Os destaque ficaram mesmo para os enredos, que homenageiam personalidades e histórias da população afro-brasileira, como a cantora Alcione (Mangueira), o livro ‘Um Defeito de Cor’ (Portela), o almirante negro João Cândido (Tuiuti) e divindades africanas (Viradouro).
Por Redação - do Rio de Janeiro
Os desfiles na Marquês de Sapucaí, Centro no Rio de Janeiro, vararam a madrugada no segundo e último dia apresentação das escolas de samba do Grupo Especial. Mais seis agremiações entram na avenida em busca do título de campeã do carnaval carioca.
Os destaque ficaram mesmo para os enredos, que homenageiam personalidades e histórias da população afro-brasileira, como a cantora Alcione (Mangueira), o livro ‘Um Defeito de Cor’ (Portela), o almirante negro João Cândido (Tuiuti) e divindades africanas (Viradouro).
Cada agremiação teve entre 1 hora e 1 hora e 10 minutos para atravessar a Sapucaí. Houve penalização para aquelas que não conseguiram concluir sua apresentação a tempo. De acordo com a programação, o último desfile começou logo depois das 3h.
Enredos
Primeira escola a desfilar nesta segunda-feira, a Mocidade Independente de Padre Miguel trouxe para a avenida enredo com o título ‘Pede caju que dou... Pé de caju que dá!’, comandado pelo carnavalesco Marcus Ferreira. Como anuncia o nome, a escola verde e branca celebrou a importância do caju na cultura nacional. A ideia foi contar a história da fruta nativa dos povos originários até os dias atuais, com referências a ícones da música popular brasileira, como “Cajuína”, de Caetano Veloso, e “Morena Tropicana”, de Alceu Valença.
Os versos trazem bom humor e duplo sentido, com o caju sendo transformado também em um símbolo de sensualidade. Além disso, a intenção era explorar um conjunto de cores vibrantes, para enaltecer a alegria e diversidade do país. Em um dos carros alegóricos, que fala do caju e da tecnologia de produção, estiveram presentes 500 cajueiros anões, também chamados de clones, doados pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).
Defeito de cor
Na sequência, a Portela apresentou o enredo ‘Um defeito de cor’, baseado no livro homônimo de Ana Maria Gonçalves. No romance, Kehinde, mulher escravizada na África, que viveu boa parte da vida no Brasil, procura um filho perdido, que seria Luiz Gama, famoso abolicionista, jornalista, poeta e advogado brasileiro. Os carnavalescos Antônio Gonzaga e André Rodrigues propuseram uma continuação ou outra perspectiva da história.
No samba, é Luiz Gama que escreve uma carta para a mãe e expressa orgulho pela trajetória de luta e resistência. E destaca que o afeto e o amor da mãe foram essenciais na vida dele. A ideia geral é homenagear a ancestralidade feminina negra. Falar de gerações de escravizados, lutas de libertação e das mães negras que construíram o país.
Paulo Barros
A Unidos de Vila Isabel apresentou o enredo ‘Gbalá — viagem ao Templo da Criação’, liderado pelo carnavalesco Paulo Barros. Foram narradas histórias yorubá desde que a humanidade existe. É uma reedição do enredo que foi trazido pela escola para a avenida em 1993.
Os versos atualizam a mensagem anterior, com uma leitura mais atual sobre a responsabilidade humana com o planeta e as gerações futuras. Assim, foram abordados desde os males que o ser humano pode fazer no planeta, até a possibilidade de reconstrução, a partir da esperança trazida pelas crianças.
Alcione
A Mangueira vai celebrar a história de vida da cantora Alcione por meio do enredo ‘A negra voz do amanhã’, que tem a frente os carnavalescos Annik Salmon e Guilherme Estevão. Ícone do samba, da música brasileira e da escola do morro da Mangueira, Alcione vai ser apresentada desde a infância no Maranhão, onde nasceu, até a construção da vida artística no Rio de Janeiro.
Em 2024, a cantora completa 50 anos de carreira. A Mangueira falou sobre as crenças familiares de Alcione, da importância dela como ícone feminino e negro; além de reforçar o papel da artista na inspiração e formação de talentos da música nacional. Os versos apresentam referências aos principais sucessos da artista.
Almirante negro
A Paraíso do Tuiuti, do carnavalesco Jack Vasconcelos, apresentou o enredo ‘Glória ao Almirante Negro’, sobre a trajetória revolucionária de João Cândido Felisberto, conhecido por liderar a Revolta da Chibata, em 1910. No episódio, o levante pretendia acabar com as práticas violentas e maus tratos da Marinha aos marinheiros, na maioria, negros.
Na época, o governo acaba cedendo às demandas por melhores condições de tratamento e trabalho. Mas muitos dos revoltosos são punidos com demissões, prisões e exílios.
João Cândido foi desligado da Marinha e passou os últimos dias de vida como pescador. O objetivo da escola foi mostrar o almirante a partir de um contexto geral de luta e resistência.
Serpente
Coube à Unidos do Viradouro encerrar os desfiles, com o enredo ‘Arroboboi, Dangbé!’, liderado pelo carnavalesco Tarcísio Zanon. Foi contado na Avenida o mito de uma serpente vodum, que se tornou uma divindade após épica batalha entre reinos da antiga região da Costa da Mina, na África.
O enredo destacou a atuação de um poderoso exército de mulheres negras preparado por sacerdotisas voduns, que tinham no espírito da coletividade e lealdade sua principal arma. A missão da escola é desmistificar o culto aos voduns, que atravessou o atlântico e chegou ao Brasil na figura da sacerdotisa Ludovina Pessoa, pilar de terreiros na Bahia.
Nesta Quarta-feira de Cinzas, com a apuração do Carnaval, será conhecida a mais nova campeã do Carnaval Carioca.