A cassação de Deltan Dallagnol é mais um capítulo do processo de ostracismo que vem sendo imposto aos ex-membros da outrora poderosa operação Lava Jato, responsável por abalar os pilares da podre República brasileira entre os anos de 2014 e 2018.
Por David Emanuel Coelho
Os chamados Tenentistas Togados espalharam o terror nas hostes políticas nacionais, atacando a tudo e a todos. Inicialmente, pareciam seguir a cartilha do Mensalão, focando o discurso da moralidade contra o governo petista, particularmente contra Lula, e por isso ganharam incondicional apoio da mídia e das altas instâncias do Judiciário. Gilmar Mendes, por exemplo, hoje grande inimigo dos lavajatistas, foi um entusiasmado apoiador de primeira hora da trupe.
A vitória de Bolsonaro em 2018 foi vista pelo establishment como efeito colateral do lavajatistismo graças ao seu discurso moralista e de crítica radical ao sistema político da República Nova. O plano era a vitória de Alckimin e o retorno do tucanato ao poder após quase 20 anos longe da rapadura, mas o ex-presidente fujão acabou faturando dentro da falência generalizada do sistema. A ida de Sérgio Moro para o Ministério da Justiça apenas evidenciou a íntima conexão entre a Lava Jato e a extrema-direita.
Já no final daquele ano Lula era libertado e algum tempo depois teria seus processos anulados pelo STF. Estava montado o palco final do grande acordo nacional, com supremo, com tudo, nas imortais palavras de Romero Jucá, em que o petista seria a última salvação para o establishment impedir o bolsonarismo de engolir todas as instituições nacionais e ser definitivamente varrido do mapa.
Para os outrora heróis da Lava Jato o cenário agora era difícil. A maré virara e tinham feito inimigos para todos os lados, até mesmo com o próprio Bolsonaro, insatisfeito com as pretensões eleitorais de Moro. Esse abandona o governo acreditando na miragem de que seria candidato de uma suposta terceira via, nunca concretizada. Sem viabilidade presidencial, se agarra em um cargo de senador para ter imunidade e renda.
Deltan fareja o mesmo contexto difícil e o MPF, sob a tutela de Augusto Aras, inicia processo disciplinar contra ele. Para escapar, se demite do cargo do Ministério Público e, mesmo contrariando a Lei da Ficha Limpa, se lança candidato a deputado federal, conseguindo a vitória com tranquilidade.
No entanto, os tempos são outros e hoje o lavajatismo não possui mais nenhum poder para levar adiante qualquer ação política. A presença de seus membros no legislativo tem muito mais o papel de blindagem e salvaguarda financeira que o de avanço em um programa reformista. Não interessa mais à burguesia nacional e à plutocracia reviver os dias jacobinistas do Tenentismo Togado. Como resultado, deixam seus antigos vassalos entregues à sanha da miríade de inimigos que fizeram por todo lado naquela época.
Fosse possível sintetizar com uma só palavra a situação de Moro e Dallagnol neste momento e essa seria solidão. Tendo aberto múltiplos flancos de batalha, pois acreditavam estar fazendo desmoronar todo o sistema, fizeram centenas de inimigos, mas quase nenhum aliado. A conta está chegando e não parará de chegar tão cedo. (por David Emanuel Coelho, publicado originalmente no blog Náufrago da Utopia).
Direto da Redação é um fórum de debates publicado no jornal Correio do Brasil pelo jornalista Rui Martins.