Delator envolve Geddel Lima em esquema de corrupção: ‘boca de jacaré’

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Publicado quinta-feira, 8 de setembro de 2016 as 14:13, por: CdB

Geddel foi vice-presidente do banco entre 2011 e 2013 e já admitiu publicamente que se encontrava com Funaro, mas disse que eram encontros de cortesia

 

Por Redação – de Brasília

 

Investigado no âmbito da Operação Lava Jato sob a suspeita de ter sido o operador financeiro do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), em vias de ser cassado no Plenário da Câmara, o empresário Lúcio Funaro, preso em Curitiba, foi flagrado em mensagens de celular acusando Geddel Vieira Lima, um dos ministros mais influentes do governo Michel Temer, de pressionar para que uma operação de R$ 330 milhões, no fundo de investimento do FGTS, o FI-FGTS, fosse concluída.

Segundo a Polícia Federal, Geddel tinha “preocupação exacerbada” sobre um aporte do banco para o grupo J.Malucelli, no valor de R$ 30,6 milhões, o primeiro de um total de R$ 330 milhões. Esse foi o primeiro indício da atuação de Geddel dentro do FI-FGTS, uma das novas frentes da Lava Jato que faz uma devassa nos aportes multibilionários bancados pela Caixa Econômica.

Geddel Vieira Lima é citado em conversas gampeadas pela Polícia Federal, com autorização do juiz Sergio Moro
Geddel Vieira Lima é citado em conversas gampeadas pela Polícia Federal, com autorização do juiz Sergio Moro

Geddel foi vice-presidente do banco entre 2011 e 2013 e já admitiu publicamente que se encontrava com Funaro, mas disse que eram encontros de cortesia. Funaro, por sua vez, é acusado de ser o operador financeiro dos desvios de dinheiro do FI-FGTS, setor controlado pelo PMDB do deputado afastado Eduardo Cunha, que envolve megaempresas, como Odebrecht e a Eldorado Celulose, empresa do grupo que controla marcas como JBS e Friboi. Para a PGR, havia pressão política para liberar investimentos para o esquema, em troca de propina.

A denúncia, que consta na edição online de Época, uma das revistas das Organizações Globo, obteve mensagens que constam de perícia realizada pela Polícia Federal no celular de Fábio Cleto, ex-vice-presidente da Caixa e agora delator na Lava Jato. Os documentos foram vazados, ilegalmente, e acabaram publicados pela revista. “As conversas são de 2012, período que Cleto admitiu à Lava Jato operar dentro do FI-FGTS, a mando de Funaro e Cunha – em troca, ele disse que recebia propina. Geddel e a J.Malucelli não foram citados na delação de Cleto”, afirma a revista.

“Nas mensagens, Cleto e Funaro usavam códigos, de acordo com o Relatório de Análise de Material Apreendido 049/2016. Funaro era ‘lucky’ (sortudo). Cleto era GGeko, uma referência ao ganancioso investidor do filme Wall Street (1987), Gordon Gekko. ‘Ele é boca de jacaré para receber e carneirinho para trabalhar e ainda reclamão’, escreveu Funaro numa mensagem de texto a Cleto. Conhecido pelo temperamento explosivo e verborrágico, Funaro diz ainda que tinha ‘condição total se ele me encher o saco de ir para porrada com ele’. Cleto relata pressão de Geddel”, acrescenta a publicação.

Leia, adiante, os principais trechos da reportagem:

Conversa entre Funaro e Fábio Cleto sobre o ministro Geddel
Conversa entre Funaro e Fábio Cleto sobre o ministro Geddel

A conversa entre Cleto e Funaro gira em torno de operação financeira da Caixa em favor da empresa J.Malucelli Energia. Trata-se de um investimento do FI-FGTS no valor de R$ 330 milhões. O primeiro depósito aconteceu em 2012, no valor de R$ 30,6 milhões.

“Ele está louco atrás dessa operação da Malucelli. Já me cobrou umas 30 vezes”, diz Cleto. Funaro, por sua vez, sugere dificultar o negócio. “Segura essa m… Ele quer f… tudo que não participa. É um porco.” No relatório, a PF não esclarece o contexto da conversa sobre as cobranças.

Geddel, além de ser vice-presidente da Caixa indicado por Michel Temer, era também membro do Conselho de Administração da J.Malucelli Energia – o FI-FGTS era sócio no negócio. “Em princípio, trata-se de uma transação típica de negócio da Caixa, porém, analisando-se os diálogos, verifica-se que Geddel demonstrava uma preocupação exacerbada a esse aporte à J.Malucelli, segundo palavras de Fábio Cleto”, diz a PF no relatório.

Para os investigadores, essas mensagens devem basear novas investigações. “Chamou a atenção ainda a comunicação de aporte financeiro de R$ 30,6 milhões que Fábio Cleto recebera da diretora executiva de Fundos da Caixa, sra. Deusdina Pereira, operação de grande interesse, segundo Cleto, do vice-presidente da Caixa, sr. Geddel Vieira Lima, atual ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República do Governo provisório Michel Temer. Os indícios suscitados neste relatório, oportunamente, poderão subsidiar investigações pontuais sobre os fatos apontados.”

Reprodução de documento do FI-FGTS mostra o aporte citado na conversa de Funaro com Cleto
Reprodução de documento do FI-FGTS mostra o aporte citado na conversa de Funaro com Cleto

Em sua delação, Fábio Cleto disse que recebeu propina para atuar em favor da BR Vias, grupo controlado pela família Constantino, como revelou ÉPOCA. Segundo Cleto, ele recebeu R$ 120 mil, o que equivaleria a 4% da propina. Cleto disse que as ordens partiam de Funaro, que seria próximo do empresário Henrique Constantino.

As mensagens de texto trocadas por Funaro citam o empresário e o presidente Michel Temer. De novo, trata-se de reclamações sobre a atuação de Geddel. “Tal empresário é nominalmente citado nas mensagens e aparentemente reclama do andamento das negociações”, resume a PF. De acordo com o relatório, depois das reclamações de Henrique Constantino, Funaro passa a ameaçar Geddel de acionar Michel Temer, então vice-presidente da República. “Se ele não resolver vou f… ele no Michel”, escreveu Funaro.

Procurado, o ministro Geddel disse que tinha “influência zero” nos investimentos do FI-FGTS. “Caso típico de utilização do nome. Preocupação zero”, disse. O advogado de Lúcio Funaro, Daniel Gerber, disse que as conversas “não representam ilícitos e a defesa provará a inocência nos autos”. O advogado de Fábio Cleto, Adriano Salles Vanni, disse que desconhece os diálogos. Quando o caso foi divulgado, a Eldorado e a BR Vias negaram as acusações de Fábio Cleto. A assessoria da J.Malucelli não foi localizada e o texto será atualizado assim que houver uma posição.

Caixa 2 anistiado

Enquanto a PF tenta elucidar o emaranhado de corrupção que se estende aos mais diferentes setores da sociedade, o Congresso Nacional prepara minuta de um projeto de lei que possibilitará anistiar partidos, políticos e empresários envolvidos em doações eleitorais irregulares. Pelo projeto, seriam criminalizadas as doações feitas via caixa 2 após a legislação ser aprovada, deixando de punir quem praticou o ilícito no passado, desde que confesse o fato à Justiça Eleitoral.

A proposta, gestada no meio empresarial, deve ser incluída na pauta do Congresso por meio de uma emenda substitutiva a uma série de outros projetos do gênero que tramitam na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara visando criminalizar a prática do caixa 2.

— O entendimento é que quem recebeu no passado caixa dois referente a propina não tem perdão. Agora, se foi dinheiro dado sem nada em troca, pode anistiar. √ — disse o vice-­presidente da comissão, deputado Hildo Rocha (PMDB­-MA), a jornalistas.

A proposta vem na esteira criada pela Operação Lava Jato, que tem visto o esquema de financiamento de campanhas eleitorais por meio de caixa 2 como lavagem de dinheiro ou corrupção, já que ao doação irregular por si só não se configura como crime penal. Pelo projeto, as pessoas físicas que fizerem uso da prática podem pegar pena de 3 a 10 anos de reclusão e as pessoas jurídicas seriam impedidas de contratar com o poder público ou obter subsídios por um período de até oito anos.

Vale lembrar que políticos importantes como o atual ministro José Serra (PSDB), a candidata a prefeita de São Paulo Marta Suplicy (PMDB), o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), a ex-senadora Marina Silva (Rede) e até Michel Temer (PMDB), atual presidente da República, foram citados em delação premiada na Lava Jato como beneficiários de caixa dois de grandes empreiteiras como Odebrecht e OAS.