Durante a campanha eleitoral, colocávamos em dúvida a capacitação de Jair Bolsonaro para o exercício da presidência da República; em menos de quatro meses, ficou indiscutivelmente comprovado que ela inexiste mesmo e a inadequação é maior ainda do que se supunha.
Mas, havia o temor de que a nova ultradireita ao seu redor tivesse algum discernimento do que queria e de como agir para concretizar seus planos nefastos.
O que estamos vendo, pelo contrário, é um festival de trapalhadas e de erros grosseiros na escolha de estratégia e táticas.
Por que os donos do Brasil colocaram Bolsonaro no Palácio do Planalto, mesmo estando cientes de suas gritantes limitações? Para que ele socasse garganta dos brasileiros adentro medidas impopulares, começando pela reforma da Previdência.
Mas, apesar de ter passado três décadas fazendo nada no Legislativo, ele parece ignorar que o parlamentar que o ajudar nessas mico-empreitadas correrá enorme risco de não se reeleger, daí esperar receber, em troca de sua subserviência, pagamento bem alto. E o que vem sendo colocado no balcão de trocas não passam de migalhas, dificultando qualquer acordo.
Se, pelo contrário, ceder aos apetites fisiológicos, Bolsonaro exibirá sua nudez aos que acreditavam nas suas promessas retóricas de que resistiria à habitual politicalha
Ele contava com a pressão popular para facilitar a aprovação dos seus cavalos de Troia, como se o clima antipetista do ano passado fosse perdurar após a eleição.
Negativo. Se pressão popular houver, será contra. Quem quer perder direitos em troca de promessas de ministros, sabidamente fantasiosas e inconfiáveis? Só perfeitos otários.
O que fazer? – perguntaria Lênin, para em seguida dar uma resposta consistente. Já o incrível governo Bolsoleone responde com absurdos.
Como de nova essa direita não tem nada, o que ela elucubra é uma variante do autogolpe fracassado de Jânio Quadros em 1961: sonha em retirar poder do Congresso e do Supremo Tribunal Federal para aumentar o seu em idêntica proporção.
Mas, superestima grosseiramente a própria força e as lições da História: quem tem poder de fogo para fazer algo assim dar certo no Brasil são os fardados.
Só que aí os bolsonaristas se deparam com outro obstáculo, o de que o alto oficialato despreza o ex-capitão encrenqueiro que o Exército teve de expelir de suas fileiras; e tem uma percepção clara de como seria difícil tirar o Brasil do atoleiro econômico na atualidade (é uma instituição respeitada que teme deixar de sê-lo se apostar seu prestígio numa missão impossível).
Não confundir com certos tuítes |
Aí vem o inacreditável charlatão do anticomunismo profissional que abduziu os filhos do presidente e, com seus delírios de um anormal, compra uma briga maluca com os militares encastelados no governo; então, como o pai coruja coloca o sangue do seu sangue à frente dos deveres do cargo, abre-se um abismo entre bolsonaristas e militares. Parece que alguém andou interpretando erroneamente os movimentos dos astros...
Resumo da ópera: o governo atual está emparedado de todos os lados e marcha para um péssimo desfecho.
Preocupemo-nos em evitar que os brasileiros sofram como consequência da péssima decisão que foram (por uma manipulação sem limites) induzidos a tomar na última eleição.
E torçamos para que as autoridades que lá atrás fecharam os olhos a tantas irregularidades e crimes eleitorais, comecem a agir agora, quando o barco está visivelmente afundando.
Celso Lungaretti, jornalista e escritor, foi resistente à ditadura militar ainda secundarista e participou da Vanguarda Popular Revolucionária. Preso e processado, escreveu o livro Náufrago da Utopia (Geração Editorial). Tem um ativo blog com esse mesmo título.
Direto da Redação é um fórum de debates editado pelo jornalista Rui Martins.