Rio de Janeiro, 05 de Dezembro de 2025

Perto de se aposentar, Rosa Weber deixa voto histórico sobre fim do crime de aborto

Em seu posicionamento, Rosa Weber avaliou que em 1940, quando foi aprovado o Código Penal que criminalizou o aborto, as mulheres eram excluídas da condição de "sujeito de direito". Naquela data, o voto feminino tinha sido conquistado havia apenas oito anos. 

Sexta, 22 de Setembro de 2023 às 13:51, por: CdB

Em seu posicionamento, Rosa Weber avaliou que em 1940, quando foi aprovado o Código Penal que criminalizou o aborto, as mulheres eram excluídas da condição de "sujeito de direito". Naquela data, o voto feminino tinha sido conquistado havia apenas oito anos. 


Por Redação, com Brasil de Fato - de Brasília


A descriminalização do aborto até 12 semanas de gravidez, um dos temas mais acalorados no debate público brasileiro, começou a ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nas primeiras horas da madrugada desta sexta-feira. Às vésperas de se aposentar, a ministra Rosa Weber, relatora do caso e presidente da Corte, votou em plenário virtual pela descriminalização do procedimento.




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A descriminalização do aborto é uma pauta histórica do movimento feminista, que vem conquistando vitórias em diversos países da América Latina

Em seguida, o ministro Luís Roberto Barroso pediu destaque, que é quando, por conta da relevância do tema, o julgamento é suspenso temporariamente para ser retomado em plenário físico, ainda sem data definida. É ele quem substituirá Weber na presidência do Supremo. 


Em seu voto, a ministra afirmou que a criminalização do aborto atinge os "direitos das mulheres à liberdade, à autodeterminação, à intimidade, à liberdade reprodutiva e à sua dignidade".


O julgamento em questão é da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442, impetrada pelo PSOL e pelo Instituto de Bioética Direitos Humanos e Gênero (Anis). O argumento é que a proibição da interrupção da gravidez é inconstitucional, por violar a dignidade humana das mulheres.  


Em seu posicionamento, Rosa Weber avaliou que em 1940, quando foi aprovado o Código Penal que criminalizou o aborto, as mulheres eram excluídas da condição de "sujeito de direito". Naquela data, o voto feminino tinha sido conquistado havia apenas oito anos. 


Como ministros devem votar?


A expectativa é que Carmen Lúcia, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin, por já terem externado posições a respeito do tema, acompanhem o voto de Weber e sejam favoráveis à descriminalização. Nunes Marques e André Mendonça, indicados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, devem votar contra.  


O mais recente ocupante de uma cadeira no Supremo, Cristiano Zanin, é uma incógnita. Durante a sabatina no Senado, ao ser questionado sobre o tema, limitou-se a dizer que “o direito à vida está expressamente previsto no artigo 5º da Constituição Federal”. Recentemente, Zanin votou contra a descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal.  


Somados a Zanin, há incertezas quanto aos posicionamentos de Gilmar Mendes, Luiz Fux, Dias Toffoli e Alexandre de Moraes. 



Expectativas  


Elisa Aníbal, da Frente Nacional Contra a Criminalização das Mulheres e Pela Legalização do Aborto, considera que o julgamento “é um passo” para que se qualifique a discussão a respeito da interrupção da gravidez no país. 


Também integrante do Grupo Curumim e da Articulação de Mulheres Brasileiras, Aníbal avalia que "o debate sobre a descriminalização do aborto precisa estar calcado em evidências, colocado de forma que a gente consiga argumentar e dialogar com a sociedade sobre as realidades vivenciadas. Precisa sair do campo do fundamentalismo e do moralismo”. 


Tabata Tesser faz parte do movimento Católicas pelo Direito de Decidir, uma das entidades que está como “amicus curiae” nesta ADPF. O termo, que significa “amigos da corte” em latim, refere-se a entidades que fornecem subsídios para as decisões dos tribunais. 


– O que tem nos movimentado nesses últimos tempos é o sentimento de urgência – descreve Tesser. “O Brasil tem sido um dos países atrasados no tema da legalização do aborto se comparado a outros países da América Latina”, avalia.  


– Argentina, México e Colômbia são alguns dos países que já demonstraram ser possível ter uma legislação que não seja discriminatória e que possa acolher a decisão e a autonomia das mulheres com relação às gestações indesejadas – diz Tabata Tesser.  



Momento para qualificar o debate 


Na opinião da integrante do Católicas pelo Direito de Decidir, a ADPF 442 é um momento para que a sociedade discuta um tema que “muitas vezes é tratado como tabu". "Mas a gente sempre tem uma tia, uma mãe, uma avó que já recorreu ao procedimento do aborto”, ressalta.  


Pesquisa Nacional de Aborto (PNA) de 2021, que é feita face a face, ou seja, possivelmente está subnotificada, mostra que uma em cada sete mulheres, aos 40 anos, já interrompeu a gravidez. Das que fizeram o procedimento em 2021, 43% tiveram que ser hospitalizadas. 


– O que a gente está querendo dizer com a defesa da descriminalização do aborto? Não queremos incentivar o aborto. Queremos politizar esse debate na sociedade, dizendo a essa mulher que ela não precisa ir para a prisão, muito menos ser morta ou torturada, por ter decidido não levar adiante uma gestação – explica Tesser.  


Comparando com o direito de votar ou de tomar outras decisões sobre a própria vida, Tesser defende que “a possibilidade de interromper a gestação deveria também ser um direito democrático”.  


– Hoje, mulheres ricas conseguem recorrer ao procedimento sem serem vítimas da criminalização porque justamente têm dinheiro para ir a uma clínica realizar esse aborto de forma segura. A questão é justamente oposta quando são mulheres que não têm dinheiro, em maioria negras e periféricas. São elas as maiores vítimas da criminalização e da mortalidade – ressalta.  


O STF começa a se debruçar sobre o tema às vésperas do 28 de setembro, dia latino-americano e caribenho de luta pela legalização do aborto. Na próxima quinta-feira, manifestações de movimentos feministas e de mulheres estão marcadas em todo o Brasil.  



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