Alunos não brancos de Pernambuco têm mais dificuldade no desempenho acadêmico
As desigualdades também aparecem no recorte por localidade. Ainda que a distorção nos ambientes urbanos (23,6%) seja maior que na zona rural (20,59%), ela dispara nos territórios indígenas, com 39,22% ou 4.413 alunos em situação de atraso.
As desigualdades também aparecem no recorte por localidade. Ainda que a distorção nos ambientes urbanos (23,6%) seja maior que na zona rural (20,59%), ela dispara nos territórios indígenas, com 39,22% ou 4.413 alunos em situação de atraso.
Por Redação, com Brasil de Fato - de Brasília
Os indicadores do ensino público revelam que a desigualdade social tão característica do Brasil se traduz também no contexto das escolas. As populações de maior vulnerabilidade são as que mais lidam com a situação de fracasso escolar, segundo os dados de 2020 do levantamento Trajetórias de Sucesso Escolar, do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), em parceria com a Samsung e a Cidade Escola Aprendiz. Em Pernambuco, não é diferente: estudantes não brancos são os que proporcionalmente mais encaram dificuldades de acompanhamento e permanência nos colégios.
Para especialista, números mostram que as escolas são reprodutoras de desigualdade social
Em primeiro lugar, há de se definir o que é fracasso escolar. A pedagoga Luciana Rosa Marques, doutora em Sociologia, resume que o conceito está relacionado com a não obtenção pelo estudante de bons resultados acadêmicos. Na pesquisa, ela é descrita sob os eixos distorção idade-série (quando o estudante está com dois ou mais anos de atraso escolar), reprovação e abandono escolar.
Quando se trata de distorção idade-série, havia em 2020, em Pernambuco, 287.143 estudantes das redes municipais e estaduais com dois ou mais anos de atraso escolar, o que corresponde a 23% do total. No recorte de raça, estavam nessa situação 20,78% (42.414) dos alunos brancos; 27,25% (9.555) dos alunos pretos; 23,75% (141.070) dos alunos pardos; 21,23% (771) dos alunos amarelos; e 33,60% (4,5 mil) dos alunos indígenas; fora os que não tiveram etnia declarada.
As desigualdades também aparecem no recorte por localidade. Ainda que a distorção nos ambientes urbanos (23,6%) seja maior que na zona rural (20,59%), ela dispara nos territórios indígenas, com 39,22% ou 4.413 alunos em situação de atraso.
Nacionalmente, a taxa de distorção idade-série total de 2020 era menor que a do estado, com 5.807.374 (20,4%) estudantes atrasados. No entanto, a discrepância entre os jovens brancos e não brancos era muito maior. O problema atingia 14,13% (1.215.734) dos alunos brancos; 29,46% (300.144) dos pretos; 23,29% (2.656.332) dos pardos; e 38,36% (92.441) dos indígenas.
Para Luciana, os números mostram que as escolas acabam sendo produtoras e reprodutoras de desigualdade social. “Onde estão mais concentradas a repetência, a evasão e distorção é nas camadas sociais que apresentam milhares de outros indicativos de desigualdade social. Você vê que pretos e pardos têm a distorção de série maior, e que eles são a grande maioria dos alunos das escolas públicas”, comenta.
A diferença no desempenho de alunos sem deficiência e com deficiência é a maior de todas: a taxa de distorção idade-série mais que dobra do primeiro grupo (22,24%) para o segundo (54,18%).
A especialista diz que os percentuais falam da falta de estrutura para acolher os alunos PCDs. “Têm escolas sem apoio para alunos com autismo e que precisam de apoio mais individualizado, e para aqueles que têm deficiência física, tem muitas escolas que não tem adaptações em banheiros, rampas, portas grandes que contemplem pessoas em cadeiras de rodas”, cita.
Professora da disciplina Pesquisa e prática pedagógica focada em Gestão da Escola, na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Luciana ouve relatos dos graduandos que presenciam essa realidade de perto.
– Escutei alguns depoimentos de alunos que são estagiários na rede municipal dizendo que o professor segrega os alunos especiais dentro da sala de aula. Falam que eles deveriam ir para outra sala, ter um ambiente diferenciado. Ou seja, o preconceito e as dificuldades sendo colocados pelos próprios professores e escolas. Além da estrutura física e humana, é preciso formação dos docentes em serviço para acolhimento e trato dos alunos – defende.
Reprovação e abandono escolar
Por 2020 ter sido um ano atípico, com a chegada da pandemia da covid-19 e a suspensão das aulas presenciais, os dados sobre reprovação e abandono escolar não podem ser comparados com números anteriores. Como diz em nota de esclarecimento a Trajetórias de Sucesso Escolar, as redes de ensino tiveram que se adaptar muito rapidamente a essa nova realidade, “alterando calendários escolares e a maneira de analisar a frequência escolar e avaliar o desempenho dos estudantes”.
A consequência disso foi que, em todo Brasil, a taxa de aprovação foi de 98,8% em 2020, frente a 92,6% em 2019. Em Pernambuco, os índices correspondem, respectivamente, a 99,9% e 93,7%. Em relação à taxa de abandono, 0,1% ou 1.851 jovens pernambucanos deixaram a escola em 2020, e 1,2% (15.185) em 2019. No Brasil, a taxa foi de 1,2% (342.806) em 2020, enquanto em 2019 foi de 2,2% (623.187).
“Os resultados de fluxo escolar de 2020 são consequência de medidas adotadas para responder à pandemia, como o 'continuum' curricular e a flexibilização regulatória para a adoção de medidas que minimizassem a evasão e a reprovação escolar. São, portanto, retrato de um momento de exceção, e não devem ser comparados com os índices de anos anteriores; não se tratam de indicadores idênticos ou que medem o mesmo fenômeno”, afirma o texto.