Rio de Janeiro, 08 de Novembro de 2024

Festival celebra cultura negra e história do 'tambor de sopapo' em Pelotas

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Quinta, 20 de Abril de 2023 às 12:07, por: CdB

Com essa citação, iniciava o projeto da Festa dos Tambores elaborado pelo músico e percussionista Giba Giba em 1999. O Festival aconteceu em 1999 e 2000, em Pelotas, com a presença de artistas de destaque da música percussiva nacional.


Por Redação, com Brasil de Fato - de Brasília


“É pela memória que se puxam os fios da história. Ela envolve a lembrança e o esquecimento, a obsessão e a amnésia, o sofrimento e o deslumbramento. Sim, a memória é o segredo da história, do modo pelo qual se articulam o presente e o passado, o indivíduo e a coletividade. O que parecia esquecido e perdido logo se revela presente, vivo, indispensável.” Octavio Ianni, escritor




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A primeira edição do Festival “Cabobu A Festa dos Tambores” foi realizada por Giba Giba em 1999 em Pelotas

Com essa citação, iniciava o projeto da Festa dos Tambores elaborado pelo músico e percussionista Giba Giba em 1999. O Festival aconteceu em 1999 e 2000, em Pelotas, com a presença de artistas de destaque da música percussiva nacional, como Naná Vasconcelos e Djalma Corrêa, e músicos com forte presença no ativismo da valorização negra nas artes, como Chico César. Na ocasião, 40 tambores de sopapo foram confeccionados por Mestre Baptista, guardião do saber construtivo do instrumento, e doados a grupos e ONGs para a replicação do conhecimento.


Após 23 anos, Pelotas recebe a Terceira edição do Festival “Cabobu A Festa dos Tambores” em homenageia aos músicos já falecidos pelas mãos de seus filhos. Edu do Nascimento, filho de Giba Giba, é o coordenador honorário e José Batista, filho do Mestre Baptista, o coordenador das atividades formativas da mostra. A retomada do Festival é uma realização da MS2 Produtora, viabilizada pelo edital Natura Musical, por meio da Lei Estadual de Incentivo à Cultura do Rio Grande do Sul (Pró-Cultura). Também conta com o apoio da Prefeitura Municipal e da Secretaria de Cultura de Pelotas. 


O nome Cabobu é homenagem aos mestres da música, composto pelos nomes de Cacaio, Boto e Bucha, homenageados por Giba Giba, falecido em 2014. A origem do festival era para possibilitar que as novas gerações conheçam as raízes de sua história. “Promover o renascimento de tradições que o tempo esgarçou e que tem como objeto as manifestações populares que dominaram a região de Pelotas por mais de um século, antes da chegada das correntes imigratóricas não-ibéricas. O tambor negro está no centro desse renascimento da cultura afro-açoriana, que formou a raiz das tradições gaúchas”, definia Giba.



“Objetivo do festival é a alegria”


Para o músico Edu do Nascimento, Giba Giba é Sopapo Cabobu, pode ser Cabobu, Giba Giba, e Sopapo. “Ele é a síntese do que vem acontecendo nesses últimos anos, ou nos últimos 60 anos, a genialidade de Giba que começou com essa ideia do Cabobu, mas que vem de antes, vem dos anos 1980 pra cá”, explica. Segundo ele, o objetivo do festival é a alegria, a reunião de pessoas, reunião de ideias. “É o jeito de ser de cada lugar, vem dança, vem música, vem doce, vem diversidade, vem Sopapo em material tombado pela cidade de Pelotas, e fazer parte disso é gratificante.”


Esse festival, conforme conta Edu, não poderia ser concretizado se não tivesse pessoas ligadas a toda essa história de 23 anos do Cabobu, como a produtora Sandra Narcizo e José Batista. “Sem eles eu não poderia jamais realizar a terceira edição do Cabobu. A expectativa é essa, que todos se divirtam, se apropriem, e venham participar desse momento de muito amor, de muito afeto, porque a equipe que foi montada, todes estão lá de muito coração. Eu quero que todos sintam, se divirtam, e peguem os seus tambores e venham participar da terceira edição do Cabobu”, convida o percussionista.



O Sopapo é um instrumento quase religioso


“É a emoção condensada através do toque. Cada música uma sensação, mesmo ritmo, mesmo compasso, mas a condução é personalizada, o que o torna um instrumento profundamente identificado com o seu executor. O que o diferencia, é que a emoção sentida com a melodia, toca no ritmo do coração de cada um. E aí, a gente toca a mesma música com o sentimento individual no coletivo. Os ritmos são determinados por nossos ancestrais. Foi ele, o sopapo, o veículo que trouxe para cá a contribuição estrutural do ritmo, isto é, os elementos capazes de fundamentar as transformações, a fusão e a seleção dos ritmos e melodias, díspares das demais raças.” Assim, Giba Giba se referia a esse instrumento ancestral, reconstruído pelas mãos do Mestre Baptista.


O sopapo caracteriza-se por seu aspecto cônico, grandes proporções e com som grave. Foi inventado pelos escravos no século XIX e estava em extinção. Na região de Pelotas e Rio Grande, na década de 1940, os negros das escolas de samba pioneiras do RS tocavam sopapo que dava um ritmo próprio ao andamento dos carnavais, diferenciando do samba do resto do país. O instrumento desapareceu das escolas de samba e baterias lá pelos anos 1970.


Giba Giba, em um trabalho árduo de pesquisa constatou que para contar a história de sua gente, sobrava apenas uma unidade do instrumento. Com as oficinas ministradas pelo Mestre Baptista, importante carnavalesco de Pelotas, na segunda edição do Cabobu, já foram construídos mais 40 sopapos.


Hoje o significado de sopapo, enquanto instrumento, consta no Dicionário Banto do Brasil, de Nei Lopes, editado pela prefeitura do Rio de Janeiro, em 1996: “Sopapo (2) – Grande tambor, popularizado no RS, nos anos 70, pelo músico negro Gilberto Amaro do Nascimento, o Giba Giba.”



Cabobu é um chamado ao resgate das origens


Para o filho do Mestre Baptista, autor do livro O Sopapo Contemporâneo, esse Cabobu vai ser um Cabobu de retomada. “Mas acima disso, ele vai ser um evento de oportunidade, de mostrar o que nós temos, de mostrar os valores culturais que existem aqui na região Sul como um todo.” José Batista acredita que o festival será um chamamento para acordar para os nossos valores culturais, para nossa formação, para as nossas origens. “Saber quem realmente nós somos, muito além do tambor, como já dizia o Giba, não é o tambor, vai além do tambor. É um evento ao qual ele procura trazer toda a complexidade do que nos formou, das coisas que foram omitidas, de coisas que estão acontecendo, dos próximos rumos do futuro”, salienta.


Com uma ampla programação, o festival também vai destacar a importância da presença feminina na construção dos saberes tradicionais e da arte contemporânea. Uma das homenageadas, será Dona Maria Baptista, esposa de Mestre Baptista e de quem José Batista é filho único. Hoje, aos 82 anos, viúva após 53 anos de casamento, dona Maria lembra de ter a família completa envolvida na realização dos 40 exemplares de sopapo que foram feitos e distribuídos por todo o Rio Grande do Sul. “O sopapo está em meu coração”, diz, ao lembrar que, como o marido estava há muito envolvido com ensaios e instrumentalização de escolas de sambas da cidade de Pelotas, Giba Giba procurou-o com a ideia de realizar um número expressivo de sopapos. Sem a experiência específica, Mestre Baptista aceitou, mas coube ao filho José a análise, cálculo e pesquisa para o projeto que foi executado e aprimorado desde então.


Para José Batista, nestes anos de interrupção se deu toda uma expansão do Cabobu. “Eu diria que até involuntariamente foi uma interrupção natural e necessária, porque nesse período os braços se abriram para as reais necessidades as quais o projeto trazia embutido dentro do âmago, e elas afloraram, afloraram na música, afloraram na cultura, afloraram em várias áreas no campo acadêmico através do Cabobu.” E lembra que foram feitos trabalhos de pesquisas pelas universidades, muitas palestras, livros, filmes.


– Enfim, é uma estrutura a qual eu posso te dizer que ela está começando realmente a ser montada. O Cabobu é um processo ao qual nós estamos no começo de uma conscientização, porque ele abrange muito além do tambor, através do tambor. É um movimento, um movimento que está aí na sociedade pra fazer ecoar essas vozes desse tambor, enfim, essas vozes por um mundo mais igualitário. Então essa consciência é um dos objetivos que a gente quer colocar nesses 3 dias de festival aqui na cidade de Pelotas – afirma.



Programação completa


Atrações musicais


DIA 20/04 – Quinta-feira 20h – Aquecimento dos Tambores, com grupo Sopaparia de Porto Alegre e os uruguaios do grupo Tambores de Candombe do Uruguay do Jefe de Cuerda Guillermo Ceballos. Local: Ponto de Encontro Mestre Caloca, no bar Copa Rio, na praça Cel. Pedro Osório, 201.


DIA 21/04 – Sexta-feira 15h – Cortejo de Abertura – Concentração na Esquina da SECULT, contornando a praça Cel. Pedro Osório e indo até o palco Giba Giba no Largo Edmar Fetter (Largo do Mercado). Local de encontro: Esquina da Secretaria de Cultura de Pelotas. Concentração: 15h | Largada: 16h


A organização do Festival Cabobu convida toda a população pelotense para essa abertura espiritual, festiva e simbólica! Com abre alas do Grupo AFROPEL REUNA (Babalorixá Baiano de Oxalá), embalado pelo grupo de Alagbês Pelotas Cânticos Aos Orixás e com liderança do Babalorixá Juliano de Oxum (Ilê Axé Reino de Oxum Epandá e Xapanã Jubetei), e também participação dos Tambores de Candombe do Uruguay do Jefe de Cuerda Guillermo Ceballos, grupo Tambor Tambora e convidados.


Palco Giba Giba


Local: Palco GIBA GIBA – Largo Edmar Fetter (Largo do Mercado Central de Pelotas)


Entrada gratuita


Discotecagem e apresentação por DJ Helô nos intervalos dos shows.


17h – Solenidade de Abertura
17h50 – Grupo de Dança Odara


18h30 – Lugarejo
19h30 – Quintal de Sinhá
20h30 – Marietti Fialho
21h30 – Kako Xavier
22h30 – Ialodê


Dia 22/4 – Sábado Discotecagem e apresentação por DJs Vânia & Vanessa nos intervalos dos shows.


17h15 – Solenidade de Homenagem a Cidade de Caçapava do Sul
18h – CIA Clara Nunes
18h45 – Vagnotreta
19h45 – Rafuagi
20h45 – Laddy Dee
21h45 – Paulo Dionísio


Dia 23/4 – Domingo Discotecagem e apresentação por DJ Tom Nudes nos intervalos dos shows.


17h – CIA de Dança Afro Daniel Amaro
17h45 – Mano Rick
18h45 – Afroentes
19h45 – 50 Tons de Pretas
20h45 – Xava Banda


*Horários sujeitos a alteração


Mesas redondas


Local: Espaço Mestra Griô Sirley Amaro na Bibliotheca Pública Pelotense – Praça Cel. Pedro Osório, 103. Pelotas/RS


Dia 21/4 – Sexta-feira


8h30 – As Relações Raciais e de Gênero no Brasil – A Violência e o Feminicídio à Mulheres Negras Cis, Trans e Indígenas Debatedoras: Cátia Cilene; Catarina Mota; Daiana Santos; Márcia Monks; Nina Fola; Pietra Dolamita.


10h30 – Racismo Estrutural – Um Fenômeno a Ser Debatido Debatedores: Antônio Carlos Côrtes; Ledecí Coutinho; Márcio Chagas; Marielda Barcellos.


Dia 22/4 – Sábado


8h30 – Charqueadas Pelotenses: A Omissão da Realidade, Impacto Social e Político nos Dias Atuais Debatedores: Andréa Mazza; Ledecí Coutinho; Marielda Barcellos; Mário Maia


10h30 – Políticas de Ações Afirmativas – Combate à Discriminações Étnicas, Raciais e de Gênero Debatedores: André de Jesus; Carla Ávilla; Francisca de Jesus; Luciana Custódio; Rafuagi.


Dia 23/4 – Domingo


8h30 – A Participação das Culturas e Saberes Afrodescendentes na Sociedade
Debatedores: Babalorixá Juliano de Oxum; Ìya Sandrali de Oxum; Ìyá Carmen de Oxalá; Daniel Amaro.


10h30 – CABOBU e o SOPAPO – Passado, Presente e Futuro Debatedores: Claudinho
Pereira; Edu do Nascimento; Kako Xavier; Raquel Moreira; Richard Serraria.


Oficinas


Local: Espaço Oficina Mestre Baptista no Pátio da Secretaria Municipal de Cultura de Pelotas – Praça Cel. Pedro Osório, 2 – Pelotas/RS

Dia 21/4 – Sexta-feira


14h – Oficina “Clínica de Introdução Geral de Percussão Afro Gaúcha e Afro Brasileira”, com o Mestre Griô Paulo Romeu Deodoro, diretor musical do Grupo de Música e Dança
Afro-Sul e coordenador do Instituto Sociocultural Afro-Sul Odomode.


Dia 22/4 – Sábado


13h30 – Oficina “Ecos de um Tambor – Fabricando Tambor de Sopapo”, com os professores Maurício Polidori e Rogério Gutierrez.


15h30 – Oficina “A Percussão Aplicada na Harmonia Musical – Se Me Bater, Eu Grito, Se Me Tocar, Eu Canto!”, homenageando o padrinho do evento, Djalma Corrêa, conduzida por José Batista, luthier, projetista do Sopapo e coordenador pedagógico do CABOBU.


Dia 23/4 – Domingo


13h30 – Oficina “Percussão Para Crianças, Adolescentes e Adultos – Coordenação Motora, Funcionamento dos Instrumentos e Aprendendo a Tocar”, com o Mestre Paulinho
do Areal.


15h30 – Oficina “Os Processos da Construção do Tambor Sopapo, História e Ancestralidade”, com Dilermando Freitas, Mestre Griô, Sopapeiro, Luthier e Contador de histórias.


Feira Preta Helena do Sul de 21 a 23 de abril – 10h às 18h


Local: Praça Cel. Pedro Osório – Centro de Pelotas/RS


Feira de produtos feitos por mulheres negras e indígenas. Coordenado pela Feira de Mulheres Empreendedoras Negras e Indígenas (FEMENI) com 32 expositoras de vestuário, gastronomia e artes.


Palco Diversidade


Local: Feira Preta Helena do Sul na Praça Cel. Pedro Osório


Dia 21/4 – Sexta-feira


14h – Tambores de Candombe do Uruguay do Jefe de Cuerda Guillermo Ceballos, grupo Tambor Tambora e convidados.


Dia 22/4 – Sábado


11h – AfroCorpo
14h – Piá
16h – Bateria Xica da Silva – Dmix Charme


Dia 23/4 – Domingo


11h – Tropa de Dança
14h – Ojuobá
15h30 – Grupo Renascença


Exposição “Giba Giba – Guardião do Sopapo”


Curadoria de Sandra Narcizo (MS2 Produtora) e Doris Couto (Museu Julio de Castilhos)


Local: Secretaria Municipal da Cultura de Pelotas – Praça Cel. Pedro Osório, 2.


Exposição Coletiva de Artistas Pretos “Afropresentismo” de Luis Ferreirah, pinturas de Zé Darci e artistas a confirmar.



Maiores informações:


Face: www.facebook.com/festivalcabobu


Insta: www.instagram.com/festivalcabobu


Youtube: www.youtube.com/@cabobu


Site: www.cabobu.com



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