Inovação, confundida com P&D, precisa de uma abordagem sistêmica, políticas públicas integradas e foco no mercado para promover competitividade e desenvolvimento sustentável.
Por Abraham B. Sicsú – de Brasília
Tenho, com freqüência cada vez menor, participado de apreciações acadêmicas, de artigos que me são enviados, de bancas de concursos e de obtenção de títulos. O que me leva a escrever este texto é a confusão que se faz com um termo de moda. Todos falam de inovação, mas nem sempre dizem o mesmo, nem sempre a compreensão é a mesma.
Tradicionalmente, no mundo dos bens reais, palpáveis, inovação é definida como um produto ou processo tecnologicamente novo cujas características fundamentais (especificações técnicas, usos pretendidos, software ou outro componente imaterial incorporado) diferem significativamente dos usualmente produzidos ou adquiridos. Em geral, aumenta a produtividade das empresas e sua competitividade. Mas, fundamental, tem que ser aceito e validado pelos mercados consumidores. Se não, deixa de se caracterizar como inovação.
Nesses processos, é básico o domínio da informação e do conhecimento, sem dúvida, mas não é suficiente. Eles não estão igualmente disponíveis para todas as empresas. É necessário um esforço persistente e políticas públicas que transformem esse esforço em compatível com os custos suportáveis nas organizações.
Nesse processo, torna-se necessário um processo interativo com universidades, instituições de pesquisa, consumidores e usuários, fornecedores e mesmo outras empresas, além de um processo contínuo e capacitação e de interação com os mercados potenciais e reais demandantes.
A que vem toda essa conversa? Nas mesas de avaliação que participo e mesmo nas políticas públicas que dizem ser direcionadas para inovação, é ignorado e, na maioria das vezes, a mágica inovação é caracterizada como pesquisa e desenvolvimento, ou seja, apenas com parte do que se refere ao conhecimento de novos produtos e processos.
Preocupação sistêmica
Não há uma preocupação sistêmica com o complexo real que representa a inovação para ter um impacto significativo na competitividade e no desenvolvimento. Os financiamentos se direcionam apenas para esta parte do processo e se esquece o fundamental que é chegar aos mercados e aí se consolidar. Não há uma visão sistêmica.
Para tal, medidas são necessárias e devem ser tomadas. Num país da dimensão do Brasil, fundamental estruturar Sistemas Territoriais de Inovação. Tendo como base a idéia de que a inovação, com processos cumulativos de aprendizado e interação, é o motor principal do desenvolvimento, e estes se alicerçam na concepção de que a proximidade e, portanto, o território em que ocorrem, é fundamental para dinamizar essas interações. O contexto e a confiança entre os atores são elementos chave. O comprometimento e envolvimento dos agentes transformadores com a realidade em que vivem são fundamentais para uma dinâmica mais inovadora nas regiões.
Nessa direção, fundamental conhecer o complexo produtivo local e sua dinâmica. Entender suas articulações regionais, nacionais e internacionais procurando apoiar a inserção local. Sem isso, difícil entender como chegar a mercados e as escalas possíveis ou necessárias.
Criar programas que apóiem as cadeias de suprimento e permitam chegar a mercados potenciais. Muitas das barreiras associadas a processos de inovação estão associadas à dificuldades de suprimentos ou a custos que impedem a real efetivação desses processos.
Mercados desejados
Articular-se com as Políticas Públicas de Comércio Exterior, Industrial, Agrícola e mesmo a de Financiamento, entre outras. Entendendo inovação como um processo complexo, faz-se necessário um esforço integrado das políticas públicas. Setorializar é um erro, erro maio é querer atribuir à área de ciências e tecnologia a função hercúlea de atingir os mercados desejados.
Financiamento passa a ser fundamental. Escalas diminuem custos produtivos e permitem atingir mercados relevantes. Esse é um ponto crítico. Fazer parcerias com agências de financiamento internacionais, como os bancos de desenvolvimento, uma necessidade.
Evidentemente, volta a concepção do Sistema Territorial de Inovação. É preciso ter instituições, qualificadas e sólidas, para permitir consolidar ou criar instituições na área de Pesquisa e Desenvolvimento, mas também, de Tecnologia Industrial Básica, Metrologia, Certificação e mesmo Design ou Marketing.
Sem um sistema de suporte institucional, difícil fazer frente á concorrência cada vez mais acirrada.
Por fim importante valorizar os diferenciais locais. Não voltando simploriamente às teorias ricardianas de vantagens comparativas, mas sabendo se expor como um espaço em que apresenta características não observadas nos concorrentes.
Quando se lançam bases para novas políticas centradas em missões, “políticas sistêmicas que vão além de instrumentos de indução pela política de ciência”, que permeiam diferentes áreas de atividades, fundamental ter essa concepção em mente e abandonar a lógica de que tudo ocorre graças a comunidade acadêmica, considerando-se únicos responsáveis pela geração de parte importantes das idéias, menosprezando os que as implementam ou lhe dão suporte e mesmo são fundamentais para agregar conhecimento e procurar cominhos factíveis para implantação.
Abraham B. Sicsú, é professor aposentado do Departamento de Engenharia de Produção da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) e pesquisador aposentado da Fundaj (Fundação Joaquim Nabuco).
As opiniões aqui expostas não representam necessariamente a opinião do Correio do Brasil