‘Um dia vamos ter que parar contra ele, que liderava as paralizações’

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Publicado quinta-feira, 3 de julho de 2003 as 12:14, por: CdB

No reduto petista das montadoras de São Bernardo do Campo, onde o partido foi criado no fim dos anos 70 para representar os interesses dos trabalhadores na política, a decepção com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se mistura ao orgulho e à esperança de que as mudanças ainda se realizem.

“Ainda é muito cedo para querer cobrar. Para começo, está legal”, diz o auxiliar de almoxarifado Francisco Mendes, que trabalha como terceirizado na Volkswagen de São Bernardo do Campo, local de origem do atual presidente da Central Única dos Trabalhadores, Luiz Marinho.

O metalúrgico Gediael Inácio Tavares também acredita que o país melhorou.

– A princípio, já sentimos uma grande melhora. É gente da gente que está lá. Nosso representante lá – diz com orgulho.

Vidência

– Eu sei que tem muita coisa que precisa ser acertada, não vai ser de hoje pra amanhã. Mas a gente confia nele e estamos esperando que ele faça um bom governo – diz Tavares, metalúrgico em São Bernardo do Campo desde 1976, onde viu o nascimento dos movimentos sindicais que deram origem ao Partido dos Trabalhadores

Ele concorda com a reforma previdenciária, apesar da polêmica. “Se não tiver dinheiro, como é que vai pagar?”, questiona.

Moacir Martins, metalúrgico há 13 anos, está decepcionado e diz que o presidente Lula está fazendo muito menos menos do que ele esperava.

“A gente tinha uma esperança tão grande que melhorasse…”, lamentou.

– Infelizmente, as coisas não são do jeito que a gente esperava, né? Mas tem que engolir seco esses aumentos, a taxa de juros. A realidade é outra – disse, lembrando dos tempos em que o sindicato liderado por Lula parava a Rodovia Anchieta com a greve dos metalúrgicos.

Paralisação

– Estou vendo que um dia vamos ter que parar contra ele, que era o cara que liderava as paralisações – lamenta.

– Como um sindicalista que fez tanta coisa por nós, isso devia doer na pele dele, por nós. Mas não.

O cientista político Alberto Almeida, pesquisador da FGV-Opinião, afirma que a mudança de postura do Partido dos Trabalhadores na oposição e no governo é natural.

Ele não acredita que a adoção de políticas semelhantes às que criticava quando era oposição é incoerência, mas uma coerência com a natureza do papel de oposição.

Esquerda

“Oposição não tem que apoiar o governo”, resume, salientando que o método é legítimo e faz parte da jogo político-partidário.

– Quando o câmbio era fixo, o PT era contra o câmbio fixo e quando o câmbio passou a ser flutuante, em janeiro de 99, o PT passou a ser contra o câmbio flutuante – lembrou.

– Isso é uma contradição? Não. Isso é uma coerência muito grande de oposição – afirma.

Mas, da mesma maneira que o PT caminhou para o centro da ideologia política e adotou a política econômica do governo Fernando Henrique Cardoso, Almeida diz que o partido deve estabelecer um padrão de política social para os próximos governos.

– É muito provável que os governos posteriores, sejam petistas ou não, mantenham essas políticas – afirmou.

O futuro do PT, na avaliação de Almeida, é se manter na centro-esquerda, e se fortalecer ainda mais como partido.

– Da mesma maneira que o Tony Blair, na Grã-Bretanha, e Gerhard Schröder, na Alemanha, mantiveram políticas de seus antecessores e não deixaram de ser de esquerda – afirma.