio arqueológico. Agora, após seis meses de obras de revitalização, o local reabre na próxima quinta-feira.


Por Redação, com RBA - do Rio de Janeiro


Construído em 1811, o Cais do Valongo, na Zona Portuária do Rio de Janeiro, chegou a ser o principal ponto de desembarque e comércio, na América, de escravos trazidos da África. Parou oficialmente de funcionar em 1831, mas o local continuou na ativa, de forma clandestina. Estima-se que até 1 milhão de pessoas escravizadas passaram por ali.




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Estima-se que até 1 milhão de escravizados foram desembarcados naquele local, sítio arqueológico foi descoberto em 2011

Exatos 200 anos depois, em 2011, obras de reurbanização levaram ao resgate do sítio arqueológico. Agora, após seis meses de obras de revitalização, o local reabre na próxima quinta-feira.


“A memória afro-brasileira associada ao sítio tentou ser apagada em dois momentos. Em 1843, o Cais foi ampliado e reparado para a chegada da futura imperatriz Tereza Cristina, que vinha para casar com D. Pedro II. Passou a ser reconhecido, então, como Cais da Imperatriz. Já na república, em 1911, foi aterrado para dar lugar à Praça do Comércio. Entre os vestígios arqueológicos expostos atualmente no sítio encontram-se também elementos do Cais da Imperatriz”, informa o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).



Memória sensível


Em 21 de março, Dia Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial, o Iphan reinstituiu o Comitê Gestor do Sítio Arqueológico Cais do Valongo. Desde 2017, o local passou a ser reconhecido como Patrimônio Mundial pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Na categoria “sítio de memória sensível”, que inclui, por exemplo, o campo de concentração de Auschwitz, na Alemanha, e a cidade de Hiroshima, no Japão. “Trata-se de locais de memória e sofrimento da humanidade”, lembra o instituto.


Assim, toda aquela região no entorno do Valongo passou a ser chamada de Pequena África. A denominação é atribuída ao compositor e pintor carioca Heitor dos Prazeres. Um lugar que testemunhou a chegada e a presença africana e negra em áreas próximas ao centro do Rio. Histórias de dor e sobrevivência – e do nascimento de uma nova cultura brasileira. Desde 2012, por sugestão do movimento negro, a prefeitura abriu o espaço para visitação pública, incluindo a área no Circuito Histórico e Arqueológico da Celebração da Herança Africana.



Memória e reparação


O retorno do comitê gestor, que havia sido extinto em 2019, foi celebrado em março com a visita de uma comitiva oficial ao Valongo. Os planos incluem a criação de um museu ou memorial. “A gente está aqui para reafirmar um compromisso com o povo preto, com a memória e a reparação que a gente tem nesse lugar, um lugar histórico”, afirmou na ocasião a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco.


Em setembro, a arqueóloga carioca Tania Andrade Lima tornou-se a segunda mulher brasileira a receber o prêmio internacional Hypatia, concedido pela Confederação dos Centros Internacionais para a Conservação do Patrimônio Arquitetônico. Ela foi escolhida, entre 10 homenageados neste ano, pela redescoberta do Valongo em 2011. A primeira mulher homenageada foi a também arqueóloga Niède Guidon, em 2020, pelo trabalho no Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí, reconhecido como Patrimônio Cultural da Humanidade.


Para Tania, a principal premiada foi a própria arqueologia, nem sempre valorizada pela capacidade de trazer à tona “verdades indesejáveis, dolorosas, que muitos desejam esquecer ou ignorar”. Assim, reconhecer obras como o Valongo mostra que grande parte da humanidade rejeita o racismo e o preconceito.


Quem também recebeu o Prêmio Hypatia neste ano foi o padre Júlio Lancellotti, do Pastoral do Povo de Rua em São Paulo. Ele se destacou por combater a arquitetura “hostil” a moradores de rua, que impede essas pessoas de se abrigar em espaços públicos. Em 2021, uma cena tornou-se famosa: o padre usou uma marreta para destruir pedras colocadas sob um viaduto na zona leste da cidade.




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