Rio de Janeiro, 26 de Dezembro de 2024

Che Guevara e Frei Luiz Cappio

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Sexta, 07 de Outubro de 2005 às 07:29, por: CdB

Desde a morte de Ernesto Che Guevara até a greve de fome de Dom Frei Luiz Cappio muitas coisas aconteceram na América Latina. A luta através das armas foi deixada de lado e o sonho de "um outro mundo possível" é sustentado pela organização dos movimentos sociais e pelo voto nas urnas. O método usado por Frei Luiz Cappio é bem diferente da forma de como Che Guevara lutou. Mas as razões mais profundas de suas lutas tem tudo a ver. Tanto Guevara quanto Cappio empenham suas vidas na luta pela Vida. No caso do bispo, ele colocou em risco sua própria vida em favor da vida do rio São Francisco e da vida de todos que vivem no e do rio, e em favor da vida da terra onde corre o rio e da vida do planeta. Che Guevara, de uma forma diferente, também arriscou e sacrificou sua vida, com o propósito de defender muitas vidas ameaçadas pelo imperialismo, por um sistema injusto e opressor. O que há em comum entre Che e Frei Luiz é a coragem de se colocar em defesa da Vida, até às últimas conseqüências.

Neste dia 9 de outubro celebramos 38 anos da morte de Che Guevara e ele continua vivo porque a sua morte não foi em vão, morreu lutando pela Vida. Os que não se esforçam de maneira alguma para mudar o mundo, encontram tempo suficiente para ver os erros daqueles que lutam e empenham suas vidas na defesa da Vida. Muitos criticam o método de revolução armada adotado por Guevara. Mas para ele a organização e a disciplina da luta devem estar acompanhadas de uma ética revolucionária. O guerrilheiro deve indagar sobre o motivo de sua luta, deve ter consciência de que é um reformador social e que através da luta revolucionária está defendendo a Vida, lutando para mudar o regime social que mantém todos os seus irmãos desarmados, jogados na miséria. Na compreensão de Guevara, naquele momento, a via das armas era a única que poderia conduzir à emancipação dos povos oprimidos e, somente por isso, usou a guerrilha como mecanismo de mudança da sociedade.

Mantivemos o espírito de luta de Che Guevara e adotamos a via democrática no caminho da mudança. Ao longo da história e nos dias de hoje, se vê que há muitos esforços para afastar do poder os opressores, para que os pobres possam conquistar sua liberdade e dignidade. Todo sacrifício até aqui não foi em vão, mas percebemos as limitações da democracia, nos damos conta de que o direito do voto, pouco resolve - claro que sem ele seria pior. Mas é preciso muito mais do que simplesmente eleger pessoas que consideramos ser os melhores políticos. É preciso a luta e a participação do povo. É preciso fortes gestos de amor que mobilizem, que realmente convoquem a sociedade, a cidadania, para construir a mudança. E este gesto encontramos em Dom Frei Luiz Cappio.

O jejum de Frei Luiz foi um gesto extraordinário, fantástico. Não agrediu a ninguém, mas responsabilizou, comprometeu a quem realmente deve ser responsabilizado pela causa que defende. Se fosse preciso, com certeza, muitos de nós somaríamos ao gesto profético de Frei Luiz Cappio. O empenho de Frei Luiz na defesa do Rio São Francisco, de seus povos ribeirinhos e das terras banhadas por suas águas é o símbolo de uma luta muito maior. Como o rio que nasce de forma mansa e segue seu curso de acordo com as pedras, galhos e margens encontradas no caminho, devemos ampliar a luta de Frei Luiz Cappio. A sua iniciativa poderá ser repetida porque é verdadeiramente um gesto concreto de não-violência ativa. A atitude de Cappio, considerada extrema, mas pacífica e profética, expõe a fragilidade da nossa democracia representativa. Os políticos que elegemos desrespeitam de tal forma a democracia ao ponto de se dar ao luxo de mudar o curso de um rio sem consultar pelo menos os moradores ribeirinhos. Isso não é democracia e deve ser respondida com gestos fortes. Se o jejum é uma atitude extrema, isso mostra a gravidade daquilo que ele contesta.

Viva Che Guevara! Viva Frei Luiz Cappio!

Frei Pilato Pereira é articulista do

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