Para divulgar a péssima imagem da Eletrobras era preciso acionar os chamados formadores de opinião, imprensa, soltar notas em colunas de jornais, municiar comentaristas econômicos, pautar a mídia em geral.
Por Redação - de Brasília e Rio de Janeiro
A Eletrobras pagou quase R$ 2 milhões para ser mal falada. Sem licitação. Tratada oficialmente como “desestatização” ou “democratização do capital”, a privatização da empresa, prioridade do governo de Michel Temer, recebeu um forte impulso em 20 de setembro de 2017, quando a estatal assinou com a RP Brasil Comunicações, do grupo FSB Comunicação, a maior assessoria de imprensa do país.
A constatação está na reportagem do jornalista Lúcio de Castro, publicada nesta terça-feira pela agência brasileira de notícias Sportlight. A estatal, “em busca de uma mobilização da opinião pública e formação de ambiente favorável para a privatização, traçou como estratégia a divulgação de um cenário de mazelas e problemas da estatal”, constata a matéria.
“Para tal, era preciso acionar os chamados formadores de opinião, imprensa, soltar notas em colunas de jornais, municiar comentaristas econômicos, pautar a mídia em geral, mostrando sempre um cenário que tornasse urgente tal privatização, acelerada pela pressa do governo federal em concretizar o negócio”, acrescenta.
Relatórios mensais
Ainda segundo a Sportlight, “a empresa nega tal viés e afirma que no contrato está ressaltada a necessidade de se “preservar a imagem positiva da empresa”, embora reconheça que a divulgação “não omite dados negativos como prejuízos financeiros ou dívida bruta superior a R$ 45 bilhões”
“De acordo com o plano desenhado no contrato, foi feita uma ‘análise do cenário’, passando em seguida para o chamado ‘mapeamento dos stakeholders’, ou seja, definição de quem é o público estratégico alvo das mensagens a serem enviadas. Em um segundo momento, veio a chamada ‘mobilização dos influenciadores’, item discriminado com custo de R$ 170.000,00 (cento e setenta mil) dentro do milhão e oitocentos reais do projeto total”, acrescenta.
De acordo com o texto, “em um dos 10 itens incluídos no plano de ação da FSB e apresentado no contrato, estava a execução de uma pesquisa de opinião pública para se verificar a popularidade do plano de se privatizar a Eletrobras, com custo específico de R$ 120.000,00.
Segunda instância
O contrato entre Eletrobras e FSB prevê ainda, em seu item 7.1, que os pagamentos entre contratante e contratada serão feitos quando da “entrega dos relatórios mensais elaborados pela contratada correspondentes à consolidação dos resultados alcançados”.
A reportagem solicitou tais relatórios também através de novo pedido de Lei de Acesso à Informação, mas, embora o contrato em si tenha sido disponibilizado também via LAI, ainda que em recurso de última instância, o acesso aos relatórios foi negado.
Um terceiro pedido de Lei de Acesso à Informação foi feito junto à Eletrobras. Relativo às informações sobre o suposto processo de licitação para o contrato em questão, o ECE-DJS 1252/2017. Solicitando o nome dos participantes da disputa, as propostas, os documentos do processo e o resultado final. Também foi negado em primeira e segunda instância.
Licitação
Na negativa, explica a reportagem, “a Eletrobras justifica o segredo quanto ao processo de licitação do que chama de ‘democratização do capital social’ afirmando que se trata “de informação estratégica da Eletrobras, posto que os documentos solicitados estão diretamente ligados à atuação da empresa no mercado concorrencial”.
E segue: “Isso porque as informações relativas ao contrato RP Brasil Comunicações (FSB Comunicação) são pilares fundamentais do processo de democratização do capital social da Eletrobras”. Destaca ainda a importância estratégica do contrato entre Eletrobras e FSB: “Com efeito, vale ressaltar que divulgação de informações acerca do Contrato com a RP é tão sensível que pode trazer prejuízos ao denominado processo de democratização”.
Apesar da negativa da Eletrobras na transparência do acesso ao processo de licitação, a reportagem apurou com diferentes fontes como se deu tal disputa. Ou na verdade, como não se deu a disputa. Ao menos a partir de certo ponto.
Valores de mercado
“Em meio a corrida do governo Temer para privatizar a Eletrobras; foi feita uma ‘tomada de preços’ para definir-se quem iria ficar com o contrato ECE-DJS 1252/2017. A tomada de preços é um momento crucial de uma licitação; onde fica determinado o patamar do preço onde será realizado o leilão final e onde são demonstrados os parâmetros de preço do mercado. É, também, falando-se de maneira geral e genérica; um momento da licitação onde os preços podem ser jogados para cima e superfaturados”, complementa.
Quanto ao citado contrato; “o pouco usual é o que ocorreu na Eletrobras (…) de acordo com diversas fontes ouvidas pela Agência Sportlight de Jornalismo Investigativo.
“Geralmente são utilizados três orçamentos de empresas diferentes. Ao contratar os serviços em jogo, a instituição realiza os procedimentos licitatórios conforme a legislação específica; podendo participar nessa fase tanto empresas que foram orçadas na fase de análise da tomada de preços; quanto qualquer outra empresa. Desde que observando os valores de mercado. Assim, sempre que vencida a etapa da tomada de preços, é realizada a licitação.
Sem comentários
“Os relatos, que se completam; dão conta que algumas das maiores empresas do país no ramo de assessoria e comunicação participaram do certame. Além da própria FSB, apresentaram propostas a Companhia de Noticias (CDN) e a Informe Comunicação. As três ocupam o pódio em contas do governo federal com reconhecida notória especialização em estratégia de comunicação.
“De acordo com as apurações da reportagem, a Informe Comunicação teria apresentado a proposta de menor custo financeiro; ficando em primeiro lugar. A FSB teria ficado em segundo. No entanto, após o resultado da ‘tomada de preços’ das empresas chamadas para uma licitação, a regra do jogo mudou. A Eletrobras resolveu escolher a vencedora pela modalidade de ‘inexigibilidade’, onde se dispensa uma concorrência; e se promove uma contratação direta. A lei concede o direito ao contratante de escolha do fornecedor; caso existam razões que justifiquem a dispensa de licitação”, acrescenta.
A reportagem enviou questões para a FSB Comunicação sobre o contrato e o processo de escolha. A empresa enviou a resposta abaixo:
Resposta: “A FSB não se pronuncia sobre contratos em vigor com seus clientes”.