Quando uma jovem da alta classe média paulista - Suzana Richthofen - planejou e participou do assassinato de seus pais, trucidados, enquanto dormiam, a golpes de barras de ferro pelo namorado e o irmão dele, ninguém pediu a pena de morte para a moça. Ao contrário: surgiram comunidades de internautas, dizendo que a amavam. Da mesma forma, quando um índio pataxó foi queimado, enquanto dormia, para o divertimento de rapazes da alta classe média brasiliense, respeitável juíza do Distrito Federal quis desclassificar o crime, a fim de evitar que fossem levados ao tribunal do júri. Algumas das pessoas de bem da capital da República se mobilizaram, a fim de desculpar os assassinos. Eles estavam apenas querendo "brincar" com o índio. Depois se soube que os rapazes estavam sendo privilegiados na prisão: um deles saía para freqüentar o curso universitário e, entre o fim das aulas e o retorno a uma cela especial da penitenciária, tomava cerveja com os amigos.
É claro que nos revolta muito mais a morte de uma criança de seis anos, da forma brutal como ela se deu, do que a execução de duas pessoas de meia-idade, e a de um remanescente dos bravos tapuias do litoral da Bahia, membro de pequena tribo que escapou do extermínio secular.
A morte por nada
O que choca, ainda mais, no caso do menino João Hélio, é a extrema precariedade da vida nas grandes cidades brasileiras. Morre-se sem nenhuma explicação, como se todos nós andássemos com uma pistola carregada, jogando a roleta-russa. Quando menos se espera, a única bala fica diante do percussor, e o dedo invisível das circunstâncias dispara o gatilho. Se a mãe do menino houvesse passado pelo local cinco minutos antes, ou cinco minutos depois, talvez nada houvesse ocorrido. Ao sair do centro espírita naquele exato momento e ao escolher aquele trajeto, a senhora estava, para seu desespero, entregando o filho ao despropositado martírio.
Todos nós nos sentimos atingidos pelo crime, mas não temos a mesma carga de sofrimento e de ódio que atinge os pais do garoto. Eles têm todo o direito de exigir punição mais severa para os criminosos - até mesmo a morte - incluída a do menor que participou do assassinato. Se pensarmos no que sentiríamos se isso ocorresse a qualquer um de nós, não há limite para o ódio, não há como conter o desejo de vingança pessoal. Qualquer pai seria capaz de matar o assassino de seu filho, ou de sua filha, como tem ocorrido. A senhora, que matou a facadas o adolescente que violentara seu filho pequeno, fez o que muitos de nós seríamos capazes de fazer.
Quando crimes tão bárbaros são cometidos há uma reação coletiva irracional. É o que está ocorrendo agora, quando se pede a pena de morte para os assassinos do pequeno João Hélio. E essa reação é tão mais despropositada quando parte de alguns dos mais poderosos meios de comunicação de massa em nosso país. É o momento da desforra de parte da classe média contra os que defendem os direitos humanos. Jornalistas e parlamentares recorrem aos adjetivos mais fortes, arregalam os olhos, gesticulam, pedindo que o Estado exerça vingança implacável contra os assassinos. Eles se esquecem de que todos nós, criminosos ou não, já estamos condenados à morte. E se esquecem também de que a execução de qualquer criminoso, seja jovem ou velho, não é exatamente um castigo. A agonia de um condenado dura, quando muito, alguns segundos. Depois disso, é o nada. A prisão por bom tempo, nas condições carcerárias do Brasil de hoje, talvez seja punição bem pior do que a morte.
A construção de um bandido
Como se faz um criminoso? Os criminosos, salvo os casos de psicopatia congênita, são construídos, não nascem feitos. A nova deputada federal Marina Magessi, veterana policial carioca, não pode ser apontada como esquerdista, fanática defensora dos "direitos dos bandidos". Ao contrário: sempre foi vista como "durona" na ação policial. Em recente depoimento à TV Câmara, em companh