O autor, Euclides da Cunha, cunhou a expressão ao narrar a bravura do sertanejo ao enfrentar o Exército, em uma guerra desigual pela permanência em Canudos.
Por Redação, com ABr - do Rio de Janeiro
“O sertanejo é, antes de tudo, um forte”. A frase que se tornou símbolo da resiliência do nordestino diante da seca foi escrita há quase 120 anos nas páginas de Os Sertões.
O autor, Euclides da Cunha, cunhou a expressão ao narrar a bravura do sertanejo ao enfrentar o Exército, em uma guerra desigual pela permanência em Canudos.
Na obra, um clássico da literatura nacional, Euclides enfrentou o próprio preconceito para enxergar o conflito. Aos poucos, ele próprio baixou a guarda e deixou o leitor ver como a situação desafiou a visão que tinha do Brasil.
Pela dimensão de Os Sertões, Euclides da Cunha será o homenageado este ano pela 17ª Festa Literária Internacional de Paraty (Flip). Será entre os dias 10 e 14 de julho, na tradicional cidade histórica do sul do Estado do Rio.
Paraty este ano pode se tornar patrimônio mundial da humanidade, título dado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura - Unesco.
A escolha dos participantes foi feita pela jornalista Fernanda Diamant, que escalou 33 autores de 10 nacionalidades. A maioria é de mulheres.
– Os Sertões pode ser considerado um dos primeiros clássicos brasileiros de não ficção. Mistura jornalismo, geografia, filosofia, teorias sociais e científicas - muitas delas ultrapassadas - para falar de um país em transição – afirma a curadora, em nota da organização.
– A obra mudou o entendimento que se tinha sobre o interior do país e o sertanejo. Além de ser grande literatura do ponto de vista da forma, ela faz críticas morais, políticas e sociais altamente pertinentes no Brasil de hoje. Mais que tudo, mostra a transformação existencial de um homem que entra contato com uma realidade desconhecida e precisa reorganizar seus valores – explica.
Programação
– A relação de Euclides da Cunha com as diversas linguagens, ele também era professor, historiador, geógrafo, engenheiro e jornalista, foi correspondente do Jornal Estado na Guerra de Canudos – orientou a curadora.
Diamant promete 21 mesas na programação que discutam a atualidade do ponto de vista de várias formas de arte. Os debates este ano serão mais curtos, terão 45 minutos e poderão ser no formato de conferência, performance ou entrevista.
Para o diálogo, a Flip traz jovens expoentes da literatura nacional e internacional. Entre eles, a cordelista cearense Jarid Arraes, autora de Heroínas negras brasileiras em 15 cordéis, a escritora norte-americana Kristen Roupenian, de Cat Person, e a portuguesa Grada Kilomba, autora de Memórias da Plantação: episódios do racismo cotidiano. Kilomba tem ressignificado o conceito do “outro”, criado por Simone de Beauvoir – que defende que a mulher é o “outro” em relação ao homem.
Para ela, a mulher negra é “o outro do outro”, por não ser nem branca, nem homem. Ela já foi citada como uma das influências da filósofa brasileira Djamila Ribeiro.
Outra jovem escritora de destaque é a nigeriana Ayobami Adebayo, do romance premiado Fique comigo.
– A escrita de Adébáyò é viva e cativante, o livro (Fique Comigo) é desses que você não consegue largar. É uma história comovente e emocionalmente forte sobre relações familiares. Essa narrativa e as questões sobre tradição e modernidade, masculino e feminino, criam uma grande estreia literária – destaca Diamant, no perfil da autora no site da Flip.
Nomes consagrados
Entre nomes já consagrados, participam da Flip este ano o historiador José Murilo de Carvalho, a professora de teoria literária Walnice Galvão, que abre a festa, e a escritora e crítica literária Marilene Felinto, dona de um prêmio Jabuti.
Eles discutem o país de Os Sertões e o atual. “Em seus textos, Felinto toca em questões de gênero, raça e condição social no Brasil de forma original sem perder atualidade, ao mesmo tempo de forma lírica e irônica”, acrescenta a curadora.
Ainda no âmbito da atualidade, José Miguel Wisnik parte da crítica de Carlos Drummond de Andrade à atividade mineradora para dialogar sobre os desastres ambientais nas cidades de Brumadinho e Mariana.
O tema conta também com a expertise da jornalista Cristina Serra, autora de uma série de reportagens sobre Mariana. Entra na discussão, trazendo debate sobre aquecimento global, o jornalista norte-americano David Wallace-Welles, da New Yorker.
Paralelamente à programação oficial, 22 casas parceiras organizam mostras, palestras e rodas de conversas com artistas e autores.
A programação desses espaços será anunciada nas próximas semanas. São esperadas ainda apresentações de grandes nomes da música.
Os ingressos para a Flip começam a ser vendidos em 3 de junho e devem custar R$ 55.
Os organizadores pretendem montar uma tenda batizada Auditório da Matriz, em referência à Igreja da Matriz, com capacidade para 512 pessoas. Uma outra tenda, com 700 lugares, será montada para quem quiser presenciar a reprodução dos eventos gratuitamente.