Gestão Bolsonaro volta a ter repasses suspeitos a ONG de atletas
As instituições dos atletas tiveram projetos aprovados no ano passado para realização de cursos de esportes, mesmo sem experiência prévia. De acordo com a reportagem, a assinatura dos convênios só foi possível porque os atletas driblaram exigências legais usando as chamadas "ONGs de prateleira".
As instituições dos atletas tiveram projetos aprovados no ano passado para realização de cursos de esportes, mesmo sem experiência prévia. De acordo com a reportagem, a assinatura dos convênios só foi possível porque os atletas driblaram exigências legais usando as chamadas "ONGs de prateleira".
Por Redação, com Brasil de Fato - de Brasília
Daniel Alves, Emerson Sheik e Léo Moura... Esses nomes não são da escalação de um time de futebol brasileiro, mas integram a lista de jogadores que se envolveram em casos suspeitos de repasses do governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) a ONGs que teoricamente pertencem a jogadores de futebol.
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Nesta terça-feira, o jornal Folha de S.Paulo mostra que o Executivo autorizou o repasse de R$ 6,2 milhões a duas organizações até então inativas e recém-assumidas pelo ex-jogador Emerson Sheik e pelo lateral-direito Daniel Alves, até hoje jogador da Seleção Brasileira e do Barcelona.
As instituições dos atletas tiveram projetos aprovados no ano passado para realização de cursos de esportes, mesmo sem experiência prévia. De acordo com a reportagem, a assinatura dos convênios só foi possível porque os atletas driblaram exigências legais usando as chamadas "ONGs de prateleira".
O recurso repassado às organizações tem origem em emendas parlamentares solicitadas por deputados da base do governo. Nos dois casos, a verba já foi empenhada (reservada no Orçamento). O pagamento, contudo, ainda não foi realizado.
Do Corinthians à política?
Ídolo do Corinthians, o agora comentarista esportivo Emerson Sheik assumiu, em dezembro de 2019, o Instituto Qualivida, fundado há 26 anos, mas que nunca realizou projetos sociais voltados aos esportes. Logo em seguida, o ex-jogador alterou o estatuto, os membros e o nome da instituição.
O Instituto Emerson Sheik, novo nome da ONG, apresentou em julho do ano passado seu primeiro projeto ao governo federal. Em dezembro, foi assinado o convênio para a instalação de três núcleos esportivos em Mangaratiba (RJ) e Queimados (RJ) por R$ 2,7 milhões.
Sheik tem longa relação com integrantes da família Bolsonaro, como o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e a ex-esposa do presidente Jair Bolsonaro, Rogéria. Na virada do ano, passou o revéillon ao lado do secretário-adjunto de Esportes do governo federal, André Barbosa Alves.
A verba na ONG de Sheik foi alocada a partir de uma emenda parlamentar a pedido do deputado Hélio Lopes (PL -RJ).
DNA de campeão
O Instituto DNA, de Daniel Alves, firmou contrato de R$ 3,5 milhões em dezembro com a secretaria nacional de Esporte para instalar núcleos de basquete 3x3 na Bahia, Pernambuco e Distrito Federal. A entidade chamava-se Instituto Liderança até maio do ano passado e tinha como responsável Leandro Costa de Almeida, ex-treinador de basquete.
A ONG estava inativa havia cinco anos. Antes de assumir a organização, Daniel Alves já havia fundado seu próprio instituto com seu nome em março de 2021. Segundo o diretor técnico da ONG, Rodrigo Valentim, verificou-se depois da fundação desta entidade a necessidade de existência de três anos para firmar convênios com o governo federal.
Com a "adequação", a verba federal foi obtida por meio de emenda do relator do Orçamento, a pedido da deputada Celina Leão (PP-DF). A deputada emprega em seu gabinete Ana Cristina Valle, ex-mulher de Bolsonaro.
ONGs de "prateleira"
Membros do Ministério Público e deputados ouvidos pela Folha afirmam que "ONGs de prateleiras" têm sido usadas para escapar da regra que estabelece a necessidade de as entidades da sociedade civil existirem há pelo menos três anos para firmar acordos com o governo federal.
Outro lado
O jornal procurou todos os envolvidos na denúncia. Emerson Sheik acusou recebimento do pedido de esclarecimentos da Folha, mas não respondeu às perguntas no prazo estabelecido. A ONG de Daniel Alves defendeu o financiamento e justificou o "drible" com a "ONG de prateleira" dizendo que o arranjo amplificou o apoio a crianças.
O Ministério da Cidadania afirmou, em nota, que "não há ilegalidade na celebração das parcerias". "As duas entidades apresentaram atestado de capacidade técnica e possuem histórico de projetos realizados na área do esporte", diz a pasta, que se recusou a responder qual o "histórico de projetos realizados".
Caso Léo Moura
Em agosto de 2021, a Folha de S.Paulo mostrou que o Instituto Léo Moura, ONG do ex-jogador de mesmo nome do Flamengo e do Grêmio, também foi envolvido em caso similar. O ex-atleta foi responsável por firmar convênios de pelo menos R$ 34,8 milhões com o governo em 2021. O feito também foi possível graças a Bolsonaro e congressistas aliados.
O valor foi o maior repasse previsto para uma única entidade em ações federais ligadas ao esporte no ano das Olimpíadas. Além disso, o valor se aproxima de todo o pagamento de bolsa a atletas feito em 2020 (R$ 44 milhões) e cerca de 25% dos R$ 145,2 milhões previstos para apoiar os mesmos competidores neste ano.