A Corte Européia de Direitos Humanos qualificou na quinta-feira de injusto o julgamento, em 1999, do líder curdo Abdullah Ocalan, e a Turquia sinalizou que está disposta a repeti-lo.
Ancara disse que fará “o que tiver de fazer”, o que indica a intenção de realizar um novo julgamento, mesmo que isso possa provocar turbulências na Turquia, onde Ocalan é acusado de ser o mentor de uma rebelião separatista.
A decisão do tribunal instalado em Estrasburgo (França) ainda precisa de aprovação formal, mas ela pode causar problemas imediatos para um governo que já precisa controlar a inquietação nacionalista para negociar sua adesão à União Européia.
– (Ocalan) não foi julgado por um tribunal independente e imparcial – afirmou o painel de juízes, em decisão por 11 a 6.
O líder curdo está cumprindo pena de prisão perpétua em uma ilha, na qual é o único detento. Os juízes consideraram que ele não teve acesso a consultoria jurídica adequada nem teve condições de preparar sua defesa.
Dezenas de curdos aplaudiram e gritaram em frente a um tribunal, sob uma faixa que dizia “Liberdade para Ocalan — Paz no Curdistão”.
– A corte declarou universalmente que não houve julgamento justo e, nestas circunstâncias, aponta para um novo julgamento – disse Mark Muller, advogado de Ocalan.
O militante foi condenado por traição devido à revolta separatista no sudeste da Turquia, que matou pelo menos 30 mil pessoas nas décadas de 1980 e 1990. Há temores de que a violência recomece, pois em junho o Partido dos Trabalhadores do Curdistão encerrou sua trégua unilateral.
O porta-voz do governo turco, Cemil Cicek, disse que “precisamos ter sangue-frio”, pois a sentença “não é o fim do mundo”. “Nossa gente não deve ficar preocupada (com a possibilidade de Ocalan ser solto), deve confiar no Estado e no Judiciário”, afirmou.
O governo de centro-direita não pode se dar ao luxo de ignorar a sentença da Corte Européia, mas por outro lado não quer dar a impressão de que está se ajoelhando diante do tribunal.
Em 2003, a mesma corte havia concluído que Ocalan teve acesso restrito a advogados. A Turquia recorreu da sentença. O novo veredicto ainda precisa de aprovação do Conselho da Europa, principal entidade continental de direitos humanos.
Não houve consequências imediatas para os mercados financeiros, embora analistas alertem para a possibilidade de protestos contra o veredicto.
Ocalan foi condenado em junho de 1999, quatro meses depois de ser detido no Quênia.
Poucos duvidam que o novo julgamento de Ocanal confirme a prisão perpétua.
As negociações entre União Européia e Ancara começam em setembro. A Turquia terá de demonstrar que cumpre as rígidas condições relativas a direitos humanos e democracia.
Nos últimos meses, caiu o apoio popular turco à adesão à UE, pois muitos consideram que o bloco está impondo condições excessivas ao país.