Prosseguiu nesta quarta-feira o segundo julgamento do fazendeiro Décio José Barroso Nunes, acusado de mandar assassinar o sindicalista José Dutra da Costa, também conhecido como Dezinho, no dia 21 de novembro de 2000, no município de Rondon do Pará, sudeste do Estado. Em 2014, o madeireiro foi julgado e condenado a 12 anos de prisão, mas recorreu e teve a sentença anulada.
O segundo Tribunal do Juri teve início na terça-feira, quando foram ouvidas as testemunhas e o réu. A sessão é presidida pela juíza Ângela Alice Alves Tuma, no Fórum Criminal de Belém.
A retomada do julgamento nesta quarta começou com uma fala de uma hora e meia do promotor de justiça Franklin Lobato Prado, assistente de acusação. Prado destacou que o réu, cujas terras somam mais de 10 mil hectares, já foi condenado a pagar R$ 5 milhões por dano moral coletivo em um processo por trabalho escravo.
A motivação do crime contra Dezinho, morto a tiros por pistoleiros, seria justamente sua luta por melhores condições de trabalho e suas denúncias de trabalho escravo e desmatamento na região.
Depois de Prado, falou o advogado Marco Apolo Leão, da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Leão afirmou que conhecia a vítima e que ele e outras autoridades paraenses tiveram conhecimento das inúmeras ameaças de morte contra Dezinho.
– Na terça-feira, nós conseguimos apresentar as provas. Inclusive, testemunhas ameaçadas de morte estiveram presentes. Na ocasião, houve uma tentativa de intimidação por parte da defesa, que incorporou o cliente. O que vemos é que tanto o cliente quando defesa se mostram extremamente arrogantes – afirmou Leão, referindo-se à agressividade do advogado de defesa, Antonio Freitas Leite, contra a viúva da vítima, Maria Joel Dias da Costa, durante o depoimento desta. Entre outros ataques, Leite gritou com a mulher de 62 anos e a chamou de “mentirosa”.
Para Joelson Dias da Costa, 35 anos, filho da vítima, apesar da intimidação, a família continuará lutando. Atualmente, Maria Joel, mais conhecida como Joelma, é presidente do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Rondon do Pará. O filho lembra, com orgulho, a resistência do pai.
– Meu pai era muito atuante. Ele sempre esteve ao lado dos trabalhadores. Era presidente do sindicato de produtores rurais e denunciava trabalho escravo. Ele era a voz que fazia com que as denúncias chegassem às autoridades. Hoje, a gente está aqui pedindo por justiça, porque meu pai foi assassinado, mas a gente também continua na luta para fazer esse setor ser reconhecido e se desenvolver – disse.
A expectativa é de que os jurados se pronunciem até o final do dia.
Líderes sem-teto
Em mais uma decisão considerada arbitrária por advogados e movimentos de moradia, a Justiça de São Paulo decretou, nesta semana, prisão preventiva de mais nove líderes de movimentos que lutam por moradia na capital paulista. A denúncia, oferecida pelo promotor Cássio Roberto Conserino, é de extorsão e enriquecimento ilícito.
Em ação semelhante, a justiça ainda decidiu manter em cárcere Janice Ferreira da Silva, a Preta Ferreira, Sidnei Ferreira da Silva, Angélica dos Santos Lima e Ednalva Silva Franco, presos desde junho em São Paulo.
A juíza Érika Soares de Azevedo Mascarenhas, titular da 6ª Vara Criminal, ao aceitar a denúncia do Ministério Público Estadual, decretou a prisão de nove pessoas, de um total de 19 denunciadas pelo promotor. São eles: Ananias Pereira dos Santos, Andreya Tamara dos Santos de Oliveira, Hamilton Coelho Rezende, Josiane Cristina Barranco, Carmen da Silva Ferreira, Maria Aparecida Dias, Liliane Ferreira dos Santos, Adriana Aparecida França Ferreira e Manoel Del Rio Blas Filho.
À repórter Nahama Nunes, da Rádio Brasil Atual, o advogado e integrante do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe) Ariel de Castro Alves afirma que a magistrada foi induzida a erro pelos apontamentos do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) e do promotor. “São acusações e investigações parciais, seletivas, tendenciosas, com a finalidade de criminalizar os movimentos sociais e favorecer a própria especulação imobiliária no centro de São Paulo”, contesta Alves.
Na ação, a juíza justificou sua decisão dizendo que as lideranças cometeram “delitos de extrema gravidade”, alinhando-se ainda a um “poder paralelo” ao Estado, “cujo o objetivo maior é a desgraça humana com a finalidade única de vantagem financeira indevida, em detrimento de pessoas extremamente carentes e vulneráveis”. Para Conserino, as denúncias se justificam devido a supostas cobranças de taxas para viver nos prédios ocupados mediante grave ameaça ou violência. O promotor destaca também que há evidências de que os ativistas têm ligação direta com integrantes do PCC.
Sobre a acusação, o advogado Iberê Bandeira de Mello, que atua na defesa de líderes do Movimento Sem Teto do Centro (MSTC), apontou irregularidades nos argumentos da acusação. De acordo com Mello, à Rádio Brasil Atual, já houve tentativa de tomada de uma ocupação por parte do grupo, mas o caso foi denunciado à Polícia pelas próprias lideranças, que pediram investigações, posteriormente descontinuadas pelo Estado.”Ou seja, a prova de que o MSTC não tem ligação com a organização criminosa nenhuma, está exatamente nessa tentativa de tomada de uma determinada ocupação e a resistência dos moradores, isso não foi levado em consideração”, rebate o advogado.
– Mesmo essa interceptação telefônica, com essa determinada liderança, não há demonstração ou combinação de nenhum tipo de crime, por isso que eu falo, minha impressão é simplesmente que a juíza está errada – acrescenta. De acordo com Mello, o processo no momento está estagnado, porque há acusados foragidos enquanto quatro lideranças do MTSC estão presas. A expectativa é que nas próximas semanas seja julgado o pedido de habeas corpus da defesa. Procurado pela reportagem, o promotor Conserino não quis se pronunciar sobre o caso.