Stédile: “A reforma agrária está parada”

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Publicado quinta-feira, 30 de dezembro de 2004 as 11:58, por: CdB

Líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e um dos principais críticos da política econômica do governo, o economista João Pedro Stédile faz a sua avaliação dos avanços e retrocessos da política brasileira ao longo de 2004. Para ele, o ano foi razoável, embora os segmentos mais conservadores da sociedade tenham conquistado boa parte do terreno fértil, onde deveriam ter sido plantadas a reforma agrária e a distribuição de renda mais equitativa no país. Em 2004, a União se endividou, através dos juros altos, e apostou em um segmento deficitário, como o agronegócio, que precisa de R$ 2,2 bilhões em “subsidio para reparar os prejuízos dos exportadores agrícolas”, afirma. Para João Pedro Stédile, “a reforma agrária está parada”.

– Qual sua avaliação sobre o andamento da reforma agrária em 2004? O que faltou e o que teve de bom?

– O processo de reforma agrária do governo Lula, anda a passos de Tartaruga.  Não conseguiu honrar com o compromisso do Presidente Lula com os movimentos sociais firmado em novembro de 2003, que previa assentamento de 430 mil famílias nos três anos, e que priorizaria as 200 mil famílias acampadas. Não cumpriram as metas.
O Incra continua atuando como bombeiro. Faltam recursos, por culpa da política econômica. Faltam servidores para cumprir a meta. Falta uma diretriz do plano nacional de reforma agrária que, em sua estratégia geral, foi abandonado.
O que teve de bom foi a implantação do seguro agrícola, e a ampliação dos recursos do pronaf, ainda que não cheguem a maioria dos assentados, mas pelo menos ampliou para os agricultores familiares.
 
– As medidas provisórias editadas para liberar plantio e comercialização dos transgênicos e a lei de biossegurança que ainda tramita no Congresso parecem deixar claro que, de agora em diante, os brasileiros terão de conviver com os organismos geneticamente modificados. Quais aspectos políticos e econômicos se podem extrair desse quadro?
 
– A atuação do governo federal em relação a liberação de sementes transgênicas foi uma vergonha!  O governo ficou refém dos interesses das transnacionais, como a Monsanto, Sygenta, etc, além dos interesses do governador Rigoto (PMDB-RS) que o pressionou todo tempo, e dos fazendeiros, lúmpens, que sonharam em ganhar dinheiro fácil com as sementes transgênicas, e passados dois anos, já estão amargando as conseqüências.   Primeiro porque a soja transgênica não é mais produtiva do que a convencional. Segundo porque a Monsanto cobrou e levou dos agricultores gaúchos nada menos do que 80 milhões de reais na ultima safra, cobrando R$ 0,60 por saco de soja.  E agora anuncia que vai cobrar 1,20 ao saco. Isso vai representar 5% do preço da soja.  É a volta do feudalismo, da renda-trabalho, em que uma transnacional cobra sem fazer nada.  Sem vender um grama de semente, sem plantar um grão.
Por trás da questão das sementes transgênicas, mais além da precaução que devemos ter em relação ao meio ambiente e a saúde, cada planta transgênica precisa ter um estudo específico não se pode generalizar. Nós temos o problema do controle das transnacionais sobre nossa agricultura, pois as sementes transgênicas permitem a propriedade privada das sementes, da vida.  O que esta em jogo é a soberania da agricultura brasileira, é o direito dos agricultores poderem cultivarem suas próprias sementes ou não.   E o governo não entendeu nada disso, e fez o jogo como patinho, das transnacionais.  Patrocinadas pelo seu porta-voz dentro do governo, o ministro da agricultura, o senhor Roberto Rodrigues, ou como o governador do Paraná, Roberto Requião prefere chamá-lo de Ministro RR, numa referencia a soja rondup, que usa a mesma sigla da soja RR.
 
-Quem são os culpados pelo fato da situação dos brasileiros não ter se alterado substancialmente em 2004? Ou o senhor não concorda com essa afirmação?

– O Brasil