Rio de Janeiro, 05 de Dezembro de 2025

Cineasta carioca desaparecido em Gaza é deportado para a Jordânia

Miguel Viveiros de Castro, cineasta carioca, foi deportado por Israel após ser detido em missão humanitária. Conheça sua história e o impacto da Global Sumud Flotilla.

Quarta, 08 de Outubro de 2025 às 12:02, por: CdB

Miguel Viveiros de Castro estava a bordo de um dos veleiros da flotilha internacional interceptada por militares israelense.

Por Redação, com Agenda do Poder – do Rio de Janeiro

O cineasta e ativista carioca Miguel Viveiros de Castro foi deportado por Israel na terça-feira após ser detido durante a interceptação da missão humanitária Global Sumud Flotilla, que levava alimentos e remédios à Faixa de Gaza, informa o portal g1. A embarcação em que ele viajava, o veleiro Catalina, foi abordada na madrugada de 1º de outubro por militares israelenses. Ele perdeu contato com a família e chegou a ser considerado desaparecido, mas foi levado para a Jordânia com outros ativistas onde, segundo ele, estão bem.

Cineasta carioca desaparecido em Gaza é deportado para a Jordânia | Miguel Viveiros de Castro, de 36 anos, está desaparecido
Miguel Viveiros de Castro, de 36 anos, está desaparecido

Em relato gravado após a deportação, o cineasta descreveu a operação de interceptação e a prisão. “Eles entraram armados, com mira-laser, apontando para todos, mas logo que foi controlado, foi mais ou menos ok”, contou. Após a abordagem, o grupo foi levado ao porto de Ashdod, em Israel, onde, segundo ele, houve violência física e psicológica.

– Eles davam uma chave-de-braço bem forte, jogavam nossa cara no chão e nos levavam praticamente arrastados para uma parte de concreto, onde a gente ficou muitas horas – afirmou.

Miguel relatou que os detidos foram mantidos sob o sol, revistados e tiveram pertences descartados antes de serem transferidos para uma prisão israelense. “Dava pra dizer que a gente era uma espécie de prisioneiro VIP dentro de um campo de concentração”, disse, acrescentando que houve privação de sono e exibição de vídeos de soldados mortos como forma de intimidação.

Deportação e reação diplomática

A deportação de 131 ativistas foi confirmada pelo governo da Jordânia na terça-feira. Entre eles estavam 13 brasileiros, incluindo a deputada Luizianne Lins (PT-CE). O Itamaraty informou que os brasileiros foram levados à capital Amã em transporte providenciado pela Embaixada do Brasil.

Em nota, o Ministério das Relações Exteriores condenou “nos mais fortes termos” a interceptação e a detenção arbitrária da flotilha em águas internacionais. O governo brasileiro classificou a ação como uma “grave violação ao direito internacional” e cobrou a imediata liberação de todos os detidos.

A Global Sumud Flotilla, composta por mais de 40 embarcações e cerca de 500 ativistas de mais de 40 nacionalidades, tinha como objetivo romper o bloqueio à Faixa de Gaza e denunciar a crise humanitária na região. A ativista sueca Greta Thunberg também fazia parte da missão e foi deportada um dia antes de Miguel.

Horas de angústia e vídeos antes do sumiço

Entre a noite de quarta-feira e a madrugada de sexta, Miguel perdeu contato com a família, que chegou a divulgar uma nota afirmando que o cineasta estava “possivelmente detido”. “Não aceitaremos a palavra ‘possivelmente’. Não aceitaremos a neutralidade cúmplice. Exigimos ação, denúncia e verdade”, afirmaram os familiares.

Pouco antes da interceptação, Miguel enviou vídeos em que relatava a tensão diante da aproximação de embarcações israelenses. “Estão se aproximando, a qualquer momento a gente vai jogar os telefones na água. Então… tá começando”, disse, em gravação feita às 23h da última quarta-feira.

Em outro registro, feito horas antes, ele comentou a expectativa pelo desfecho da missão: “Vai começar a noite daqui a pouco e vem o momento mais perigoso. Eu espero amanhã poder dar um novo informe dizendo que tá tudo bem, gravando nas praias de Gaza. Se isso não acontecer, provavelmente, a gente foi sequestrado e tá preso em Israel esperando deportação.”

Família entre o orgulho e a apreensão

Antes da confirmação da prisão, o pai do cineasta, Luiz Rodolfo Viveiros, conhecido como Gaiola, falou ao portal g1 sobre a mistura de orgulho e angústia que sentia. “Eu tenho uma sensação dividida: um enorme orgulho pelo meu filho desempenhar esse papel em uma causa humanitária e pacífica, mas, por outro lado, uma grande apreensão, ansiedade, angústia para saber onde ele está”, disse.

Segundo ele, Miguel mantinha contato com a família a cada dez minutos, como parte de um protocolo de segurança. “A última vez foi ontem. Sabíamos que poderia cair a comunicação. Se eles não atendessem mais, era porque tinha acontecido alguma coisa. Fiquei tentando a madrugada toda”, relatou.

Carreira dedicada à causa social

Documentarista e militante, Miguel Viveiros de Castro construiu sua trajetória com filmes voltados a movimentos sociais, direitos humanos e meio ambiente. Ganhou reconhecimento internacional com “Brad, Uma Noite Mais nas Barricadas”, sobre o assassinato do videoativista Brad Will no México, em 2006.

Outros trabalhos de destaque incluem “Tornallom”, que retrata a resistência de uma comunidade rural em Valência contra a especulação imobiliária; “Piauí Entocado”, sobre o trabalho da arqueóloga Niède Guidon na Serra da Capivara; e “Mundurukânia – Na Beira da História”, que aborda o impacto de hidrelétricas e mineração na Amazônia.

Miguel também é autor de “Em Busca da Caixa-Preta do Golpe de 64”, que resgata memórias de militantes sindicais e bastidores da resistência anterior à ditadura militar no Brasil.

Solidariedade internacional

A missão Global Sumud Flotilla reuniu 461 ativistas de mais de 40 países, entre eles parlamentares e defensores de direitos humanos. Em comunicado, os organizadores afirmaram que “Israel atacou embarcações desarmadas, carregando ajuda humanitária e voluntários de dezenas de países, em mais uma grave violação do direito internacional”.

Segundo a nota, “até agora não houve relatos oficiais sobre feridos ou mortes entre os ativistas brasileiros”.

Com a deportação concluída, Miguel e os demais brasileiros receberam apoio logístico e alimentação em Amã. O cineasta afirmou que todos os integrantes do grupo estão bem e que continuará denunciando as condições da população palestina.

Filmografia de destaque

Mundurukânia, Na Beira da História – documentário sobre aldeias indígenas na Amazônia, lançado em 2015, com trilha sonora de Carlos Malta & Pife Moderno
Piauí Entocado – sobre o trabalho da arqueóloga Niède Guidon e as comunidades da Serra da Capivara
Tornallom – sobre a luta da comunidade La Punta, em Valência, contra a especulação imobiliária
Brad, Uma Noite Mais nas Barricadas – relato do assassinato do videoativista Brad Will no México
Em Busca da Caixa-Preta do Golpe de 64 – investigação sobre a luta sindical anterior ao golpe militar.

Edições digital e impressa