Rushdie critica “ministérios do medo” no governo Bush

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Publicado quarta-feira, 19 de maio de 2004 as 08:54, por: CdB

Os livros não são queimados. São queimados os escritores. Dessa maneira, o escritor indiano naturalizado britânico, Salman Rushdie, iniciou sua intervenção na conferência “O valor da palavra”, nesta terça-feira, no Fórum Universal das Culturas, em Barcelona. Rushdie tornou-se mundialmente conhecido após a publicação do livro “Versos Satânicos”, que lhe rendeu numerosas ameaças de morte do mundo radical islâmico

Sobre a situação política internacional, Salman Rushdie foi enfático nas críticas à posição dos Estados Unidos. “Eles (EUA) cerram suas fronteiras quando deveriam estar abertos, pois necessitam dialogar com todo o mundo”.

Também a cultura do “medo”, disseminada pelo atual governo norte-americano, não foi poupada pelo escritor:

– O ministério dos falsos alarmes do governo Bush, criado depois de 11 de setembro, submete os americanos à ditadura do medo.

Numa palestra apaixonada e repleta de citações de outros escritores, ele mostrou o poder da literatura frente às guerras, perseguições e ditaduras, defendeu a necessidade de proteção da memória dos países e, ao final de sua fala, convocou o governo norte-americano a dialogar com o resto do mundo “num momento em que a história de todos os seus habitantes está se mesclando”.

– Até onde sei, somos a única espécie viva que narra histórias. Todos vivemos dentro de histórias e vamos contando e ajustando-as com o passar do tempo. Se não nos deixam fazer isso, essas histórias se transformam em cárcere. E esse é o ponto: quando se tenta controlar, censurar é mais que um ataque à literatura, é um ataque à natureza humana. A obra de Ovidio sobreviveu ao Império Romano, mas ele teve que se exilar. Recordo-me de um caso muito mais recente de um escritor argelino que foi assassinado brutalmente. Os mandantes pagaram dez dólares e deram uma pistola ao matador. Morreu por dez dólares.

A defesa dos escritores, de acordo com Rushdie se faz mais necessária do que nunca. Um estudo da Organização Internacional dos Escritores (PEN),
instituição que ele preside nos Estados Unidos, mostrou um registro de 500
casos muito graves – assassinatos, torturas, condenações – contra
jornalistas, escritores e editores na década de 90. No ano 2000, esse número foi reduzido a 100, a partir do esforço da PEN e das denúncias contra a liberdade de expressão. A situação se reverteu depois dos atentados de 11 de setembro, nos Estados Unidos. Em 2003, os casos graves superaram 700.