Por que não te calas, ó Dilma?

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Publicado terça-feira, 30 de junho de 2015 as 18:08, por: CdB
Quando não se tem nada aproveitável para dizer…
A presidenta Dilma Rousseff deveria mirar-se no exemplo do Marco Polo Del Nero e não sair tão cedo do seu canto.
Por motivo diferente, claro. Ao contrário do cúmplice de José Maria Marin, ela pode correr mundo  à vontade, sem o mínimo receio de prisão e extradição. Deste tipo de vexame a Dilma nos poupa.

Mas, cada vez que abre a boca no exterior, deixa morrendo de vergonha todos que a temos como presidenta da República.

Ora atribui seu novo recorde de impopularidade a um inverossímil preconceito sexual por parte dos brasileiros que há poucos meses a reelegemos. Não consta que, depois de outubro de 2014, tenha ocorrido em nosso país uma epidemia de machismo. É, portanto, uma saída pela tangente, uma desculpa de mau pagador.

E, se nem na Quadrada das Almas Perdidas uma lorota destas cola, muito menos na capital do Império. Os leitores do Washington Post, um dos jornais mais importantes do planeta devem ter sentido pena de nós.

Ora Dilma faz um verdadeiro samba do crioulo doido por não levar em conta a regra de ouro de que roupa suja se lava em casa. Qualquer mandatário que se desse ao respeito e tivesse respeito pelo seu cargo não se manifestaria em solo estrangeiro sobre um assunto doméstico tão pobre e tão podre.
Primeiramente, porque é o partido no poder que está sendo duramente atingido por alcaguetagens dos seus parceiros de negócios, a ponto de tirar Dilma do sério. Então, a primeira coisa que ocorre a um estrangeiro dotado de espírito crítico é: como o tal Partido dos Trabalhadores foi envolver-se com uma ralé tão nauseabunda?!
…é melhor lembrar que em boca fechada, não entra mosca.
Se, ademais, tal cidadão conhecer o passado do PT, mais estupefato ainda ficará: pois não é que uma agremiação nascida das lutas contra o patronato agora foi pilhada em associação criminosa com um dos segmentos mais vorazes e inescrupulosos do empresariado, os empreiteiros de obras! Virou tudo de cabeça pra baixo?
É óbvio que as declarações de Dilma, dadas durante conversa com jornalistas em Nova York, se endereçavam ao público brasileiro; mas, eram a hora e o lugar errados para as fazer, porque, queira ela ou não, o que presidente da República fala em viagem internacional tende a ter repercussão também internacional. Por que não incumbir um porta-voz qualquer de dar tal recado cá no Brasil?
É claro que melhor mesmo teria sido ela, simplesmente, calar. Pois,  nada se aproveita desta mistura de alhos com bugalhos:

Eu não respeito delator, Até porque eu estive presa na ditadura e sei o que é. Tentaram me transformar numa delatora. A ditadura fazia isso com as pessoas. Eu garanto para vocês que eu resisti bravamente.

O que tem a ver, afinal, uma militante que combateu uma ditadura bestial com um meliante que assaltou o Estado em plena democracia?
Como equiparar o ato de não ceder às bestas-feras que queriam torturar e matar os melhores brasileiros com o ato de não ajudar os agentes de um Estado de Direito a denunciarem e processarem os piores brasileiros ?
Daria para esperar outra coisa deste indivíduo?
Como uma ex-resistente se tornou tão desnorteada a ponto de ela própria propor que a comparem a um reles Ricardo Pessoa (ao afirmar que ele fez o que ela não aceitou fazer), como se fossem valores de mesma grandeza?
Como uma presidente da República se põe a deitar falação sobre investigações policiais e judiciais em curso (o que, claro, configura pressão indevida e absolutamente injustificável sobre outras esferas do Estado)?
E, tendo tal forçação de barra pontos de contato com os disparates demagógicos de alguns articulistas e blogueiros chapa branca, é o caso de indagamos se ela estará insinuando  a existência de alguma semelhança entre os métodos da Polícia Federal e os do DOI-Codi, entre o juiz Sérgio Moro e os auditores militares.  Espero que não, pois aí já seria desespero de causa; e causas defendidas com tamanho desapreço pela verdade estão desde logo fadadas à derrota.
De resto, como ex-preso político que quase enfartei aos 19 anos por causa das torturas e saí dos porões da ditadura com uma lesão permanente, acrescento que a comparação que Dilma fez peca também no aspecto de ser descabido ela afirmar que resistiu bravamente aos que queriam transformá-la numa delatora.
É preconceituoso e desumano qualificar de delatores aqueles de quem os torturadores arrancaram alguma informação; todos sabemos que a resistência humana tem limites, quem cultuava super-homens (ou super-mulheres…) eram Nietzche e os nazistas.
Os correspondentes aos delatores premiados de agora não eram os pobres torturados, mas sim os vis  cachorros da repressão –militantes que, aceitando propostas indecentes dos torturadores, passavam a trabalhar para eles, em troca da liberdade, de uma nova identidade e de um pagamento mensal. Ou seja, negociavam os detalhes da barganha, firmavam o pacto e então mudavam de lado, para receberem  contrapartidas dos verdugos. Não porque fossem coagidos a tanto, mas simplesmente para encurtarem a permanência na prisão e levarem vida melhor fora dela.
Quem se deita com cães, amanhece com pulgas.
Se Dilma queria comparar o dono da construtora UTC com alguém, por que não fez a escolha correta, equiparando-o aos ditos cachorros? Talvez porque assim a pertinência seria maior mas a dramaticidade, menor, não servindo a seu propósito de usar um nobre passado como escudo contra acusações (verdadeiras ou não) que lhe fazem no presente.
Muitos dos que optamos por travar o bom combate em circunstâncias tão extremas, arriscando a vida, a integridade física/psicológica e a segurança de nossos entes queridos, consideramos imensamente mais importante o que fizemos então do que qualquer coisa que façamos ou sejamos agora.

Mesmo para salvar uma Presidência da República sob a democracia burguesa, não utilizaríamos como trunfo nem faríamos chantagem emocional a partir de uma luta que para nós foi sagrada. Até porque temos um débito de gratidão para com os companheiros que não estão mais conosco.

É pena que a Dilma não seja mais como nós nem pense mais desta maneira.

DE HORA EM HORA DILMA PIORA E A ESQUERDA DEGRINGOLA

Como diria o Lênin, estamos num daqueles momentos em que “é preciso dar um passo atrás para depois dar dois passos adiante”.
Enquanto Dilma Rousseff estiver na Presidência e o Brasil em recessão, sua popularidade minguará cada vez mais: o mau humor generalizado com a queda de poder aquisitivo, acrescido da indignação também generalizada por ela haver adotado a política econômica que jurou de pé juntos jamais adotar, magnifica o impacto das acusações de corrupção que jorram profusamente das operações Lava Jato e Acrônimo. A agonia lenta de Dilma é o pior dos mundos possíveis.
Colocado numa permanente defensiva, o PT só tem forças para tentar salvar a si próprio, enquanto as forças conservadoras vão impondo sua pauta em toda linha, como se quisessem fazer o País voltar à Idade Média.
A direita não tem pressa: de hora em hora a situação da Dilma piora. Seu desgaste vai aumentar até que haja algum tipo de ruptura. E, quanto mais durar o impasse, mais a esquerda se desmoralizará, até ficar com a imagem em frangalhos.

Lembrem-se: a força motriz de todo esse baixo astral é o péssimo desempenho da economia brasileira. E não há hipótese de sairmos da crise antes de 2017, nem garantia nenhuma de que a maré vá começar a virar mesmo então.

Se hoje a Dilma só tem a aprovação de 10% dos brasileiros, como estará, digamos, daqui a um ano? Com 1%? Não dá para esperarmos tanto. O Brasil se esfarelará.
Então, se o PT hoje não estivesse tão aferrado ao poder pelo poder, como o Lula tão bem diagnosticou, seria a hora de pensar seriamente na renúncia de Dilma Rousseff.
Uma nova eleição jogaria a crise econômica no colo do PSDB e PMDB (o primeiro certamente sairia das urnas como o administrador da massa falida e o segundo como a eminência parda de sempre), tirando-os da cômoda posição de surfarem na desdita brasileira.
Como num passe de mágica, os casos de roubalheira seriam restituídos à sua dimensão habitual. Não existe sinceridade em tal furor moralista por parte do stablishment brasileiro; a corrupção é intrínseca ao capitalismo, jamais será erradicada sob o capitalismo, há raros períodos (como o atual) em que convém aos poderosos jogá-la no ventilador, depois tudo volta a ser como dantes no quartel de Abrantes. Já vimos esse filme várias vezes.

E a esquerda sairia da posição de vidraça que a paralisa, voltando a ser estilingue. Poderia começar a combater os avanços conservadores, tentando reconstruir-se na luta. Precisa reencontrar sua alma. Precisa reencontrar-se com os seus.

Mas, claro, para tanto seria necessário existir um Lênin entre nós, alguém com visão de estadista. Não há. Então, tudo indica que os passos continuarão sendo dados todos para a frente… na direção do abismo e até o mais amargo fim.

Celso Lungaretti, jornalista e escritor, foi resistente à ditadura militar ainda secundarista e participou da Vanguarda Popular Revolucionária. Preso e processado, escreveu o livro Náufrago da Utopia. Tem um ativo blog com esse mesmo título.

Direto da Redação é um fórum de debates editado pelo jornalista Rui Martins.