O presidente está impaciente

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Publicado quarta-feira, 28 de abril de 2004 as 11:39, por: CdB

Na semana passada, na presença de alguns ministros de Estado, o presidente da República esmurrou a mesa e explodiu: “Já fiz duas reuniões [para tratar de investimentos na área de infra-estrutura]. Não vou fazer a terceira”. Segundo ministros presentes a essa reunião, o presidente estava tenso e impaciente. “Quero gasto, execução. Não agüento mais essa história de financeiro e orçamentário”, exclamou Lula.

Parece perfeitamente plausível a descrição do estado de espírito do presidente, apresentada em matéria publicada no último sábado (“Lula soca a mesa em reunião ministerial”, Folha de S.Paulo, 24 de abril, pág. A 8). A frustração de Lula com os resultados da política econômica e com a inoperância de vários setores da máquina governamental deve ser mesmo crescente. O presidente é um homem essencialmente prático e quer ver as coisas acontecerem. Não tem muito tempo ou paciência para economistas que, munidos das quatro operações da aritmética e de princípios orçamentários e financeiros, estão sempre querendo vetar ou adiar as iniciativas e idéias que chegam à mesa presidencial.

Uma palavra sobre a pessoa do presidente da República. Tudo indica que Lula não é nem estourado, nem temperamental. Ao contrário, parece bastante paciente e tolerante. É totalmente diferente, nesse particular, de outros presidentes que tivemos. De Itamar Franco, por exemplo, que ficou célebre por seu temperamento explosivo e mercurial.

Porém, há um ponto em comum entre os dois presidentes. Como Itamar, Lula governa com uma equipe econômica que lhe é em grande medida estranha, tendo pouco ou nada a ver com as suas inclinações, a sua trajetória e os seus compromissos políticos. Itamar vivia às turras com a Fazenda e o Banco Central. Era menos cuidadoso do que Lula. Expressava as suas insatisfações em público, causando considerável tumulto para seu governo. No fim das contas, acabou domesticado e pouca influência teve sobre a política econômica e o Plano Real, concebido e executado por uma equipe econômica semelhante à atual do ponto de vista ideológico. Evidentemente, entre os dois presidentes há diferenças não só de temperamento, mas políticas. Itamar não tinha sido eleito pelo voto direto, chegou ao poder em razão do “impeachment” de Collor e nunca teve a base partidária e social que Lula construiu ao longo da sua vida política.

Além disso, Lula é de origem popular. Sabe, por dolorosa vivência própria, como nenhum presidente na nossa história, o que é ser povo neste país.

Pode ser que nada disso faça diferença decisiva. Mas será possível que Lula terminará tão domesticado quanto Itamar? Passará o resto do seu governo soltando fumaça pelas narinas, desgastando-se em reuniões inócuas e espinafrando seus auxiliares? Ou acabará por se acomodar à função de executor do modelo macroeconômico do seu antecessor, a despeito da falta de resultados? Seria obviamente um desrespeito a seus compromissos políticos e eleitorais. Mas a verdade é que, em matéria de economia, o governo Lula está, até agora, vivendo do passado – e esse passado não foi brilhante, como sabemos.

Para entender o estado de ânimo presidencial é importante ter em conta o peixe que lhe venderam. Convenceram-no de que seria possível manter uma política macroeconômica conservadora, basicamente a mesma que foi adotada no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso, e ainda assim melhorar a vida do povo com políticas sociais e reformas setoriais de vários tipos. Alimentaram a esperança de que seria factível dar um novo rumo ao país sem correr o risco de tocar na agenda macroeconômica.

Com o passar do tempo, vai ficando claro como era ilusória essa esperança. O governo vai se desgastando e deixando passar o momento mais favorável para promover as mudanças econômicas e sociais que prometeu durante a campanha. Alguma reativação da economia está em curso, mas muito modesta, bem inferior à que seria requerida para produzir melhora apreciável do mercado de t