Há uma grande fidelidade do filme aos fatos, personagens e suas falas, para não falar das semelhanças dos atores com Marx, Engels e Proudhon.
Por Val Carvalho - do Rio de Janeiro
Vale muito a pena vermos o filme O Jovem Marx, por três motivos no mínimo. O primeiro, porque é a primeira vez que um filme sobre Marx é passado nas telonas e telinhas. O sistema capitalista, que domina também a produção, distribuição e projeção de filmes, não tem o menor interesse nisso.
O segundo motivo, é a grande fidelidade do filme aos fatos, personagens e suas falas, para não falar das semelhanças dos atores com Marx, Engels e Proudhon. Além disso, interpretar um Marx criticamente mordaz e ao mesmo tempo convincente, e também um Engels colaborador, mas com ideias próprias, não é algo fácil.
O filme foi muito feliz em mostrar uma Jenny crítica, participante e revolucionária como o marido Marx. A burguesia tenta sempre mostrar um Marx machista e Jenny apenas como uma mulher sofredora.
Marx e O Capital
O filme soube mostrar também a difícil relação de Marx com Proudhon e, junto com Engels, a sua complicada luta teórica contra as ideias utópicas da Liga dos Justos, que frequentemente descambava para embates pessoais. Mas foi isso, como mostra o filme de forma realista, o que transformou uma Liga utópica em Liga Comunista, principalmente com a publicação de seu Manifesto pouco depois, expondo o que seria cada vez mais o socialismo científico.
Um detalhe pitoresco, mas que deixava Engels, a Liga e posteriormente os editores de O Capital à beira de um ataque de nervos, é o seu preciosismo; de nunca considerar seu texto finalizado, e assim furar todos os prazos para a entrega.
Por último, gostaria de falar aqui de um ponto nem sempre visível, mas que foi essencial para transformar Marx em “marxista”. Até 1844, Marx não ia muito além de um filósofo hegeliano que tinha se tornado materialista, mas, ao contrário de Feuerbach, não abandonou o método dialético herdado de Hegel.
Essencial
Nesse momento a intervenção de Engels foi essencial para fazer Marx dar um salto de qualidade em seus estudos. Como ele já tinha lido e gostado de seu livro A situação da classe trabalhadora na Inglaterra, Engels insistiu muito para ele começar a estudar economia política, sobretudo Adam Smith e David Ricardo, os melhores. Além disso, Engels pagou uma viagem providencial do companheiro à Inglaterra, onde o mesmo pode ver toda a riqueza e miséria produzidas ao mesmo tempo pelo capitalismo mais desenvolvido de então.
A partir dessa visita, sua tendência teórica de buscar a razão concreta, econômica, dos problemas sociais e políticos, de ver a “sociedade civil” como causa do Estado, e não o contrário, como pensava Hegel e todos os filósofos da época, se consolidou definitivamente. Para sorte nossa o filme mostra esse momento de iluminação mental na cabeça de um gênio.
Marx nunca mais deixou de priorizar o estudo de economia política e de buscar na base econômica a razão última da evolução da sociedade. Podemos dizer que a partir de 1844, a preocupação central do pai do comunismo era compreender o movimento do capital; as relações de produção do capitalismo. Era escrever o livro fundamental do marxismo, O Capital. Como efeito colateral, continuou a infernizar a vida dos editores e de Engels por sempre adiar, por preciosismo, a entrega de seus livros.
Val Carvalho é articulista do Correio do Brasil.