Artistas da Suécia, que sediará a competição neste ano, juntaram-se a apelos de colegas da Islândia e da Finlândia. Manifesto acusa o país de cometer "crimes de guerra" no conflito contra o Hamas em Gaza.
Por Redação, com DW - de Bruxelas
Após artistas da Islândia e da Finlândia pedirem a exclusão de Israel do Festival da Canção Eurovision de 2024, vozes da Suécia, país anfitrião do evento neste ano, também se manifestaram nesse sentido.
Mais de mil artistas suecos assinaram uma carta aberta contra a participação de Israel na competição, incluindo nomes famosos, como Fever Ray e Robyn, e veteranos do concurso, como a estrela de ópera Malena Ernman – que se apresentou na competição em 2009 e é mãe da ativista climática Greta Thunberg.
A carta alega que as Forças de Defesa de Israel teriam cometido "graves crimes de guerra", e cita que mais de 25 mil palestinos, incluindo mais de 10 mil crianças, foram mortos nos primeiros 100 dias da guerra de Israel contra o grupo radical islâmico Hamas.
"O que está acontecendo em Gaza é um desastre humanitário", afirma a carta, que critica a intenção da União Europeia de Radiodifusão (EBU) de permitir que Israel participe do concurso de música. O manifesto é direcionado à EBU, organizadora do Eurovision, e contesta a alegação da entidade de que a competição seria apolítica.
Em 2022, a EBU excluiu a Rússia da competição após a invasão da Ucrânia, lembrou a carta. Belarus também já havia sido excluída um ano antes, por causa de sua forma de lidar com os direitos humanos e a liberdade de imprensa, citou o documento.
A Suécia venceu o Eurovision em 2023, levando a competição para seu país pela sétima vez. O Eurovision será realizado em maio na cidade de Malmo.
O Eurovision é realmente apolítico?
Opiniões políticas, inclusive sobre o conflito israelo-palestino, têm sido com frequência manifestadas em conexão com o evento. Isso ficou particularmente evidente quando Tel Aviv sediou a competição em 2019.
No ano anterior, a cantora israelense Netta havia vencido o Eurovision em Lisboa com seu brilhante apelo à diversidade e à autoconfiança, levando a competição do ano seguinte para Tel Aviv.
Pequenas manifestações pró-palestinas ocorreram à margem do evento, mas receberam pouca atenção devido aos milhares de fãs do Eurovision que queriam apenas se divertir em Tel Aviv.
Na noite da final, a banda islandesa Hatari ergueu faixas pró-Palestina em frente às câmeras, violando as regras da competição. A emissora islandesa RUV teve de pagar uma multa de 5 mil euros à EBU.
Ao se apresentar no evento naquela mesma noite, Madonna escalou um dançarino com uma bandeira israelense e outro com uma bandeira palestina que apareceram de braços dados. A estrela americana disse mais tarde que era uma "mensagem de paz e união". A EBU não ficou tão entusiasmada.
Embora as regras do concurso especifiquem que qualquer promoção de mensagens políticas é proibida, o regulamento foi várias vezes violado no passado.
No evento de 2023 em Liverpool, realizado no Reino Unido em nome da Ucrânia, que venceu em 2022, foram exibidas bandeiras azuis e amarelas como uma marca de solidariedade ao país submetido à guerra de agressão da Rússia.
Os pedidos de boicote a Israel
Em meados de janeiro, cerca de 1,4 mil músicos finlandeses assinaram uma petição para que Israel seja excluído do Eurovision. "Não é compatível com nossos valores que um país que comete crimes de guerra e prossiga com uma ocupação militar receba um palco público para polir sua imagem em nome da música", afirma o texto.
Uma campanha semelhante havia sido realizada anteriormente na Islândia.
Na Noruega, manifestantes do Aksjonsgruppa for Palestine (Grupo de Ação para a Palestina) reuniram-se em frente à sede da estação de televisão NRK em Oslo e exigiram que o país também apoie a exclusão de Israel, segundo relatos da mídia local.
Na Irlanda, um deputado trabalhista pediu um boicote ao Eurovision caso Israel siga na competição. Como a Irlanda tem sido o país mais bem-sucedido na história do evento, ele avaliou que seu pedido seria seguido pelos outros participantes. No entanto, o primeiro-ministro irlandês Leo Varadkar se opôs ao boicote, declarando que a participação de Israel no Eurovision era uma questão da EBU.
O candidato britânico ao Eurovision, Olly Alexander, assinou um manifesto pró-palestina elaborado por uma aliança queer, que chama os eventos em Gaza de "escalada do regime de apartheid israelense em Israel".
A embaixada israelense em Londres reagiu: "Especialmente neste momento, a decisão da BBC de enviar um participante para o Eurovision que defende visões tão parciais de Israel e promove uma linguagem tão desumanizadora dos israelenses é um grande motivo de preocupação."
O embaixador israelense na Suécia também expressou sua opinião: "Em 7 de outubro,Israel foi brutalmente atacado por uma organização terrorista cruel que clama abertamente por sua aniquilação. Promover um boicote a Israel é apoiar os atos do Hamas, é dar um prêmio ao terrorismo e é incompatível com os valores da (EBU) e da competição."
O Hamas é classificado como uma organização terrorista pela União Europeia, Alemanha e Estados Unidos, entre outras nações.
A EBU vem repetindo seu mantra de que o Eurovision é apolítico e rejeitou as acusações de que tem dois pesos e duas medidas, afirmando que o ataque russo à Ucrânia não pode ser comparado às ações de Israel em Gaza.
Por que Israel participa do Eurovision?
Israel fez sua estreia no Eurovision em 1973. Na época, o evento ainda era chamado de Grand Prix Eurovision de la Chanson. Desde então, Israel é membro da EBU, uma associação que atualmente conta com 68 emissoras em 56 países da Europa, Norte da África e Oriente Médio.
Israel não é o único país não europeu a participar da competição, a Armênia e o Azerbaijão também participam. Belarus fez sua estreia em 2004, mas foi suspensa em 2021 porque a música que o país queria apresentar fazia piada com os protestos contra o ditador Alexander Lukashenko.
A Austrália é considerada o país "mais exótico" do Eurovision, e participa desde 2015. Ela entrou no concurso porque já havia uma enorme base de fãs do evento no país, e agora é membro associado da EBU.
A associação agrupa muitas estações de rádio e países além das fronteiras europeias, e é por isso que o evento é chamado de Eurovision Song Contest, e não de European Song Contest.
Israel é um dos participantes mais bem-sucedidos da competição: venceu o concurso quatro vezes, e ficou em segundo ou terceiro lugar quatro vezes. O país também nunca ficou em último lugar, ao contrário da Alemanha.
Seleção em Israel em andamento
Apesar da guerra em Gaza, seguem em curso os preparativos para a participação de Israel em Malmo. O programa HaKokhav HaBa: The Next Star, no qual os candidatos se apresentam para participar do Eurovision, havia sido adiado devido ao início da guerra, mas agora está sendo realizado, ainda que de forma inconstante e sem pessoas na platéia: reunir tantas pessoas em um estúdio de TV foi considerado perigoso.
Entre os cantores no programa do show estava um tenente do exército israelense que morreu na Faixa de Gaza poucas semanas depois de sua aparição na TV.
Alguns relatos na mídia israelense e em redes sociais questionaram se um programa como esse seria apropriado em tempos de guerra. Entre os principais críticos estão os parentes dos reféns que ainda estão sob poder do Hamas.
Mas o show israelense deve continuar por enquanto, embora os organizadores digam que ele é menos colorido e alegre do que o habitual. Os apresentadores disseram que não será uma temporada normal, e sim adaptada à situação. "Mas temos certeza de que um pouco de música só pode ajudar."