O quadro piorou, ainda mais, com o forte recuo da confiança do comércio brasileiro em junho. O aumento das incertezas provocadas pelo cenário político conturbado, no Congresso, e com a piora da demanda, informou a Fundação Getulio Vargas (FGV).
Por Redação - de Brasília e São Paulo
As condições políticas se agravaram no país, nas últimas horas, com a apresentação da denúncia contra o presidente de facto, Michel Temer, e seu ex-assessor Rodrigo Rocha Loures. Pela primeira vez, na História brasileira, o inquilino do Palácio do Planalto foi acusado por corrupção passiva. Diante dos fatos, a economia marca passo, enquanto permanece o impasse sobre a permanência do peemedebista no comando do país.
O quadro piorou, ainda mais, com o forte recuo da confiança do comércio brasileiro em junho, devido ao aumento das incertezas provocadas pelo cenário político conturbado e com a piora da demanda, informou a Fundação Getulio Vargas (FGV) nesta terça-feira. O Índice de Confiança do Comércio (Icom) do Brasil registrou queda de 2,9 pontos neste mês e foi a 85,7 pontos, retornando ao nível de março.
"A redução da confiança do comércio em junho foi bastante influenciada pelo aumento da incerteza a partir de 17 de maio. Mas houve, além disso, piora da percepção das empresas em relação ao nível atual da demanda, sugerindo uma leitura pouco favorável da atual conjuntura", explicou em nota o superintendente de estatísticas públicas da FGV/IBRE, Aloisio Campelo Jr.
O resultado do índice teve como base a queda de Índice de Situação Atual (ISA-COM) de 3,3 pontos, para 79,6 pontos, enquanto o Índice de Expectativas (IE-COM) caiu 2,4 pontos, para 92,4 pontos. Campelo ressalta, porém, que a queda dos juros junto com a liberação do FGTS ajudou a manter em alta as expectativas dos vendedores de bens duráveis.
Delação da JBS
Na véspera, a FGV divulgou que a confiança do consumidor voltou a piorar em junho diante do aumento das incertezas com a crise política. Devolveu, assim, a alta vista em maio.
A crise política foi gerada após o presidente Michel Temer passar a ser investigado por suspeita de corrupção passiva, participação em organização criminosa e obstrução da Justiça, o que vem abalando a confiança em geral. Na noite passada, o procurador-geral da República (PGR), Rodrigo Janot, ofereceu denúncia criminal contra Temer pelo crime de corrupção passiva a partir da delação dos executivos da JBS.
Agora, o ministro Edson Fachin, do STF, aciona a Câmara, que vai decidir se autoriza ou não o prosseguimento da denúncia. É necessária, porém, a aprovação de dois terços dos 513 deputados. Após a votação, se o plenário do Supremo decidir aceitar a denúncia, Temer vira réu e terá de se afastar do cargo por até 180 dias.
Mala cheia
O ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) também foi denunciado. Trata-se do 'homem da mala' de Temer. Ele recebeu R$ 500 mil em dinheiro da JBS a pedido do presidente. Os investigadores acreditam que o dinheiro teria Temer como destino final. Além do crime de corrupção passiva, Janot apontou indícios de organização criminosa. Estão envolvidos Temer, Rocha Loures e o ex-ministro Geddel Vieira Lima. O procurador-geral também quer abrir um novo inquérito contra Temer sobre o esquema nos portos.
Para o procurador, Temer usou Rocha Loures para receber vantagens indevidas. "Entre os meses de março a abril de 2017, com vontade livre e consciente, o Presidente da República Michel Miguel Temer Lulia, valendo-se de sua condição de chefe do Poder Executivo e liderança política nacional, recebeu para si, em unidade de desígnios e por intermédio de Rodrigo Santos da Rocha Loures, vantagem indevida de R$ 500.000 ofertada por Joesley Batista, presidente da sociedade empresária J&F Investimentos S.A., cujo pagamento foi realizado pelo executivo da J&F Ricardo Saud", diz a denúncia apresentada por Janot.
Loures foi flagrado pela Polícia Federal correndo com meio milhão de reais, pelas ruas de São Paulo. Foi preso logo em seguida.
Autorização
Mesmo com a chegada da denúncia, o STF não poderá analisar a questão antes de uma decisão prévia da Câmara. De acordo com a Constituição, a denúncia apresentada contra Temer somente poderá ser analisada após a aceitação de 342 deputados. É o equivalente a dois terços do número de deputados da Câmara.
A denúncia foi enviada ao gabinete do ministro Edson Fachin, relator da investigação envolvendo o presidente. O ministro poderá conceder prazo de 15 dias para manifestação da defesa antes de enviá-la para a Câmara. A formalidade de envio deverá ser cumprida pela presidente do STF, Cármen Lúcia.
Se a acusação for admitida pelos parlamentares, o processo voltará ao Supremo para ser julgado. No caso de recebimento da denúncia na Corte, o presidente se tornará réu. Assim, será afastado do cargo por 180 dias. Se for rejeitada pelos deputados, a denúncia da PGR será arquivada e não poderá ser analisada pelo Supremo.
A regra está no Artigo 86 da Constituição Federal. "Admitida a acusação contra o presidente da República, por dois terços da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento". No caso de Temer, ele responderá perante o Supremo Tribunal Federal, "nas infrações penais comuns", segundo o texto constitucional.
Durante a investigação, a defesa de Temer questionou a legalidade das gravações e os benefícios concedidos ao empresário Joesley Batista pela PGR na assinatura do acordo de delação premiada. Os advogados de Loures afirmam que a prisão é ilegal e que o ex-deputado não fará delação premiada.
"Nada nos destruirá"
No Palácio do Planalto, na véspera, Temer disse que a agenda de reformas é a "mais ambiciosa" dos últimos tempos.
— Não há plano B. Há que seguir adiante. Portanto nada nos destruirá. Nem a mim nem a nossos ministros — disse.
Mas não é bem assim. Janot, logo em seguida, disse que “nenhum brasileiro está acima da Lei”. Ele terá cinco dias, a partir desta terça-feira, para apresentar a denúncia. Temer precisará, assim, responder por crime de obstrução à Justiça.
Segundo os investigadores, Temer teria tentado "embaraçar investigação de infração penal praticada por organização criminosa, na medida em que incentivou a manutenção de pagamentos ilegítimos a Eduardo Cunha, pelo empresário Joesley Batista, ao tempo em que deixou de comunicar autoridades competentes de suposta corrupção de membros da Magistratura Federal e do Ministério Público Federal que lhe fora narrada pela mesmo empresário".
Já o ex-ministro Geddel Vieira Lima foi acusado porque "manifestou interesse na manutenção de pagamentos a Funaro [Lucio Funaro, apontado como operador financeiro do esquema]".
Joesley foi indiciado por "embaraçar investigação de infração penal que envolva organização criminosa ao manter pagamentos ilegítimos a Eduardo Cunha e a Lúcio Funaro, enquanto presos, a pretexto de mantê-los em silêncio ou de não se ver envolvido em eventuais revelações de fatos comprometedores a si próprio e ao grupo empresarial que comandava", ressalta o documento da PF.