Diante dos fatos ocorridos ao longo dos últimos meses, segundo especialistas, as condições vividas por diversas nações africanas traduziram-se em um mau ano para o continente.
Por Redação, com Sputnik Brasil - do Rio de Janeiro
O continente africano tem passando por transformações significativas ao longo dos últimos anos, refletindo uma dinâmica global de mudanças rápidas nas relações internacionais. A agência russa de notícias Sputnik ouviu especialistas sobre os fatos que marcaram o continente, ao longo de 2023.
Luccas Gissoni, doutorando em economia política mundial da Universidade Federal do ABC, destacou o impacto do rompimento do Níger com a França como um dos pontos mais marcantes deste ano. Gissoni, ao abordar a questão, contextualizou o rompimento à luz do neocolonialismo, uma dinâmica que persiste mesmo após a descolonização formal.
Colonialismo
Gissoni explicou que o neocolonialismo representa um recuo do colonialismo para uma relação que não é de dominação formal, mas que mantém a exploração econômica das antigas potências colonizadoras sobre as nações africanas.
—Esse rompimento é, sim, um marco. A gente fala muito utilizando a categoria do neocolonialismo, que é apoiada pelo Kwame Nkrumah, que foi o primeiro presidente de Gana, exatamente para descrever essa situação em que após a descolonização, a independência e a libertação nacional dos países africanos, aquela relação de tipo colonial, uma relação similar à que tinha na época de colonização, ela é realizada pelas antigas potências colonizadoras através de amarras um pouco mais soltas, sem relação colonial propriamente dita, embora consigam manter o seu objetivo de explorar os povos africanos e as outras nações colonizadas — destacou Gissoni.
Narrativa
Ainda à Sputnik Brasil, a professora Patrícia Teixeira, especialista em História da África, expôs uma perspectiva crítica sobre o panorama atual do continente africano. Ela expressou preocupações significativas sobre as condições vividas por diversas nações africanas, sublinhando que não foi um bom ano para o continente.
Um dos principais pontos abordados pela professora foi a persistência de conflitos militares e tragédias humanitárias, com destaque para a situação em Moçambique, especialmente na região norte do país, onde o conflito em Cabo Delgado continua. Teixeira desafiou a narrativa interna que rotula a crise como um mero conflito religioso ou regional, revelando que a verdadeira motivação é a exploração de recursos naturais por multinacionais.
Tragédias
— O que perpassa esse conflito é a questão das multinacionais que estão explorando o ouro, o rubi e o gás natural. Então, infelizmente, até um comentário que se faz na área de estudos africanos é que quando se descobre riquezas na África, coitado do povo que mora sob, em cima ou ao lado dessas riquezas — detalhou.
A pesquisadora ressaltou a natureza predatória das relações com a África, intensificada no contexto pós-covid-19, e mencionou a visão do Papa Francisco de uma "terceira guerra mundial aos pedaços" ao observar os conflitos que assolam o continente. Além disso, Teixeira destacou a continuidade dos conflitos no Congo e na República Centro-Africana, lamentando o total silenciamento ou a superficialidade na cobertura dessas tragédias humanitárias.