Rio de Janeiro, 22 de Dezembro de 2024

Locarno e o racismo nos EUA

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Quarta, 16 de Agosto de 2017 às 14:27, por: CdB

Premonitório, o filme Did You Wonder Who Fired the Gun, mostrou em Locarno, três dias antes de Charlottesville, o Alabama dos racistas, nazistas e do Klu Klux Khan. Nele, o cineasta Travis Wilkerson conta que seu avô tinha assassinado um jovem negro, em 1946, sem ser preso pela polícia.

Por Rui Martins, do Festival Internacional de Cinema de Locarno:

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Donald Trump reaviva racismo nos EUA

Três dias antes das violências em Charlottesville, o Festival de Locarno exibiu na competição internacional um filme pouco comentado - Did You Wonder Who Fired the Gun?, do cineasta independente americano Travis Wilkerson, no qual ele denuncia o assassinato de um negro no Alabama, em 1946.

O mesmo Estado racista americano do Alabama, onde no dia 1 de dezembro de 1955, a costureira negra Rosa Parks se recusou a dar seu lugar no ônibus para um branco, rompendo a lei do apartheid no transporte público. Com o apoio do jovem pastor negro Martin Luther King, houve uma greve de quase um ano obrigando os ônibus a acabarem com a segregação contra os passageiros. Vitória que é considerada como o ponto de partida do movimento anti-segregacionista nos EUA, graças à coragem de Rosa Park.

Ninguém poderia imaginar que o presidente americano Donald Trump iria reavivar agora as brasas adormecidas do racismo e nazismo dos sulistas confederados do Alabama que, em 1943, estendiam o braço direito e gritavam Heil Hitler, contra a participação dos Estados Unidos contra o nazismo. Ainda hoje, eles veneram os "heróis" confederados americanos, em guerra, contra a abolição da escravidão por Lincoln. Hoje, o Klu Klux Khan desfila e agride sem os capuzes brancos por contar com partidários racistas até no governo de Trump, como era ainda faz pouco Steve Bannon, da chamada Alt Right, a extrema-direita alternativa.

Filme premonitório Did You Wonder Who Fired the Gun mostra cenas de treinamentos militares de nazistas, racistas e do Klu Klux Khan, numa busca do próprio cineasta ao passado de sua família: foi seu avô, S.E. Branch, conhecido como homem truculento mesmo com a esposa, quem tinha assassinado a tiros, num bar, o jovem negro Bill Spann, que ali se encontrava.

Como acontecia, naquela época de pogrooms contra negros no Alabama,  seu avô não ficou preso nenhum dia e, ao ir aos arquivos da Polícia procurar mais informações, além do publicado no jornal, Travis Wilkerson descobriu tudo ter sido destruído, nada havendo sobre o ocorrido nem a folha de ocorrência.

Dentro de sua família, o silêncio tinha sido e continuou total sobre o avô racista e autor de outros assassinatos. Ele conseguiu apenas um depoimento na família do assassinado e o bar, depois do ocorrido, acabou deixando de ser frequentado.

Alvo de ameaças, Travis Wilkerson não esmorece, porque seu filme ao revelar como se matavam negros em silêncio é atual. Ainda hoje negros continuam sendo agredidos, espancados e mesmo mortos pela própria polícia americana. No Brasil não é diferente, costuma acontecer o mesmo, em maior número, e sem reações policiais, políticas ou judiciais.

Rui Martins estava em Locarno, convidado pelo Festival Internacional de Cinema.

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