Prefeitura passou a exigir que imigrantes nascidos fora da União Europeia apresentassem documentos que comprovassem sua situação de pobreza também no país de origem.
Por Redação, com Ansa - de Lodi, Itália
A cidade de Lodi, no norte da Itália, adotou uma regra para restringir o acesso de filhos de imigrantes à merenda escolar e ao transporte de ônibus em creches e colégios de ensino fundamental. A medida, anunciada há cerca de um ano pela prefeita Sara Casanova, do partido de ultradireita Liga, voltou a ganhar destaque com uma reportagem divulgada nesta semana pelo programa popular de TV Piazzapulita.
A produção mostrou como imigrantes vêm sofrendo para conseguir alimentação gratuita para seus filhos nas escolas. No verão europeu de 2017, Casanova, recém-eleita prefeita, assinou uma normativa que modificava as regras de isenção na merenda escolar e nos serviços de ônibus para alunos. Até então, o benefício era concedido com base no Indicador de Situação Econômica Equivalente (ISEE), instrumento que mede a condição de vida das famílias em função de sua renda e seu patrimônio.
No entanto, para o ano letivo 2018-19, iniciado em setembro passado, a Prefeitura passou a exigir que imigrantes nascidos fora da União Europeia apresentassem documentos que comprovassem sua situação de pobreza também no país de origem. A regra atinge inclusive crianças nascidas na Itália, mas de pais estrangeiros.
Crianças
Muitos genitores, contudo, têm tido dificuldade para obter esses documentos e, quando os conseguem, para fazer o governo municipal aceitá-los. Uma marroquina contou ao Piazzapulita que juntou dinheiro para voltar a seu país e pegar certidões que comprovassem a falta de posses da família, mas a Prefeitura as recusou sem maiores explicações.
De 132 pedidos apresentados às autoridades, 129 foram recusados. Com isso, os pais precisam pagar cinco euros por refeição para seus filhos terem acesso à merenda e 210 euros a cada trimestre pelo transporte escolar. Em algumas escolas, funcionários foram colocados na porta dos refeitórios para controlar a entrada das crianças.
— Devo beneficiar essas pessoas e esses Estados que eventualmente não produzam a documentação, em prejuízo dos cidadãos que devem apresentar vários documentos e têm direito? — questionou Casanova.
Vergonha nacional
A prefeita recebeu o apoio do líder de seu partido, o ministro do Interior Matteo Salvini, que criticou os "espertinhos". "Todos devem pagar e todos devem ser tratados da mesma maneira. O fato de alguns que poderiam pagar acharem que podem não fazê-lo é um insulto aos pais italianos e estrangeiros que pagam aquilo que devem", disse.
A oposição, no entanto, critica a medida. "Ver crianças discriminadas na merenda escolar por razões econômicas faz mal ao coração. A política baseada no ódio e no medo gera monstros, o que está acontecendo em Lodi é desumano", atacou o ex-primeiro-ministro Matteo Renzi, do Partido Democrático (PD), de centro-esquerda, chamando o episódio de "vergonha nacional".
Já o secretário de Políticas Sociais da vizinha Milão, Pierfrancesco Majorino, disse que a Itália está perante um "novo fascismo". Apesar das críticas, a prefeita de Lodi já declarou que não pretende mudar o regulamento. (ANSA)
Reação
Diante medidas tão drásticas contra os pobres, parte dos italianos começa a reagir. Neste sábado, um escritório do partido ultranacionalista Liga foi alvo de uma carta-bomba na região de Trentino-Alto Ádige, extremo-norte da Itália, a poucas horas da visita de seu secretário, o ministro do Interior Matteo Salvini.
O ataque ocorreu na cidade de Ala, na província de Trento, nesta madrugada. A explosão estilhaçou os vidros da entrada do escritório, que ainda foi pichado com a frase "Ancora fischia il vento" ("O vento ainda sopra", em tradução livre), em referência à célebre canção antifascista italiana.
Salvini faz neste sábado um tour por diversos municípios de Trentino-Alto Ádige, em vista das eleições regionais do próximo dia 21 de outubro.
— Foram os anarquistas. Estou orgulhoso das forças de ordem e de nossos extraordinários militares, que já limparam tudo. Alguns sujeitos entenderam que, após décadas, Trentino também quer virar a página e reagiram com violência — disse o ministro.
Dois suspeitos foram presos, segundo o presidente da província autônoma de Trento, Ugo Rossi, de centro.