Martin Scorsese é mestre do cinema, mas ainda está aprendendo

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Publicado segunda-feira, 13 de dezembro de 2004 as 22:56, por: CdB

Mesmo o mestre cineasta Martin Scorsese, cujos trabalhos incluem os aclamados “Taxi Driver” e “Touro Indomável”, admite que ainda tem coisas a aprender sobre a arte de fazer cinema.

Seu filme “O Aviador”, em que Leonardo DiCaprio representa o excêntrico bilionário Howard Hughes, chega aos cinemas americanos este mês em meio à expectativa de que possa ser considerado o melhor filme do ano e valer a Scorsese seu primeiro Oscar. Ele próprio diz que esse tipo de especulação pode acabar prejudicando o filme, ao levar o público a ter uma expectativa exagerada.

Scorsese é conhecido sobretudo por seus filmes em escala modesta. Mas, como “Gangues de Nova York”, de 2002, “O Aviador” é uma grande obra de Hollywood. O filme chega ao público repleto dos efeitos digitais que o diretor de 62 anos raramente utilizou durante sua carreira, que já dura mais de 40 anos.

“O problema é a expectativa criada”, disse ele à Reuters. “Será que esse experimento — se bem que toda vez que você faz um filme, é um experimento — será aceito por um público que quer outra coisa? Não sei”.

Scorsese e todos seus fãs vão saber a resposta a partir de 17 de dezembro, quando “O Aviador” estréia em Los Angeles, San Francisco e Nova York, seguidos pelo resto do país no dia do Natal.

Scorsese fez parte de um grupo de diretores de espírito independente, que, na década de 1970, fez filmes de sucesso fora de Hollywood. Ele focalizava histórias urbanas, feitas com orçamentos pequenos, sobre personagens atormentados que buscavam sua redenção pessoal.

Nos anos 1980 ele sofreu reveses como o controverso “A Última Tentação de Cristo”, mas em 1990 deu a volta por cima com “Os Bons Companheiros”, drama sobre um agente vira-casaca da Máfia, filme que consolidou sua fama de mestre do cinema.

“Gangues de Nova York”, sobre uma guerra entre gangues rivais em Nova York na década de 1860, foi saudado por parte de Hollywood como o filme que finalmente daria a Scorsese o Oscar de melhor diretor. Mas ele o perdeu para o diretor Roman Polanski, por “O Pianista”.

“O Aviador” também está chegando cercado de especulações relativas ao Oscar, e a organização de críticos americanos The National Board of Review situou o filme em segundo lugar na sua lista dos Top 10 do ano, atrás de “Finding Neverland”.

“O Aviador” cobre 20 anos na vida de Howard Hughes, que de jovem produtor de cinema no final dos anos 1920 virou gênio da aviação na década de 1940, antes de mergulhar na loucura que o atormentou até sua morte, em 1976.

O filme começa com Hughes (Leonardo DiCaprio) com 20 e poucos anos, quando fazia o filme de guerra aérea “Hell’s Angels”, na década de 1930. Passa por seus casos de amor com Katharine Hepburn (Cate Blanchett) e Ava Gardner (Kate Beckinsale) e mostra os anos de ouro de Hollywood e a vida noturna em clubes legendários como o The Cocoanut Grove.

Ao mesmo tempo, o filme mostra a genialidade de Hughes como aviador. Ele criou o avião mais veloz de sua época e, em 1938, quebrou um recorde, dando a volta ao mundo em três dias e 19 horas.

Howard Hughes sofria de desordem obsessiva-compulsiva e tinha fobia de micróbios. No filme, ele é mostrado escovando as mãos até arrancar a pele e se trancando sozinho no quarto por semanas a fio.

Sob muitos aspectos, o filme remete ao que Scorsese faz melhor: traça um retrato de uma pessoa atormentada que, em última análise, possui qualidades que a redimem. É a história simples de um indivíduo complexo. Mas, em lugar de pintar esse retrato numa tela pequena, Scorsese o faz em grande escala, como fez com “Gangues de Nova York”.

Seu próximo trabalho será um retorno à escala pequena: um filme de gângster intitulado “The Departed”. “A própria simplicidade é um desafio”, diz Scorsese. “Ela é enganosa”.

E, em Hollywood, especialmente durante essa temporada indecifrável do Oscar, a simplicidade também é algo que frequentemente escapa de quem a procura.