Bolsonaro disse nos Estados Unidos que o Brasil alimenta um bilhão de pessoas no mundo. Talvez; mas falta alimentar 33 milhões de brasileiros para quem não há comida. Falta alimento? Não: falta administração. E, embora não falte dinheiro para mordomias nos três Poderes, jet-skys, motociatas, falta dinheiro para dar de comer a quem tem fome.
Resultado: na pré-escola, há R$ 0,53 para encher o prato dos garotos da pré-escola, que ou se alimentam direito ou têm a saúde prejudicada para sempre. Os alunos do Fundamental e do Médio têm menos ainda, R$ 0,36 por pessoa. No ensino em tempo integral o custo vai de R$ 1,07 a R$ 2,00. Não é só isso: em muitos casos, a merenda escolar é a única refeição do dia.
Por Carlos Brickmann
Aos números: em 2009, no fim de seu segundo mandato, Lula criou o PNAE, Programa Nacional de Alimentação Escolar. Dilma assumiu, manteve o PNAE no mesmo valor. Temer assumiu, manteve o PNAE no mesmo valor. Bolsonaro também não mexeu em nada: para todos foi mais confortável fingir que não houve aumento de população de 2010 até 2022 e os preços não subiram em 13 anos.
Resultado: na pré-escola, há R$ 0,53 para encher o prato dos garotos da pré-escola, que ou se alimentam direito ou têm a saúde prejudicada para sempre. Os alunos do Fundamental e do Médio têm menos ainda, R$ 0,36 por pessoa. No ensino em tempo integral o custo vai de R$ 1,07 a R$ 2,00. Não é só isso: em muitos casos, a merenda escolar é a única refeição do dia.
Num país em que cada parlamentar tem até 80 assessores, os ministros do Supremo têm funcionários para puxar suas cadeiras, o presidente precisa colocar seus gastos no cartão em sigilo para evitar escândalo, candidatos usam bilhões públicos para a campanha, há gente que não sabe quando vai comer. Os campeões de gastos brigam entre si. Os famintos que se danem.
Alguém contesta?
Quem fez o brilhante levantamento foi a repórter Laura Mattos, da “Folha de S.Paulo”. Não há um pingo de partidarismo neste notável trabalho. Só há números, só há fatos: o PNAE deve atender a 40 milhões de estudantes de escolas públicas. Certas categorias profissionais mais iguais que as outras compram filé-mignon, salmão, picanha, com recursos públicos. Quem não tem o que comer simplesmente não come. Não, não há qualquer tentativa de reduzir gastos públicos. É como se os famintos simplesmente não existissem.
Sentindo-se em casa
Mas é injusto responsabilizar certas despesas de Bolsonaro pela falta de verbas essenciais. Agora, foi a Los Angeles participar da Cúpula das Américas (e se disse encantado com o presidente Biden). E, já que estava por lá, resolveu voar 3.500 km para inaugurar um vice-consulado que existe desde janeiro, em Orlando – onde fica a Disneyworld. Como perder a oportunidade? É lá que estão o Pateta, os Irmãos Metralha, João Bafodeonça, o rato Mickey.
Há até o Zé Carioca, que se veste igualzinho a um eleitor dele.
Armas, armas às mancheias
Anote: falta comida para alimentar 33 milhões de pessoas, falta dinheiro para a merenda escolar de 40 milhões de crianças, mas para armas o dinheiro sobra. A Polícia Militar do Rio vai entregar uma arma de fogo do Estado, gratuitamente, para 10 mil PMs da reserva remunerada. Cada PM aposentado poderá pedir três carregadores e um mínimo de 50 balas. Motivo? Segundo o porta-voz da PM, Ivan Blaz, os soldados reservistas poderão usar as armas para fazer “bicos” particulares como seguranças.
Com o nosso dinheiro.
A área dos desaparecidos
Faz tempo, muito tempo, mas este repórter conheceu a região da Tríplice Fronteira amazônica, onde estão Tabatinga (Brasil), Santa Rosa (Peru) e Letícia (Colômbia). Letícia e Tabatinga são, na prática, uma cidade só. Em Tabatinga há uma base aérea brasileira. Letícia é, há uns cem anos, a capital da Tríplice Fronteira (o Governo colombiano se preocupa com ela, que já foi uma vez invadida pelos peruanos). E, desde a década de 60, a cocaína vai de lá para o Exterior. A guerrilha movida pelas FARCs providenciou armas de primeira linha para os traficantes. Derrotadas as FARCs, parte de suas forças decidiu continuar na ilegalidade, traficando drogas. Ali operam o Comando Vermelho, CV, com base no Rio de Janeiro; e a FDN, Família do Norte, com gente da própria região. Aos traficantes, com quem colaboram e que lhes dão segurança, se aliam madeireiros e garimpeiros ilegais. E todos se beneficiam do desmonte do aparato de defesa dos índios e de proteção à floresta: ficou bem mais fácil a vida para os ilegais.
Difícil já não era: não só o Javari e outros inúmeros rios e igarapés, mas até o Solimões (que irá se tornar Amazonas após receber as águas do Rio Negro), são excelentes rotas de fuga.
É nessa área, onde prosperam atividades ilegais de todos os tipos, onde o crime organizado opera com certa tranquilidade cruzando fronteiras, que Dom Phillips e Bruno Pereira estão desaparecidos.
Como é mesmo? Já está em vigor desde quarta-feira a norma da Anatel segundo a qual as operadoras de telemarketing são obrigadas a usar o código 0303. Dizem que, assim, o cliente pode decidir se quer ou não atender à chamada.
OK, só que não é assim: praticamente todas as chatíssimas chamadas de telemarketing chegam pelo meu telefone com fio – e aí, como descobrir o prefixo do chato? (Publicado originalmente no blog Chumbo Gordo)PorCarlos Brickmann, jornalista, editor do blog Chumbo GordoDireto da Redaçãoé um fórum de debates publicado no jornal Correio do Brasil pelo jornalista Rui Martins.