Meryl Streep rouba a cena em Sob o Domínio do Mal

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Publicado sábado, 13 de novembro de 2004 as 09:09, por: CdB

Em um ano repleto de refilmagens, a versão 2004 de Sob o Domínio do Mal (“The Manchurian Candidate”) tem uma tarefa especialmente intimidadora pela frente, a de tentar equiparar-se ao original, de 1962.

Mas o diretor Jonathan Demme se mostrou à altura do desafio, criando um Sob o Domínio do Mal que, ao mesmo tempo em que atualiza a premissa do filme original — ambientado na Guerra Fria — com uma história situada nos tempos atuais, rende homenagem respeitosa à visão artística do falecido John Frankenheimer, diretor do primeiro longa.

O filme original, que ainda conserva boa parte de seu poder instigante, ocupa um lugar no folclore de Hollywood — consta que seu lançamento teria sido adiado pela distribuidora United Artists na esteira do assassinato de John Kennedy.

Entre os pontos fortes do novo trabalho constam um roteiro bem escrito e uma série de atuações fortíssimas de um elenco formado por profissionais de alto gabarito, incluindo Denzel Washington, Meryl Streep, Liev Schreiber e Jon Voight.

Alguns problemas e falhas não permitem que o novo Sob o Domínio do Mal alcance o status de obra-prima, mas não há dúvida de que é muito, muito melhor do que o remake anterior dirigido por Demme, quando ele transformou Charada em O Segredo de Charlie

No papel representado originalmente por Frank Sinatra, Denzel Washington é Bennett Marco, major do Exército americano que sofre de pesadelos desde que seu pelotão foi emboscado no deserto do Kuweit, na Guerra do Golfo.

Atualmente, Marco dá palestras de motivação relatando os atos heróicos do sargento Raymond Shaw (Liev Schreiber no papel que foi originalmente de Laurence Harvey), que recebeu a Medalha de Honra por ter salvo seus homens.

Mas aqueles sonhos sombrios de Marco, repletos de imagens de tortura e lavagem cerebral, apontam para a idéia de que os fatos reais podem não ter ocorrido da maneira que foram oficialmente registrados.

Quando um veterano problemático de seu pelotão (Jeffrey Wright) vem corroborar as dúvidas que atormentam Marco, este decide falar com o sargento Raymond Shaw, mas chegar até ele se mostra difícil.

Graças à manipulação magistral da mãe dominadora do sargento Shaw, a senadora Eleanor Prentiss Shaw (Meryl Streep no papel que foi de Angela Lansbury), o status de herói da Guerra do Golfo foi aproveitado para lançá-lo candidato à vice-presidência.

Sua mãe não está disposta a permitir que nada nem ninguém oponha obstáculos a seu caminho até a Casa Branca.

O filme aproveita bem o roteiro competente de Daniel Pyne (A Soma de Todos os Medos) e Dean Georgaris (O Pagamento), conservando o sentimento de paranóia claustrofóbica que caracteriza o romance original de Richard Condon.

O diretor Demme vai intensificando o suspense com grande habilidade, acumulando uma série de fatos e revelações bizarros e constrangedores.

Apesar do esforço consciente para não identificar Raymond Shaw com nenhum partido político específico, vários pontos da trama do filme, incluindo o conceito de um candidato presidencial “fabricado” e de uma imprensa complacente, devem ter agradado em cheio a Michael Moore.

As atuações dos atores são impecáveis.

Meryl Streep deixa claro estar curtindo cada segundo de um dos papéis mais consistentes que ganha há anos. Denzel Washington e Liev Schrieber estão discretos, mas magistrais. A cena em que têm a câmera apenas para eles dois é especialmente eletrizante.

Outros que mostram um trabalho ótimo são Kimberly Elise (retomando o papel representado há 40 anos por Janet Leigh), como balconista simpática de supermercado que conhece o personagem de Washington num trem, e Jon Voight como concorrente de Shaw à vice-presidência e inimigo de longa data do personagem de Meryl Streep.