Norma sobre aborto está de acordo com o Código Penal

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Publicado sexta-feira, 11 de março de 2005 as 16:42, por: CdB

A norma técnica do Ministério da Saúde que autoriza os serviços médicos a realizarem abortos em caso de estupro sem necessidade de apresentação do boletim de ocorrência policial (BO) está de acordo com o Código Penal. A afirmação foi feita pelo diretor-adjunto do Departamento de Ações Programáticas do Ministério da Saúde, Adson França. Segundo França, o Artigo 128 do Código Penal, que define as situações em que o aborto é legal (risco de vida para a mãe ou gravidez resultante de estupro), também não exige um boletim de ocorrência ou qualquer instrumento para que seja realizada a interrupção da gravidez nos serviços públicos de saúde.

Mesmo sem ter sido lançada oficialmente, o que acontecerá no dia 22 de março, a norma já criou polêmica. Questionado por jornalistas, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Nelson Jobim, disse ontem (10) que as normas instituídas por conselhos ou ministérios não têm validade jurídica. Para Jobim, nenhum ato do Poder Executivo pode afirmar que uma ação não terá conseqüências jurídicas. Apenas leis ou decisões do judiciário podem dar esse tipo de garantia aos cidadãos, afirmou o ministro.

Adson França explicou que a norma orienta que os médicos continuem a exigir o boletim de ocorrência no atendimento de vítimas de estupro que desejarem realizar o aborto, como já determinava a norma anterior, de 1999. De acordo com França, a diferença é que o atendimento não será mais negado nos casos em que a vítima de violência não puder registrar a ocorrência.

– Há casos em que a mulher não busca o BO porque é ameaçada de morte, ou tem transtornos mentais.

Nesses casos, o atendimento será precedido de uma avaliação do caso por uma equipe multidisciplinar, o que incluirá o atendimento psicológico prévio, que poderá esclarecer se a mulher está falando a verdade, disse ele.

O Ministério da Saúde esclareceu que a norma não tem como propósito substituir o que diz a legislação em vigor, mas apenas orientar os serviços públicos de saúde para ampliar o acesso e a humanização no atendimento às mulheres.

– Em momento algum, a norma tem o objetivo de legislação, ela tem o objetivo orientador. Não estamos interferindo nem nas questões do Judiciário nem nas questões do Legislativo – explicou França.

A posição do Supremo Tribunal Federal também invalida a resolução aprovada quarta-feira (9) pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS), que aprova o aborto no caso de gravidez de fetos anencéfalos. Nesse caso em específico, o diretor da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde, José Caetano Rodrigues, afirma que irá requerer que o STF se pronuncie, por meio de jurisprudência, para permitir que todas as gestantes do Brasil possam recorrer ao sistema público de saúde para antecipar o parto.

– A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde está justamente questionando o poder da Justiça sobre este aspecto, porque o nosso Código Penal é vigente desde 1940 e, na época, evidentemente, não havia tecnologia para averiguação de hipóteses, como no caso da anencefalia.

Ele reconheceu, no entanto, que sem o aval do Supremo a resolução do CNS não terá eficácia num primeiro momento.

– Uma resolução tem sua eficácia a partir dos princípios previstos na legislação. Então, essa resolução expressa apenas o pensamento de todos os conselheiros acerca do assunto.

O STF deve julgar em abril a ação proposta pela confederação para que a ”interrupção da gravidez” em gestantes portadoras de fetos anencefálicos não seja equiparada ao crime de aborto.

O abortamento é considerado um grave problema de saúde pública no Brasil e é atualmente a quarta causa de mortes de mulheres no país. Segundo estimativa da Organização Mundial de Saúde (OMS), no Brasil, 31% das gestações terminam em aborto. A estimativa é de que ocorram 1,4 milhão de abortamentos espontâneos e inseguros no país. A gravidade da situação do abortamento se reflete no Sistema Ú