Rio de Janeiro, 22 de Dezembro de 2024

A bomba do Bolsonaro, um evangélico na Hebraica

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Quarta, 12 de Abril de 2017 às 12:00, por: CdB

O deputado Jair Bolsonaro é um homem de Deus. Antes de ter conquistado a Hebraica, tinha ido a Israel, onde foi batizado no rio Jordão por um pastor da Assembleia de Deus, mostrando que os religiosos perdoam pecados como racismo e homofobia. Nada melhor do que estar bem com os deuses para ganhar votos. (Nota do Editor),

De Luiz Egypto, Rio de Janeiro, (montagem Celso Lungaretti) com outros textos extraídos do Observatório da Imprensa.

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Bolsonaro é um homem de Deus, batizado no Jordão

QUANDO CAPITÃO, BOLSONARO TRAMOU ATENTADO TERRORISTA, FALOU DEMAIS E A "VEJA" PUBLICOU, FRUSTRANDO O PLANO.

 
"No segundo semestre de 1987, finda a ditadura e já sob o governo civil de José Sarney, a economia estava combalida em razão do fracasso do Plano Cruzado. A inflação era alta, tendendo a índices estratosféricos, e grassava forte insatisfação nos quartéis devido à política de reajustes dos soldos dos militares – além, é claro, do incômodo, sobretudo entre a oficialidade média, pela perda do poder político de que gozaram por 21 anos seguidos.
 
Jair Bolsonaro era então capitão do Exército, da ativa, cursava a Escola Superior de Aperfeiçoamento de Oficiais (Esao) e morava na Vila Militar, na Zona Norte do Rio. Em setembro de 1986, ele assinara um artigo na revista Veja no qual protestava contra os baixos vencimentos dos militares. Por isso ele foi preso e, na época, sua punição provocou protestos de mulheres de oficiais da ativa – que, ao contrário dos maridos, podiam sair em passeata sem correr o risco de serem presas..
 
‘SÓ PARA ASSUSTAR'
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Bolsonaro tornou-se fonte da revista. Em meados de outubro 1987, a prisão de outro militar, capitão Saldon Pereira Filho, pelo mesmo motivo, levou à Vila Militar a repórter Cassia Maria, de Veja, destacada para repercutir o ocorrido. Ali ela conversou com Jair Bolsonaro, que estava acompanhado de outro capitão e da mulher deste.
Sob condição de sigilo, a mulher do militar contou à repórter – e depois Bolsonaro e seu colega confirmaram – que estava sendo preparado um plano batizado de Beco sem saída. O objetivo era explodir bombas de baixa potência em banheiros da Vila Militar, da Academia Militar de Agulhas Negras, em Resende (RJ), e em alguns quartéis. 
 
A intenção era não machucar ninguém, mas deixar clara a insatisfação da oficialidade com o índice de reajuste salarial que seria anunciado dali a poucos dias. E com a política para a tropa do então ministro do Exército Leônidas Pires Gonçalves – que teria sua autoridade seriamente arranhada com os atentados.
 
‘Serão apenas explosões pequenas, para assustar o ministro. Só o suficiente para o presidente José Sarney entender que o Leônidas não exerce nenhum controle sobre a tropa’, ouviu a repórter de Ligia, mulher do colega de Bolsonaro, identificado com o codinome de Xerife.
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FRASE ISOLADA
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Bem que se dizia antigamente: macaco, olha o teu rabo!
A repórter havia apurado uma bomba, no sentido literal e no figurado. Veja não respeitou o off – no que fez muito bem neste caso, pois do contrário estaria acobertando atos terroristas – e quebrou o pacto de sigilo com a fonte. 
 
A história toda foi contada nas páginas 40 e 41 da edição 999 (de 27/10/1987) da revista. A repórter Cassia Maria anotou em seu relato:
'Temos um ministro incompetente e até racista’, disse Bolsonaro a certa altura. ‘Ele disse em Manaus que os militares são a classe de vagabundos mais bem remunerada que existe no país. Só concordamos em que ele está realmente criando vagabundos, pois hoje em dia o soldado fica o ano inteiro pintando de branco o meio-fio dos quartéis, esperando a visita dos generais, fazendo faxina ou dando plantão
Perguntei, então, se eles pretendiam realizar alguma operação maior nos quartéis. Só a explosão de algumas espoletas, brincou Bolsonaro. Depois, sérios, confirmaram a operação que Lígia chamara de Beco sem Saída
Falamos, falamos, e eles não resolvem nada, disseram. Agora o pessoal está pensando em explorar alguns pontos sensíveis'.
E também: quem não te conhece, que te compre!
Sem o menor constrangimento, o capitão Bolsonaro deu uma detalhada explicação sobre como construir uma bomba-relógio. 
 
O explosivo seria o trinitrotolueno, o TNT, a popular dinamite. O plano dos oficiais foi feito para que não houvesse vítimas. A intenção era demonstrar a insatisfação com os salários e criar problemas para o ministro Leônidas."
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(trechos selecionados da matéria Capitão Bolsonaro, a história esquecida, cuja
 íntegra pode ser acessada aqui. É de autoria de Luiz Egypto e foi publicada 
pelo Observatório da Imprensa em sua edição 636, de 06/04/2011)
 
Segue o texto integral,  publicadopor Luiz Egypto, no Observatório da  Imprensa -
 
Capitão Bolsonaro, a história esquecida
Por Luiz Egypto em 06/04/2011 na edição 636

Na barulhenta cobertura da mídia sobre as declarações racistas e homofóbicas do deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) ao programa CQC, da Rede Bandeirantes, ficou esquecido, no fundo de um arquivo qualquer, um episódio de 24 anos atrás, também protagonizado pelo agora deputado federal, e que tocou em um dos fundamentos da atividade jornalística – qual seja, as declarações off the records, isto é, aquelas informações utilizadas pelo jornalista sob o compromisso de resguardar o anonimato de sua fonte.

A história é a seguinte. No segundo semestre de 1987, finda a ditadura e já sob o governo civil de José Sarney, a economia estava combalida em razão do fracasso do Plano Cruzado. A inflação era alta, tendendo a índices estratosféricos, e grassava forte insatisfação nos quartéis devido à política de reajustes dos soldos dos militares – além, é claro, do incômodo, sobretudo entre a oficialidade média, pela perda do poder político que gozaram por 21 anos seguidos.

Jair Bolsonaro era então capitão do Exército, da ativa, cursava a Escola Superior de Aperfeiçoamento de Oficiais (ESAO) e morava na Vila Militar, na Zona Norte do Rio. Em setembro de 1986, ele assinara um artigo na revista Veja no qual protestava contra os baixos vencimentos dos militares. Por isso ele foi preso e, na época, sua punição provocou protestos de mulheres de oficiais da ativa – que, ao contrário dos maridos, podiam sair em passeata sem correr o risco de serem presas.

‘Só para assustar’

Bolsonaro tornou-se fonte da revista. Em meados de outubro 1987, a prisão de outro militar, capitão Saldon Pereira Filho, pelo mesmo motivo, levou à Vila Militar a repórter Cassia Maria, de Veja, destacada para repercutir o ocorrido. Ali ela conversou com Jair Bolsonaro, que estava acompanhado de outro capitão e da mulher deste.

Sob condição de sigilo, a mulher do militar contou à repórter – e depois Bolsonaro e seu colega confirmaram – que estava sendo preparado um plano batizado de ‘Beco sem saída’. O objetivo era explodir bombas de baixa potência em banheiros da Vila Militar, da Academia Militar de Agulhas Negras, em Resende (RJ), e em alguns quartéis. A intenção era não machucar ninguém, mas deixar clara a insatisfação da oficialidade com o índice de reajuste salarial que seria anunciado dali a poucos dias. E com a política para a tropa do então ministro do Exército Leônidas Pires Gonçalves – que teria sua autoridade seriamente arranhada com os atentados.

‘Serão apenas explosões pequenas, para assustar o ministro. Só o suficiente para o presidente José Sarney entender que o Leônidas não exerce nenhum controle sobre a tropa’, ouviu a repórter de Ligia, mulher do colega de Bolsonaro, identificado com o codinome de ‘Xerife’.

Frase isolada

A repórter havia apurado uma bomba, no sentido literal e no figurado. Veja não respeitou o off – no que fez muito bem, neste caso, pois do contrário estaria acobertando atos terroristas – e quebrou o pacto de sigilo com a fonte. A história toda foi contada nas páginas 40 e 41 da edição 999 (de 27/10/1987) da revista. A repórter Cassia Maria anotou em seu relato:

Sem o menor constrangimento, o capitão Bolsonaro deu uma detalhada explicação sobre como construir uma bomba-relógio. O explosivo seria o trinitrotolueno, o TNT, a popular dinamite. O plano dos oficiais foi feito para que não houvesse vítimas. A intenção era demonstrar a insatisfação com os salários e criar problemas para o ministro Leônidas.

(…)

Com esses antecedentes, não deixa de ser curioso que agora, quando o personagem volta à baila, a cobertura da edição (nº 2211, com data de capa de 6/4/2011) desta semana de Veja sobre o explosivo episódio de racismo, que suscitou tanta repercussão, resuma-se a uma mísera frase de Bolsonaro reproduzida na seção ‘Veja Essa’.

Faltou um curioso da Redação para examinar o arquivo digital da revista. Faria um gol.

Outras sobre Bolsonaro, publicadas nas  Folha de S.Paulo, repicadas do Observatório da Imprensa
 
Liberdade de agressão

Não carece de um Tiririca a Câmara de Deputados que conta com profissional da derrisão do calibre de um Jair Bolsonaro (PP-RJ). Políticos de sua estatura são como o sal de uma democracia; no Brasil, atenuam de modo passageiro a sensaboria da cena parlamentar e se dissolvem na torrente da história sem deixar traços.

Bolsonaro só vale uma discussão que transcenda a triste figura. Sua incontinência verbal desencadeia um questionamento sobre instituto angular da liberdade política, a imunidade parlamentar assegurada no artigo 53 da Constituição: deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos. Apenas por isso precisa ser levada a sério.

Em entrevista a programa humorístico de TV, o deputado havia associado o namoro hipotético de um filho com mulher negra à falta de educação e à promiscuidade. Por cálculo ou cinismo, disse depois que pensara tratar-se de pergunta sobre homossexualidade.

Antes de mais nada, parece evidente que a manifestação se encontra coberta pelo espectro amplo da liberdade de opinião garantida pelo artigo constitucional sobre a inviolabilidade do mandato. A mesma Constituição abriga a liberdade de expressão como cláusula pétrea, de maneira lapidar, no artigo 5º: ‘É livre a manifestação do pensamento’. Bolsonaro disse o que pensa; alguns brasileiros pensam como ele e o elegeram. Foi uma declaração política.

Detestável, pelo que exala de preconceito, sua insinuação nem por isso se enquadra facilmente na legislação contra discriminação racial. Há quem considere adequado adotar uma noção relativa da imunidade parlamentar e atribuir-lhe o crime punível com detenção de um a três anos na lei nº 7.719/1989 (praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional).

Nunca foi trivial, contudo, definir o que constitui discriminação. No Estatuto da Igualdade Racial (lei nº 12.288/2010), ela figura como toda distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por objeto anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em igualdade de condições, de direitos humanos e liberdades fundamentais. É transparente a intenção do legislador de punir atos concretos de discriminação, que tragam dano a pessoas reais, e não tanto convicções e preconceitos genéricos sobre diferenças raciais.

Repita-se: as palavras de Bolsonaro são lamentáveis. Bem faria a Câmara se alguma comissão de ética crível o submetesse a juízo político pela óbvia falta de decoro.

No mais, o caso se resume a um deputado que faz da estridência profissão e com isso adula uma franja retrógrada do eleitorado. Tudo insignificante demais para justificar qualquer precedente limitador da liberdade de opinião ou da inviolabilidade parlamentar conquistadas após a derrota do regime que o ex-militar enaltece.

Folha de S. Paulo, 4/4

Fernando de Barros e Silva

Fala tudo, Bolsonaro!

O deputado Jair Bolsonaro é um tipo fascistão. Truculento, homofóbico, lida mal com as diferenças e os valores democráticos. Os gays, em particular, parecem deixá-lo ‘maluca’ de raiva.

Sabe-se que indivíduos muito hostis ou agressivos, que se sentem ameaçados pela existência de homossexuais, costumam ser enrustidos. O ódio projetado no outro é apenas um sintoma, uma defesa contra si mesmo. Mas quem seria eu para suspeitar que existe uma ‘Jairzona’ enjaulada na alma do capitão? O ser humano é complexo.

A polêmica envolvendo esse personagem de almanaque tomou, no entanto, outro rumo. Discute-se se ele, com suas palavras, praticou o crime de racismo e os limites da liberdade de expressão no país.

Preta Gil lhe perguntou: qual seria sua reação se um de seus filhos namorasse uma negra? E ele: ‘Preta, não vou discutir promiscuidade com quem quer que seja. Meus filhos foram muito bem educados. Não viveram em ambiente como lamentavelmente é o seu’.

Digo logo: um país em que Bolsonaro não fosse eleito deputado tenderia a ser um lugar melhor. Mas pretender cassá-lo ou condená-lo por racismo em função dessa fala me parece um grande equívoco. Não só porque seria a melhor maneira de transformá-lo em vítima.

Mas, sobretudo, porque o que ele fez foi apenas manifestar a sua opinião. Grosseira, retrógrada, mas que representa uma parcela da sociedade. A liberdade de expressão nos garante a possibilidade de falar o que quisermos (nos limites da lei), mas também nos obriga a ouvir o que nos desagrada.

Bolsonaro incitou o racismo? E se ele fosse um negro e dissesse que não gostaria de ver sua filha casada com um branco? Seria racista?

Devemos ser bastante restritivos em relação a atos racistas. Mas seria bom que fôssemos também mais elásticos e liberais em relação às palavras. Temos deficit de cultura democrática. Deixem Bolsonaro falar. Ele é o seu maior inimigo.

Textos extraídos do Observatório da Imprensa.

Direto da Redação é um fórum de debates editado pelo jornalista Rui Martins.

 

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Edições digital e impressa
 
 

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