Os bancos até agora distribuíram apenas 5% dos R$ 40 bilhões da linha de crédito para ajudar no pagamento da folha de pequenas e médias empresas, fortemente afetadas pelas quarentenas. O empresário José Eutimio Brandão Jr dispensou 50 dos 170 funcionários que trabalhavam em seus empreendimentos: um bar, restaurante, padaria e uma boate, no Estado de Alagoas.
Por Redação - de São Paulo
A maior parte das pequenas e médias empresas brasileiras, que respondem por metade dos empregos e 30% do PIB do país, não tem conseguido acesso ao dinheiro prometido pelo governo federal para ajudá-las a atravessar a crise do coronavírus. O movimento coloca em risco a retomada econômica.
Os bancos até agora distribuíram apenas 5% dos R$ 40 bilhões da linha de crédito para ajudar no pagamento da folha de pequenas e médias empresas, fortemente afetadas pelas quarentenas. O empresário José Eutimio Brandão Jr dispensou 50 dos 170 funcionários que trabalhavam em seus empreendimentos: um bar, restaurante, padaria e uma boate, no Estado de Alagoas.
Brandão tentou tomar um crédito para ajudar a pagar os funcionários que sobraram, mas diz que seu banco rejeitou o pedido porque o faturamento geral do seu grupo supera os 10 milhões de reais de limite máximo.
— A taxa de juros é baixa, próxima à Selic, os bancos não querem emprestar porque não vão ganhar dinheiro — disse Brandão à agência inglesa de notícias Reuters.
Desigualdade
Uma pesquisa do Sebrae com mais de 10 mil empresas mostra que 86% das pequenas empresas que pediram crédito nos bancos não conseguiram. Desse total, 28% ainda estão esperando uma resposta e o restante foi rejeitado.
Enquanto isso, o BNDES continua negociando potenciais linhas de crédito para as empresas aéreas listadas em bolsa Azul e Gol, para a fabricante de aviões Embraer e até para as subsidiárias locais de multinacionais como Volkswagen e General Motors.
E, enquanto alguns pacotes de resgate de grandes empresas enfrentam obstáculos, as grandes limitações do programa de ajuda a pequenas empresas reforçaram a percepção de desigualdade no acesso ao crédito na América Latina.
Mais dívidas
Segundo dados do Banco Central sobre toda a carteira de crédito do país, os bancos concederam 442 bilhões de reais em novos créditos nos últimos dois meses, mas 60% foram para grandes empresas. O Ministério da Economia disse, em comunicado, que trabalha para lançar programas alternativos de crédito e que já está subsidiando a linha de crédito para a folha de pagamento.
Muitos donos de pequenas empresas, que não conseguem prever sua receita futura e têm medo de tomar mais dívida que talvez não consigam pagar, preferem simplesmente não pedir os créditos públicos.
Ao contrário do programa de financiamento à folha de pagamento nos Estados Unidos, o U.S. Paycheck Protection Program, que perdoa o empréstimo se ele for usado para pagamento de salários, os financiamentos no Brasil precisam ser pagos e são adicionados à dívida mesmo que a empresa vá à falência. Então muitos optam por demitir ou cortar salários.
Empréstimos
Luiz Soares, dono de salões de cabeleireiro e um restaurante, todos dentro de shoppings, viu sua receita desaparecer com as ordens de quarentena na cidade de São Paulo. Ele não tomou o crédito da folha de pagamento e demitiu 10 dos 25 funcionários que tinha contratado formalmente.
Soares, de 68 anos, tem outras 100 pessoas que trabalham como parceiros de seus estabelecimentos e agora está renegociando os empréstimos bancários existentes. Mas continua preocupado se haverá demanda no seu restaurante e quantas pessoas poderão ficar ao mesmo tempo dentro dos seus salões de beleza.
— Não posso tomar mais empréstimos, não faço ideia de quando poderemos reabrir e qual será meu faturamento — disse Soares.
Garantias
Na semana passada, a equipe econômica do governo divulgou um novo programa também para empresas médias, usando recursos de um fundo do BNDES. A medida, publicada na véspera, cria o Programa Emergencial de Acesso a Crédito a pequenas e médias empresas, para garantir parte dos empréstimos feitos por bancos mediante aporte de até R$ 20 bilhões do Tesouro num fundo garantidor.
Carlos Chiaroni, dono de uma loja na Galeria do Rock, em São Paulo, acha que o governo deveria fazer mais.
— Se eu tivesse todas as garantias que os bancos me pedem, eu nem precisaria de empréstimo agora. Isso mostra que, se o governo não der o crédito, ninguém mais vai dar — concluiu.