Para que a proposta tenha o apoio popular, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) sugere que deva partir da presidenta afastada
Por Redação - de Brasília e Rio de Janeiro
A luz vermelha está acesa na sala do pânico onde o presidente de facto, Michel Temer, desde as primeiras horas da manhã desta quinta-feira, recebeu a notícia reservada de que seu mandato poderá ser encerrado antes mesmo de começar. A frágil maioria de dois terços, no Senado, de 54 parlamentares, se liquidificou nas últimas horas após as declarações de senadores arrependidos de apoiar o afastamento da presidenta Dilma Rousseff.
No outro lado da trincheira, porém, o retorno da presidenta Dilma Rousseff também não é mais um consenso. Parte da bancada do PCdoB na Câmara dos Deputados — que luta contra o golpe de Estado, em curso no país — já cogita o apoio a novas eleições presidenciais para uma data anterior à de outubro de 2018. Alguns parlamentares sugerem que a consulta pública deveria ocorrer ainda neste ano.
Para que a proposta tenha o apoio popular, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) sugere que deva partir da presidenta afastada. Dilma, segundo o parlamentar, deveria chamar um plebiscito para que os eleitores se manifestem se querem, ou não, que as eleições sejam antecipadas. Silva acredita que esta medida poderá reduzir a crise na economia e oferecer uma saída honrosa aos atores da cena política.
Orlando Silva falou ao jornalista Paulo Henrique Amorim. Ouça, aqui.
Sem base
Enquanto na Câmara o governo interino esbanja apoio parlamentar, suficiente para aprovar pontos polêmicos da pauta como o aumento ao funcionalismo público, em meio à pior crise econômica dos últimos 20 anos, no Senado o clima está nublado. As demissões no ministério após a série de escândalos revelada nas gravações do ex-presidente da Transpetro, Sergio Machado, as idas e vindas na formação da equipe de governo e os sucessivos protestos, em todo o país, contra o golpe, em marcha, levaram um número ainda impreciso de senadores a rever o voto contra Dilma.
Diante do cenário nebuloso, a expectativa de novas eleições passa a ganhar consistência. Ou seja, Dilma voltaria ao cargo, livre do processo de impedimento, com o compromisso de convocar eleições amplas, gerais e irrestritas. Uma promessa de passar a limpo os poderes Executivo e Legislativo, ao mesmo tempo, e em tempo recorde.
— A volta dela assusta todo mundo, pela inconsequência, pela irresponsabilidade. Mas, se ela propuser eleição direta, o que já devia ter feito uma ano atrás? E se ela acenar para a oposição? O jogo não está decidido, não — opina Cristovam Buarque (PPS-DF), que votou favoravelmente à abertura do processo.
Para o senador Acir Gurgacz (PDT-RO), que votou “sim” para o afastamento de Dilma, a crise no governo interino tende a influenciar não apenas a opinião dele, “mas da maioria". Uma vez mantido o número de erros do presidente de facto, a base aliada de Temer tende a "quase se inverter", aposta. Nos últimos 21 dias, dois ministros caíram e ameaça semelhante pesa sobre outros seis integrantes do primeiro escalão, todos citados na Operação Lava Jato. Nesse meio tempo, as críticas se avolumaram contra a falta de diversidade no ministério e a tentativa de extinguir a pasta da Cultura colocou a classe artística na luta contra a marcha golpista.
Diante das críticas que vem sofrendo, após votar para que Dilma fosse afastada, o senador Romário Faria (PSB-RJ) divulgou, nesta manhã, uma nota na qual afirma que, a exemplo da presidenta eleita, o vice Michel Temer também será julgado “pelo conjunto da obra”.
Leia, adiante, a nota do senador Romário:
No último dia 12 de maio, votei SIM para que o Brasil pudesse continuar caminhando. Enxerguei meu país afundado numa profunda crise de governabilidade, nadando em um mar de corrupção e, não menos importante, mergulhado em graves suspeitas de crime de responsabilidade cometidos pela presidente afastada Dilma Rousseff. Votei sim para que tivéssemos a oportunidade de aprofundar as investigações.
De hoje, até o fim do julgamento, temos dois meses para chegarmos a uma conclusão definitiva quanto ao crime de responsabilidade. Enquanto isso, o presidente interino, Michel Temer, tem a oportunidade de dar uma resposta aos anseios da população e uma "nova cara" ao Brasil. É pouco tempo? Sim. Mas quando se está em crise, até um dia faz diferença e o governo Temer não tem o direito de cometer os mesmos erros da Dilma.
Nas semanas que precederam a votação da admissibilidade do impeachment no Senado, uma expressão muito usada para justificar o voto sim foi o "conjunto da obra". Desta forma, deixava-se claro que não só os crimes de responsabilidade estavam sendo julgados, mas também os casos de corrupção, o colapso da economia e o alto índice de desemprego. Na votação definitiva, novamente o "conjunto da obra" estará em jogo.
Os primeiros dias do governo interino não foram como deveriam ser. No lugar de ministros "notáveis", conforme Temer prometeu, tivemos ministros investigados. Vimos ministérios estratégicos para o país serem fundidos e perderem relevância, como o fundamental Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação. Assim como a extinção do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos. Temas relevantes e tão caros ao país, como o das pessoas com deficiência perderam relevância e foram abrigadas no Ministério da Justiça e Cidadania. Além da já anunciada extinção do Ministério da Previdência Social, órgão responsável pela elaboração de políticas, gestão e fiscalização de importantes benefícios sociais. Houve ainda a extinção Controladoria-Geral da União que, de certa medida, prejudica o combate à corrupção. Defendo o enxugamento da máquina pública e redução de custos do governo, mas não acredito que estas tenham sido as melhores alternativas.
Todos vocês me conhecem, fui crítico ao governo Dilma. E não serei diferente agora, este é um dos meus papéis.
Estou na política há cinco anos, mas vale lembrar que pressão não é nenhuma novidade para mim, vivo sob ela desde os 18 anos de idade. Meu mandato é pautado de dentro para fora e não de fora para dentro. Tenho acesso a todas as informações e ferramentas necessárias para tomar essa importante decisão e farei o que for melhor para o país.
Aproveito para anunciar que abri mão da vaga de titular da Comissão do Impeachment. De agora em diante, vou acompanhar os trabalhos como não membro, já que isso é possível. Sou presidente da Comissão de Educação, da CPI do Futebol e atuo em importantes causas sociais que não podem ser deixadas de lado.
Finalizo esclarecendo que não há que se falar em mudança de voto porque são dois votos distintos. No primeiro, votei pela continuidade da investigação. O segundo e definitivo voto será para julgar o crime de responsabilidade, que eu farei, como sempre, guiado pela minha consciência e buscando o melhor para o Brasil".
Novas eleições
Até aqueles que ainda apoiam a ruptura constitucional admitem que o quadro é cada vez mais incerto, devido ao apoio contado “na colher de chá” no Plenário do Senado. O senador Alvaro Dias (PV-PR), que ainda se diz a favor da saída de Dilma, reconhece que "as turbulências (no governo Temer) vão provocando temeridade". O processo contra a presidenta foi aprovado por 55 votos favoráveis, 22 contrários, três ausências e uma abstenção. Para que seja aprovada a cassação de Dilma, serão necessários 54 votos.
— A inclinação é mínima de um lado ao outro, vai se decidir com uma diferença de dois votos. Estamos em cima do fio da navalha — contabiliza o senador Lasier Martins (PDT-RS).
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que prevê a realização de plebiscito durante as eleições municipais, sobre um novo pleito para presidente e vice, começou a tramitar na Casa. Segundo o autor do instrumento legal, Walter Pinheiro (sem partido-BA), até agora 32 senadores já apoiam o projeto. No texto, o TSE convocaria novas eleições em 30 dias se essa proposta obtiver a maioria absoluta no plebiscito. O mandato dos eleitos acabaria em 2018.
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