Locarno – dois filmes tratam da imigração

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Publicado quarta-feira, 9 de agosto de 2006 as 06:29, por: CdB

Dois filmes trataram do tema mais atual na ordem do dia européia – a imigração. O primeiro – Um franco igual a 14 pesetas – do cineasta espanhol, Carlos Iglesias, filho de emigrantes que viveu seis anos, quando criança, na Suíça alemã; o outro – Das fraulein – (com dois tremas sobre o a ou Das fraeulein) da cineasta Andrea Staka, suíça mas de origem iugoslava.

O filme espanhol retrata apenas as boas recordações de uma família imigrante temporária e suas decepções no retorno à Espanha de Franco, mostrando uma Suíça ideal do começo dos anos 60, não mais existente. O filme suíço-alemão de Andrea Staka retrata o sentimento de três mulheres – de origem bósnia, sérvia e croata – vivendo na Suíça urbana, dividas entre o país no qual procuram se integrar e o país de origem para onde nutrem sempre o desejo inconstante de retornar.
“As vezes me acordo com um pesadêlo – quando morrer onde vou ser enterrada ? pergunta uma delas, ao que outra responde: “deixa prá lá, depois de morta isso não me interessa!” Essa é uma das muitas inquietações de qualquer imigrante que, enquanto luta para se integrar, aprender o idioma do país de acolha e fazer bem seu trabalho, sente saudade de seu país natal, não esquece sua música, suas tradições e, geralmente, manda um dinheiro para a família lá deixada, enquanto guarda uma parte para construir um casa ou comprar um apartamento e assim preparar a volta.
No róseo filme espanhol, a família retorna para amargar durante todo o restante da vida a ilusão de que na imigração tudo era melhor e mais bonito, apagando da memória todas as dificuldades ali vividas; em Das Fraelein, as personagens sabem ser uma ilusão a idéia de uma volta, se os filhos cresceram e vivem no país da imigração. Mesmo se falando o idioma local, o relacionamento humano não é o mesmo e, com raras exceções, o amargor vivido é o isolamento de uma vida fechada em si mesmo.

A visão da boa e má imigração, num mesmo dia no Festival de Locarno, chega num bom momento. Dentro de um mês, o povo suíço irá votar, num referendo, se aceita ou não a nova lei de asilo suíço, uma aberração jurídica que vai contra os direitos humanos, e que reedita a fobia aos estrangeiros dos anos 70, com a expulsão em massa de imigrantes italianos e o movimento nacionalista A Suíça para o suíços, do deputado federal Schwarzenbach, precursor do atual ministro da justiça, o xenófobo Christoph Blocher.

Justificando seu filme otimista de uma Suíça guardada na sua memória infantil, o cineasta espanhol Carlos Diegues fala que o objetivo de seu filme é mostrar aos espanhóis de hoje a obrigação de darem boa acolhida aos imigrantes ali chegando da África, lembrando-se que, no passado, a Espanha foi também um país de emigração.

Com três milhões de emigrantes em todo o mundo, os dois filmes poderão também interessar ao Brasil, pois vive o contrário da Espanha: de país de imigração vai se transformando num país de emigração, seja para os EUA, Europa ou Japão.

Eram 4 milhões de emigrantes nos anos 60

Carlos Diegues conta ter havido 4 milhões de emigrantes espanhóis pela Europa, nos anos 60, quando seus pais também partiram, atraídos pela incrível taxa de câmbio – um franco suíço valia 14 pesetas. Para fazer o filme, ouviu inicialmente os depoimentos de seus pais mas chegou a entrevistar 58 famílias espanholas e italianas daquela época, todas com um visão positiva da experiência suíça.

Hoje a emigração é um tema atual na Europa e no mundo. Veja-se o que se passa nos EUA com relação aos mexicanos, onde assume feiçoes de um debate ideológico. Como vê essa questão atual ?
Carlos Diegues – Meu país vive hoje uma importante contradiçao, pois foi um país de emigração e se transformou num país de imigração, sem ter um período de transição de aceitação dos próprios espanhóis de retorno para poder ac