Jornais europeus destacam derrota do chavismo
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Segunda, 07 de Dezembro de 2015 às 08:38, por: CdB
Por Redação, com DW - de Londres:
Os principais jornais europeus destacaram a mudança no mapa político venezuelano após as eleições parlamentares de domingo. A derrota do chavismo foi atribuída à crise econômica que o país atravessa, além da repressão aos opositores por parte do governo do presidente Nicolás Maduro.
Na Alemanha, o Frankfurter Allgemaine Zeitung (FAZ) ressaltou a vitória "esmagadora" da oposição, que conquistou 99 das 167 cadeiras no Parlamento venezuelano. A publicação destacou que a economia do país vem sofrendo com a queda no preço do petróleo, o que reduziu os rendimentos do governo, e com a alta da inflação. Ambos os fatores abalaram a popularidade do governo, diz o jornal, citando a declaração do líder oposicionista Henrique Caprilles: "a Venezuela venceu. Isso é irreversível".
O portal do jornal Die Zeit destacou o "revés" para o governo de Maduro, lembrando que pela primeira vez em 16 anos a oposição conservadora conseguiu conquistar a maioria parlamentar. O diário apontou a derrota do modelo chavista, afirmado que as eleições deste domingo foram consideradas um "plebiscito sobre o controverso projeto socialista" venezuelano.
O jornal britânico The Guardian também qualificou como "esmagadora" a vitória dos oposicionistas venezuelanos, num país que, apesar de possuir "uma das maiores reservas de petróleo do mundo", sofre com a "escassez de alimentos básicos, inflação de três dígitos e uma onda de crimes violentos". O jornal afirma que o resultado deste domingo foi "um duro golpe para a esquerda latino-americana", que enfrenta a "desaceleração econômica na região e o descontentamento dos eleitores frente aos escândalos de corrupção".
– A Venezuela dá as costas ao chavismo – dizia a manchete do portal do jornal espanhol El País nesta segunda-feira. O diário afirmou que a oposição venezuelana "superou todas as adversidades possíveis" para vencer as eleições deste domingo e que o resultado teria sido um "abalo monumental à figura e à gestão do presidente Nicolás Maduro". "A crise econômica, a insegurança e a perseguição de líderes opositores foram motivos suficientes para que a sociedade desse um basta e optasse por uma mudança no mapa político do país", afirmou o jornal.
O francês Le Monde destacou o plano da oposição venezuelana para conceder anistia um de seus líderes, Leopoldo López, preso durante os protestos contra o governo em 2014. Segundo o diário, a coalizão oposicionista Mesa de la Unidad Democrática (MUD) poderá abrir inquéritos sobre a atuação das agências estatais ou ainda forçar a publicação de indicadores econômicos que têm sido mantidos em sigilo pelo governo desde o agravamento da crise.
Venezuela e a versatilidade
O governo venezuelano voltou a taxar de "intervencionistas" os pedidos internacionais para que as eleições parlamentares de domingo ocorram de forma transparente e pacífica. A cúpula chavista aprovou a visita de emissários da União de Nações Sul-Americanas (Unasul) para "acompanharem" o processo de votação, mas eles não têm dito muitas coisas sobre uma campanha eleitoral marcada por acusações de oportunismo e violência política.
Poucos oposicionistas esperavam algo diferente. E, apegando-se à doutrina que lhes inibe interferir nos assuntos internos de seus vizinhos, tanto a Unasul como o Mercosul se abstiveram durante anos das críticas às práticas antidemocráticas do ex-presidente Hugo Chávez (1999-2013) e de seu sucessor, Nicolás Maduro. A última vez que se pronunciaram enfaticamente sobre atrocidades similares foi em 2012, após o golpe de Estado no Paraguai.
Antes disso, condenaram com a mesma dureza o golpe em Honduras, em 28 de junho de 2009. Como explicar a discrição com que os líderes latino-americanos invocam o princípio da não intervenção? Por que se solidarizam com homólogos afastados inconstitucionalmente de seus cargos, mas se recusam a agir quando um dos seus rompe com as regras do jogo democrático?
Executivos blindados
A resposta é por temer que eles próprios possam vir a ser alvos de intenções golpistas ou de censura. Essa é a tese da analista da Fundação de Ciência e Política, Claudia Zilla, e do professor emérito da Universidade de Oldenburg, Fernando Mires. Segundo eles, na América Latina, as rupturas da ordem constitucional não são punidas em nome da democracia, mas na defesa exclusiva do Poder Executivo.
Mariana Llanos, do Instituto Alemão de Estudos Globais e Regionais (Giga), concorda com o argumento, acrescentando que a tendência dos governos de zelar mais por seus interesses do que pela integridade institucional de seus vizinhos é manifestada por meio de ação ou omissão. "O ato de permanecer em silêncio, como tem sido feito frente aos ataques contra a democracia na Venezuela, é uma posição escolhida conscientemente", afirma Llanos.
Podemos afirmar então que os chefes de Estado e de governo latino-americanos têm se blindado juridicamente, a nível nacional e regional, para evitar que sejam responsabilizados por suas gestões? Afinal, fora a virtual consagração do princípio de não ingerência, a predominância de sistemas hiperpresidencialistas no subcontinente parece resguardá-los bem.
Ética e vontade política
E se este é o caso, não seria saudável para o Estado de direito retirar os poderes dos mandatários e concedê-los aos legisladores? "Não creio que os problemas citados se solucionem por meio de engenharia política, emendando detalhes no campo da lei", diz o especialista em política comparada do Instituto Ibero-Americano (IAI), Peter Birle.
– No final das contas, são sempre os políticos que decidem como usar os instrumentos legais à sua disposição – afirma, demonstrando estar pouco convencido de que a reedição das cláusulas democráticas da Unasul e do Mercosul garantiria uma ativação imediata quando forem exigidas. "Essas ferramentas sempre deixam espaço suficiente para diferentes interpretações", explica o especialista do IAI.
– Assim funcionam as relações diplomáticas entre esses Estados. Recordemos que eles têm experimentado, direta ou indiretamente, várias intervenções de potências estrangeiras que atacaram os governos legitimamente eleitos sob o pretexto de preservar a democracia na América Latina. O princípio da não interferência não surgiu do nada. Essa discussão é muito mais complexa do que parece – conclui Birle.