A idéia do golpe germinou e cresceu nas igrejas evangélicas

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Publicado segunda-feira, 9 de janeiro de 2023 as 00:56, por: CdB

O plano do golpe germinou e cresceu com o apoio dos pastores evangélicos

O golpe vinha sendo alimentado há quatro anos – e isso pouca ou nenhuma gente falou – pelos pastores nos púlpitos, congregações ou tendas evangélicas, agindo junto a pessoas simples e sem cultura. Uma grande maioria dos dirigentes protestantes agora também conhecidos como evangélicos aceitou aderir à extrema direita fascista bolsonarista para ter acesso ao Poder político.

Por Rui Martins

O ovo da serpente está nas igrejas evangélicas

A evangelização deixou de ser exclusiva de Cristo para endeusar também o Messias Bolsonaro, em troca de ministérios, cargos no governo e possibilidade de agir nos setores formadores da opinião como escolas, intervindo também na deformação da cultura brasileira. É o Toma Lá, Dá Cá.

As igrejas com cultos duas vezes por semana, escolas dominicais, reuniões semanais de jovens e idosos são hoje o setor mais politizador do país, porém de maneira discreta, mesmo imperceptível para os profanos. A grande imprensa desconhece esses lugares onde se abastecem os cérebros do gado bolsonarista.

Foram elas, as igrejas, com seu proselitismo a base da vitória de Bolsonaro. A senadora Damares Alves eleita com mais de novecentos mil votos é uma prova, Michelle poderá ser uma ameaça, caso o marido se torne inelegível. Qual o segredo do crescimento político do evangelismo? Não há necessidade de uma plataforma de promessas econômicas, salariais, profissionais, de saúde, nada disso. Os pastores prometem o céu e as pessoas simples aceitam, serão felizes depois da morte.

Mas, além das igrejas, há as redes sociais misturando o reino dos céus com o perigo do comunismo, a receita infalível. Ninguém viu o reino dos céus, ninguém sabe o que é o comunismo, exceto ser vermelho, mas a pregação dá resultado. Os evangélicos eram 5% nos anos 60, e hoje já são mais de 35%, dos quais cerca de 30% rezam ou oram segundo o rito bolsonarista.

Não podemos esquecer as pregações e os gritos golpistas de Silas Malafaia, os apelos golpistas de Cláudio Duarte e de outros pastores usando semvergonha da Bíblia para justificar suas falas antidemocráticas em favor de uma ditadura teocrática bolsonarista.

E quando não são os pastores são os chamados formadores de opinião, da Jovem Pan ou da Record e deve haver outras rádios e jornais e redes sociais na mesma linha. Há mesmo gente falando dos EUA, onde se sentem seguros para pregar o Golpe. Ainda agora, descrevendo as invasões em Brasília chamavam os vândalos criminosos de manifestantes e não de golpistas. Para eles, tudo é permitido em nome da Liberdade, inclusive se pregar um golpe de Estado e querer fechar o STF.

Lembram-se do quebra-quebra em Brasília, no 12 de dezembro, quando incendiaram carros e ônibus? com a maior cara de pau e o maior cinismo, falavam terem sido petistas infiltrados e, agora, devem estar falando a mesma coisa… Não é Rodrigo Constantino e Roberto Motta? Mas há outros, que se dizem jornalistas…

E falar em Distrito Federal ou Brasília, no 12 de dezembro, a polícia do governador Ibaneis Rocha não prendeu ninguém! Verdade, não houve prisões, e ficou por isso mesmo. Essa cegueira era meio difícil de engolir, mas o presidente ainda era o Bolsonaro e ficou por isso mesmo.

Ainda agora, no começo da tarde deste domingo, 8 de janeiro, quando centenas de bolsonaristas invadiram a Esplanada e iam chegando ao Palácio do Planalto, ao Congresso e ao STF, não havia reforço policial e provavelmente também não haveria prisões, se não houvesse a intervenção federal no Distrito Federal.

E diante dos estragos feitos, inclusive em obras de arte nos ataques dos golpistas, o que fez Ibaneis Rocha? Escreveu uma carta de desculpas ao presidente Lula. Ora, deveria ter apresentado sua demissão, embora que ela ocorra depois de processo por imprevidência ou conluio com os golpistas.

Mas não foram só falsos jornalistas, mentores de redes sociais, pastores e governadores que vinham preparando o golpe na água morna, nestes quatro anos, havia parlamentares como Carla Zambelli, PMs de Brasília tomando água de côco enquanto se quebravam as portas do Palácio do Congresso ou do STF. Outros conduzindo mesmo os golpistas aos seus alvos.

Tudo disso poderia ter sido evitado se o Augusto Aras ou sua substituta Lindora Araújo tivessem aplicado a lei. Porque não aplicaram? Devem ter razões bem fortes…

E o responsável por tudo isso, já foi para bem longe, de onde agora será difícil de voltar. Jair Bolsonaro o presidente instigador do golpe, que negociou o apoio com os pastores evangélicos, pensava ir pedir a nacionalidade italiana, que lhe daria imunidade na Itália, mas a chefe do governo italiano, embora sendo também de extrema direita, já criticou os ataques em Brasília, juntando-se na condenação aos golpistas feita também por Emanuel Macron e Joe Biden e outros.

Toda imprensa internacional comentava neste domingo a tentativa de golpe de bolsonaristas com a invasão em Brasília da dos prédios da presidência, do congresso nacional, do supremo tribunal e da esplanada dos ministérios. Amanhã, segunda-feira, o ataque dos golpistas ocupará as manchetes e as principais páginas dos jornais em todo mundo.

O Brasil não precisava dessa propaganda negativa deflagrada por um bando de bolsonaristas vândalos. Mas esse ataque vinha sendo preparado praticamente há quatro anos, embora seu incitador não esteja mais no Brasil e tenha fugido para Orlando, na Flórida, nos EUA. Isso também dirá a imprensa internacional. Versão sonora em vídeo – https://www.youtube.com/watch?v=sBj-cNF5NJw    

Rui Martins é jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. Criador do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas, que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu “Dinheiro sujo da corrupção”, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto Carlos, “A rebelião romântica da Jovem Guarda”, em 1966. Foi colaborador do Pasquim. Estudou no IRFED, l’Institut International de Recherche et de Formation Éducation et Développement, fez mestrado no Institut Français de Presse, em Paris, e Direito na USP. Vive na Suíça, correspondente do Expresso de Lisboa, Correio do Brasil e RFI.

Direto da Rdação é um fórum de debates publicado no jornal Correio do Brasil pelo jornalista Rui Martins.

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