Rio de Janeiro, 28 de Dezembro de 2025

Brigitte Bardot nasce estrela revolucionária e morre ícone fascista

Explore a trajetória de Brigitte Bardot, desde sua ascensão como símbolo sexual nos anos 50 até suas polêmicas declarações e posicionamentos controversos na velhice.

Domingo, 28 de Dezembro de 2025 às 14:07, por: CdB

Em sua nova existência, já um mulher madura anos depois, mostrou seu lado mais obscuro ao ofender e agredir com um discurso de ódio os muçulmanos, negros e homossexuais.

Por Redação, com agências internacionais – de Paris

A atriz francesa Brigitte Bardot, que morreu aos 91 anos neste domingo, nasceu para o cinema na demolição do papel da mulher sóbria e recatada, nos anos 1950, e personificou uma nova era de liberação sexual.

Brigitte Bardot nasce estrela revolucionária e morre ícone fascista | Bardot foi uma das atrizes mais belas do cinema mundial
Bardot foi uma das atrizes mais belas do cinema mundial

A beleza revolucionária, esculpida por um marketing contundente, fez da jovem um símbolo sexual sem precedentes, mas frustrou as ambições da atriz de se tornar uma profissional capaz de representar papéis outros que não fossem embalados pelo corpo perfeito. Aos 40 anos, desistiu de lutar contra a própria sombra e deixou as luzes da ribalta para sempre.

Em sua nova existência, já um mulher madura anos depois, mostrou seu lado mais obscuro ao ofender e agredir com um discurso de ódio os muçulmanos, negros e homossexuais, sob pesadas multas impostas pela Justiça francesa. Sofreu uma ação judicial do próprio filho, que a processou depois de ela afirmar que preferiria “ter dado à luz um cachorrinho”.

Ocupação

Brigitte Anne-Marie Bardot nasceu em Paris em 28 de setembro de 1934. Ela e irmã, Marie-Jeanne, cresceram em um apartamento luxuoso no bairro mais nobre da cidade. Seus pais católicos e ricos exigiam altos padrões das filhas.

Ainda na infância, durante a ocupação alemã na II Guerra Mundial, Bardot passava a maior parte do tempo em casa, e adorava dançar ao som de discos. Sua mãe incentivou seu interesse e a matriculou em aulas de balé desde os sete anos de idade. Seu professor no Conservatório de Paris a descreveu como uma aluna excepcional, e ela passou a ganhar prêmios.

Adolescente belíssima, Bardot aceitou o convite a capa da Elle, a principal revista feminina da França, e as fotos causaram furor. Enquanto as mulheres elegantes usavam cabelos curtos, combinavam cuidadosamente seus acessórios e usavam jaquetas sob medida e trajes de noite sedosos, os cabelos de Brigitte caíam sobre os ombros. Com o corpo esguio e atlético de bailarina, ela não se parecia em nada com suas colegas modelos e, aos 16 anos, tornou-se a garota mais famosa de capital mundial da moda.

Apaixonada

Suas fotos chamaram a atenção do diretor de cinema Marc Allegret, que instruiu seu assistente, Roger Vadim, a encontrá-la. Os testes iniciais para a tela não foram bem-sucedidos, mas Vadim, que era seis anos mais velho, a acolheu, primeiro como sua protegida e depois como sua noiva. Eles começaram um intenso romance, mas quando os pais de Bardot descobriram, ameaçaram mandá-la para a Inglaterra.

Não funcionou, pois ela estava perdidamente apaixonada pelo aspirante a diretor que, aos seus olhos, parecia um “lobo selvagem”.

— Ele olhou para mim, me assustou, me atraiu, e eu não sabia mais onde estava — resumiu Bardot à época. Casou-se pela primeira vez aos 18 anos.

A partir de então, Vadim lançou a  estrela que ele acreditava ser possível e chegou a vender as fotos do casamento deles para a revista Paris-Match. O marido a instruiu sobre como se comportar em público e ajudou a nova mulher a encontrar pequenos papéis em uma dúzia de filmes menores, muitas vezes interpretando interesses amorosos femininos inocentes.

Depravada

Em 1956, a atriz em ascensão tornou-se famosa principalmente por posar de biquíni – uma roupa proibida na Espanha, Itália e grande parte dos EUA por ser considerada indecente. Naquele ano, porém, o filme de estreia de Vadim, ‘E Deus criou a mulher’, estreou em Paris e mudou os rumos da sociedade, a partir do alvoroço causado nos Estados Unidos.

No país altamente conservador, acostumado com os limites de Hollywood, Bardot foi uma sensação imediata. Sua personagem persegue seus apetites sexuais, sem vergonha, como os homens. Ela dança descalça em transe, com a pele brilhando de suor, de cabelo solto. Sua total desinibição fez com que a ordem social entrasse em parafuso; fora do cinema, a reação foi ainda mais intensa.

Enquanto a existencialista Simone de Beauvoir a elevou ao status filosófico de “liberdade absoluta”, o filme que estrelava foi proibido em alguns Estados e a maioria dos jornais a classificava como depravada, a ponto de a mesma Paris-Match que a publicou descrevê-la como “imoral da cabeça aos pés”.

Animais

Vadim, por sua vez, foi trocado por Jean-Louis Trintignant, o que tornou Bardot; além de devassa, uma libertina contumaz. Ao se divorciar de Vadim, o agora ex-marido reagiu como um perfeito francês.

— Prefiro ter esse tipo de esposa, sabendo que ela é infiel, em vez de possuir uma mulher que simplesmente me amou e mais ninguém — declarou. Ele e Bardot continuaram trabalhando juntos e Vadim, pouco tempo depois, morou com Catherine Deneuve e se casou com Jane Fonda.

Com o passar dos anos, depois de quase 50 filmes gravados, Bardot anunciou sua aposentadoria, para dedicar a vida ao bem-estar animal, já em 1973.

— Dei minha beleza e minha juventude aos homens. Vou dar minha sabedoria e experiência aos animais — profetizou.

Em pouco tempo, Bardot arrecadou 3 milhões de francos (então cerca de R$ 2,2 milhões) para estabelecer a Fundação Brigitte Bardot, leiloando suas joias e memorabilia cinematográfica. Bardot – ou agora B.B., como era conhecida na França – fez campanha contra o abate anual de focas no Canadá e irritou alguns de seus compatriotas ao condenar o consumo de carne de cavalo.

Ultradireita

Vegetariana assumida, a ex-atriz criticou o governo chinês por “torturar” ursos e gastou uma fortuna em um programa para esterilizar cães de rua romenos. Mas a escalada para a radicalidade completa ainda não terminara. Em seus últimos anos de vida, Bardot foi processada por ódio racial ao se opor à forma como as religiões islâmica e judaica matam animais para comer. A forma como expressou suas críticas, no entanto, foi imperdoável e mesmo ilegal.

Em 1999, escreveu que “minha terra natal é invadida por uma superpopulação de estrangeiros, especialmente muçulmanos”. Isso rendeu a Bardot uma multa sem precedentes, mas apenas a fez dobrar a aposta no discurso fascista que assumiu até o fim de seus dias. Ela passou a criticar os casamentos inter-raciais e a insultar os gays que, em suas palavras, “rebolam, colocam os dedinhos no ar e, com suas finas vozes de castrato, reclamam do que aqueles heterossexuais horrorosos os fizeram passar”.

Bardot foi levada às barras dos tribunais tantas vezes que, em 2008, o promotor declarou estar “cansado” de acusá-la. Neste mesmo ano, ela deixou o quarto marido, Bernard d’Ormale, ex-conselheiro do falecido político de extrema direita Jean-Marie Le Pen, mas cristalizou o perfil de ultradireita que levou para o túmulo, nesta manhã.

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