O silêncio tucano é uma possível lição

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Publicado quinta-feira, 23 de junho de 2005 as 09:00, por: CdB

Na entrevista ao Roda Viva, Roberto Jefferson denunciou, entre outras coisas, a existência de caixa-dois na campanha de FHC. Tucanos destacaram gravidade das outras denúncias, mas silenciaram sobre esta. Entre silêncios e escolhas, Jefferson talvez tenha algo a nos ensinar.


“Que conversa é essa? Estou estranhando tudo isso. Parece que estamos num convento de freiras. Pensei que fôssemos discutir aqui financiamento de campanhas políticas. Vocês sabem disso tudo que estão me perguntando”. As declarações do deputado federal Roberto Jefferson (PTB-RJ) causaram um visível constrangimento entre os jornalistas que participaram do programa Roda Viva, da TV Cultura, na noite de segunda-feira.

De repente, de modo inesperado, Jefferson diz que o ex-banqueiro José Eduardo Andrade Vieira (e futuro ministro), do falecido Bamerindus, foi um dos financiadores “por dentro e por fora” da primeira campanha de Fernando Henrique Cardoso, em 1994. Tinha caixa dois sim senhor e vocês sabem disso, disse o petebista em tom desafiador aos jornalistas. O apresentador do programa, Paulo Markun, chamou o intervalo e na volta nenhum jornalista quis tocar no assunto, apesar do desafio de Jefferson e da provocação ao chamá-los de freiras.

Provocado por Jefferson e movido pelo famoso espírito investigativo da profissão, algum jornalista poderia ter perguntado: deputado, o senhor disse que o PTB passou dinheiro para o PSDB pelo caixa dois; quanto foi passado? quando isso ocorreu precisamente? quem eram os operadores desse repasse; qual era a origem do dinheiro? As perguntas não foram feitas, apesar de o deputado insistir que estava disponível para falar sobre o assunto.

Enfim, a denúncia sobre a existência de caixa dois na campanha de FHC passou praticamente batida na cobertura da mídia, no dia seguinte ao programa. A Agência Estado fez uma rápida referência ao tema no final de uma matéria sobre o Roda Viva. Menos contida, a Agência Reuters destacou no título de uma matéria que “Jefferson admite que repassou verbas ilegais ao PSDB”. E reproduz outro trecho da fala do petebista: “num primeiro momento, houve repasse do PTB para o PSDB na campanha do presidente Fernando Henrique. Uma parte foi declarada”.

A outra parte, segundo ele, não foi declarada ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ao ser indagado se estava fazendo uma denúncia, o entrevistado foi didaticamente claro: “Eu estou afirmando a você”. “Mais tarde, segundo ele, o PSDB destinou dinheiro ao PTB sem registro na Justiça Eleitoral”, lembrou nesta terça-feira a Folha de São Paulo.

Selecionando acusações e gravidades

Estranhamente, ninguém quis mais falar sobre o assunto. Nesta terça-feira, o site oficial do PSDB fez uma abordagem curiosa sobre a entrevista. Em uma nota intitulada “Nova entrevista traz mais detalhes sobre o mensalão”, a Agência Tucana dá total credibilidade ao entrevistado dizendo que “as declarações do deputado Roberto Jefferson no programa Roda Viva apresentado pela TV Cultura reafirmaram as relações espúrias entre o PT e a base aliada”. O deputado Alberto Goldman (SP) diz que “além de confirmar as denúncias que já haviam sido feitas, ele trouxe mais detalhes sobre os esquemas de corrupção”. De fato, trouxe, como, por exemplo, a denúncia sobre a existência de um caixa dois na primeira campanha de FHC.

Goldman e a Agência Tucana silenciam sobre esse tema, selecionando estrategicamente aquilo a que querem emprestar credibilidade. Na mesma linha, o tucano mineiro Rafael Guerra afirma que as acusações de Jéferson são “da maior gravidade”. Quais acusações? Guerra também escolhe as que interessam ao seu partido e silencia sobre o resto.
Coube ao presidente nacional do PSDB, senador Eduardo Azeredo (MG), comentar a denúncia de Jefferson. “Não tenho conhecimento. Essa é mais uma lamentável tentativa de desviar o foco.

O PSDB nada tem a temer e já respondeu quando