Notícias sobre a Venezuela real

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Publicado quarta-feira, 26 de maio de 2004 as 10:15, por: CdB

Para isso serve o monopólio – nacional e internacional – da mídia: para dar a pauta sobre um país e ocupar todos os espaços com os temas decididos por ela. Assim acontece com a Venezuela. Só se fala da consulta solicitada pela oposição, uma questão que deve se resolver até o fim de maio. Os opositores devem confirmar pelo menos 800 mil das mais de um milhão de assinaturas contestadas, em um procedimento democrático convocado pelo Tribunal Supremo de Justiça. Mas a oposição queria, ao contrário, um procedimento absurdo: deveriam se apresentar novamente apenas os que não confirmassem sua assinatura – assim, os “mortos”, que certamente não se apresentariam, teriam confirmadas sua assinatura.

Mas a Venezuela não se reduz a isso. E são seus movimentos que podem representar o desenlace favorável ao governo nessa crise política suscitada pela oposição e multiplicada pela mídia monopólica.

Dia 1º de agosto haverá eleições estaduais e municipais. A oposição havia ameaçado não participar, mas acabou inscrevendo seus candidatos no último momento, na expectativa de que fosse aprovada a consulta ou, caso esta não se desse, teria uma forma alternativa de ação. Existem mais de 10 mil candidatos, incluídos os cargos de 23 governadores. Nesse clima, a petição da oposição vai se diluindo e minguando.

Enquanto isso, a economia se recupera de forma acelerada, apoiada no aumento do preço do petróleo, depois de quase onze trimestres de índices negativos. Os investimentos estatais, que privilegiam as pequenas e médias empresas, são a alavanca dessa recuperação. Neste ano, a empresa estatal do petróleo PDVSA investirá cinco bilhões de dólares.

Mas no começo de 2003, o PIB havia diminuído 27,6%, a inflação era de 38,7%, o desemprego, de 20,7%, e as reservas internacionais tinham diminuído para menos de 14 bilhões de dólares. A reativação começou no quarto trimestre de 2003, e em 2004 o crescimento do PIB será de pelo menos 6%, com a inflação baixando para 21,9% e as reservas internacionais superando os 20 bilhões de dólares. O desemprego continua sendo o principal problema do país, ainda em 15%, mas com um subemprego de quase um terço da população.

As mudanças estruturais estão se dando no nível educacional e de saúde, segundo o ministro de Planejamento e Desenvolvimento, Jorge Giordani. Ele diz que hoje a Venezuela, um país de 17 milhões de pessoas maiores de 15 anos, tem 9 milhões de estudantes. “Este é um país que está estudando!”, defende ele. E anuncia: “No próximo dia 5 de julho teremos terminado praticamente com o analfabetismo. Em um ano alfabetizamos um milhão, duzentas e cinqüenta pessoas, graças aos métodos de alfabetização maciça dos cubanos, que também nos ajudaram a levar a atenção de saúde aos bairros.” Tudo isso é sentido pelas pessoas, estendendo o apoio da população ao governo.

Mas o governo de Hugo Chávez não se restringe a usar o aumento dos preços do petróleo para ampliar suas políticas sociais. A Venezuela também ajuda a países do cone sul latino-americano. Assinou um convênio com a Argentina para fornecer 700 mil metros cúbicos de fuel oil e 250 mil de gás oil, em troca de sementes, carne congelada, gado e outros produtos argentinos. O presidente da PDVSA, Ali Rodrigues viajou a Montevidéu e afirmou, em reunião com representantes dos países do Mercosul, sua disposição de fornecer petróleo aos países da região em condições preferenciais. As condições serão as mesmas que o México e a Venezuela vendem petróleo aos países da América Central e do Caribe.

Emir Sader, professor da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), é coordenador do Laboratório de Políticas Públicas da Uerj e autor, entre outros, de “A vingança da História