Microcrédito para consumo avança, para negócios, não

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Publicado terça-feira, 23 de março de 2004 as 10:23, por: CdB

Lançado em 25 de junho de 2003 pelo presidente Lula, o bilionário programa de microcrédito do governo federal ainda é marcado por dúvidas quanto a seus resultados e críticas da sociedade civil. De um lado, as linhas de crédito orientadas para pequenos empreendedores, mantidas sobretudo pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), não conquistaram novos clientes. De outro, o microcrédito ao consumo popular, oferecido por bancos públicos e privados, dá a impressão de avançar, mas com lentidão – na verdade, esses números ainda são uma incógnita, pois o Banco Central só fará sua avaliação em meados de 2004, um ano após o início do projeto.
 
Desde que alterou, em junho de 2003, as regras para acesso às suas linhas de crédito, o BNDES não fechou um novo contrato sequer. O motivo das mudanças era nobre. Além de encontrar irregularidades em acordos firmados na gestão anterior, os executivos do banco afirmaram que as operadoras de microcrédito tinham acesso às linhas de crédito com juros baixos – pouco acima de 10% ao ano -, mas as ofereciam aos clientes com taxas bem superiores, algumas chegando a 80% ao ano. O BNDES decidiu, então, só liberar dinheiro para operadoras que se comprometessem a aplicar juro nunca superior a 2% ao mês (cerca de 25% ao ano), no caso dos empréstimos de R$ 1 mil.
 
“A análise do programa anterior demandou um tempo de reavaliação (..) foram ouvidos diversos atores sociais com o objetivo de estabelecer parâmetros que tornassem possível conciliar os interesses do BNDES, no que tange ao desenvolvimento sustentável do país com inclusão social dos empreendedores populares não atendidos pelo sistema financeiro e pelo crédito, e as possibilidade de remuneração dos agentes repassadores dos recursos”, diz a assessoria do banco, em resposta por escrito à Agência Carta Maior.
 
No entanto, as operadoras de microcrédito alegam que o engessamento dos juros torna sua atividade insustentável. “O microcrédito é um programa de inclusão social, e a taxa na ponta do cliente não pode ser a única referência, mas apenas uma delas”, diz José Caetano Lavorato, presidente da Associação Brasileira das Instituições de Microcrédito e Bancos do Povo (Abcred) e do Banco do Povo de São Paulo, entidade ligada à Prefeitura Municipal.
 
Lavorato argumenta que, sem uma remuneração maior, os programas já existentes não conseguem garantir o giro do dinheiro e sustentar suas estruturas personalizadas de atendimento ao pegador de empréstimo. Em São Paulo, as 15 agências do Banco do Povo mantêm equipes de agentes de crédito que visitam regularmente os clientes, avaliam o projeto de cada um e conferem a destinação do dinheiro. Esse esquema garante a inadimplência zero registrada em sua principal linha de crédito, destinada à população de mais baixa renda. Mas para sustentar tudo isso, o Banco do Povo paulistano cobra uma taxa de 3,9% ao mês – 1,9 ponto percentual acima do máximo estabelecido pelo BNDES.
 
Essa polêmica já é conhecida no Palácio do Planalto. Em dezembro, o governo anunciou a criação de um grupo de trabalho interministerial para avaliar o andamento do programa, sob coordenação da Fazenda. Na primeira reunião, em 6 de fevereiro, Lavorato reforçou as divergências. “O BNDES se colocou numa armadilha e agora não sabe sair dela. Há um custo para fazer o que os bancos não fazem, e chegar ao pequeno empreendedor”, diz o dirigente, justificando os juros maiores. Segundo ele, diversas operadoras passam dificuldade porque não conseguem mais ter acesso às linhas do BNDES, historicamente o principal financiador dessa atividade no país. Ano passado, o banco dizia dispor de R$ 550 milhões para financiar projetos no setor.
 
Apesar das críticas, o BNDES permanece irredutível. A instituição mantém o otimismo em firmar um contrato de pelo menos R$ 3 milhões com o banco BMG, com sede em Minas Gerais, que aceitou operar com taxa máxima de 2% ao mês. O banco, que