Marcado para dia 29 o depoimento de Boulos na Polícia Federal em São Paulo: é a mais grotesca das intimidações com base na Lei de Segurança Nacional.
Começarei esclarecendo uma dúvida do advogado geral da União, André Mendonça: o Guilherme Boulos estava sugerindo que alguém deveria cortar a cabeça do Jair Bolsonaro ao tuitar a seguinte frase, em abril de 2020: "Um lembrete para Bolsonaro: a dinastia de Luís XIV terminou na guilhotina..."?
Dá pena constatar como a crassa ignorância pode levar alguém às conclusões mais disparatadas!
Não, Mendonça! É que seu amo e senhor, durante uma manifestação golpista na frente do QG do Exército, em Brasília, ousou afirmar que ele próprio era a Constituição (aquele livro do qual Bolsonaro certamente jamais leu uma única página, pois não vem ilustrado com figurinhas).
E isto, para quem conhece o bê-a-bá da História Mundial, trouxe logo à lembrança a afirmação atribuída ao rei Luís 14, da França, que teria dito: "O Estado sou eu", frase-síntese do absolutismo, em que o poder político era concentrado todo na figura do monarca.
Com idêntica arrogância, Bolsonaro pretendeu ser superior à Constituição brasileira, daí ter sido então muito ridicularizado por chargistas e articulistas, que o compararam sarcasticamente ao chamado rei sol.
E Boulos, zombeteiro, lembrou que, após a morte de Luís 14 (1643-1715), o segundo monarca a sucedê-lo, Luís XVI (1774-1792), foi guilhotinado durante a Revolução Francesa.
Ou seja, 77 anos depois da morte do rei mais poderoso da Europa, seu descendente era executado em desonra, depois de haver sido destronado. As voltas que o mundo dá...
Aprendeu, Mendonça? Boulos não estava sugerindo que Bolsonaro fosse privado daquilo que jamais demonstrou ter (cabeça), mas, apenas, fazendo alusão ao que o inesquecível Billy Blanco magistralmente resumiu neste verso: "mais alto o coqueiro, maior é o tombo do tonto".
E o fato de o tonto não ter gostado da comparação é insuficiente para tentar enquadrar um desafeto na Lei de Segurança Nacional, mesmo porque o absolutismo ficou bem lá pra trás, no século 19. (por Celso Lungaretti, jornalista, resistente à Ditadura militar, editor do blog Náugrafo da Utopia).
Direto da Redação é um fórum de debates publicado pelo jornalista Rui Martins.