Dilma erra demais e fornece munição ao golpismo

Arquivado em:
Publicado Quinta, 12 de Março de 2015 às 12:00, por: CdB
DIRETO-CONVIDADO5.jpg
Colunista convidado, Mário Magalhães, comenta o panelaço e alerta quanto ao domingo Dilma com Ana Maria Braga: a presidente erra no ponto
Foram pífias as declarações de Dilma Rousseff, na segunda-feira, ao tratar do panelaço da véspera, promovido por cidadãos que não haviam votado nela em outubro e continuam, como é seu direito, esperneando contra o governo. Indagada sobre o impeachment a ser reivindicado em protestos programados para o domingo, a presidente constitucional tinha duas opções: calar, de modo a não dar corda ao movimento, ou repudiar a conspiração com palavras à altura do que se propõe: trata-se de golpismo, promoção de golpe de Estado, uma aberração ocorrida pela última vez há 51 anos e cujo conteúdo é desprezar a legitimidade da manifestação soberana dos brasileiros nas urnas. Em vez disso, Dilma falou em tom leve sobre “ruptura democrática'' e “terceiro turno''. Ao não pronunciar os substantivos golpe e golpismo ela se recusou a chamar as coisas pelo nome. Levantou a bola para os adversários cortarem, ao dizer: “Eu acho que há que caracterizar razões para o impeachment''.
cozinha.jpg
Por que não proclamar que, como não há razões para o impeachment (inexistem indícios sobre o envolvimento presidencial em falcatruas), sugeri-lo equivale a estimular golpe de Estado? Os rivais mais moderados repetiram as expressões da presidente e acrescentaram o “ainda'' e o “por enquanto'', duas tiradas que traem torcida e preferências (ninguém escreve “ainda'' não há provas de que Aécio Neves e Antonio Anastasia operaram juntos em jogadas obscuras). O discurso televisivo de um quarto de hora na TV, anteontem à noite, já constituíra erro de Dilma. Erro, não. Erros muitos. O maior foi, 48 horas depois da divulgação da lista de políticos a investigar na operação Lava Jato, conforme os critérios do procurador-geral da República, ir à televisão praticamente sem tocar no assunto, a não ser em uma ou duas frases enviesadas sobre corrupção. A presidente parece zonza, alheia ao mundo real e capturada pelas fantasias palacianas. Com a temperatura política altíssima no país, ela ofereceu uma ocasião favorável _o domingo à noite, com as famílias de classe média para cima em casa_ para que ocorresse o bate-panela. Depois de sumir por semanas, Dilma reapareceu nos últimos dias. Mas dar as caras na TV uma semana antes das manifestações que pedem o impeachment é de uma ingenuidade pueril. Fornece munição aos seus inimigos. A tendência, agora, é o comparecimento de muito mais gente. O conteúdo do que a presidente falou feriu o bom senso. Ao sustentar que a política econômica implementada em seu segundo mandato não ataca direitos dos trabalhadores, ela negou a realidade e confrontou os sindicalistas e militantes de movimentos sociais que preparam atos na sexta-feira, contra o arrocho _mas em defesa da democracia e a favor da soberania do sufrágio popular. Enquanto Dilma discursava, a UFRJ decidia adiar a volta às aulas porque não tem dinheiro nem para limpar as instalações universitárias. Na tela, papo. Na realidade, consequências do mal denominado “ajuste'', proposto por Aécio na campanha eleitoral e adotado por Dilma. O erro maior, na raiz dos demais, foi trocar o seu programa de candidata pelo do rival do segundo turno. Dilma submete-se a chantagens várias, descaracterizando o que havia de positivo em sua gestão (basta observar o aumento do imposto de renda, castigando os assalariados). Mesmo com estratégia duvidosa, é incrível o acúmulo de erros táticos. O que explica Mangabeira Unger no governo? Talento de administrador? Seria novidade. Ampliação da base no Congresso? Idem. O reforço de um formulador de talento? Fala sério. Enquanto confronta raposas na Câmara e no Senado, a presidente, como já fizera no primeiro mandato, cerca-se de auxiliares com autoridade política no máximo regional. Está brincando com fogo. Mais precisamente, com golpistas. Hoje estamos no 69º dia do governo Dilma Reloaded. O bebê lembra o jovem Benjamin Button. Mário Magalhães, nasceu no Rio em 1964. Formou-se em jornalismo na UFRJ. Trabalhou nos jornais “Folha de S. Paulo”, “O Estado de S. Paulo”, “O Globo” e “Tribuna da Imprensa”. Recebeu mais de 20 prêmios. É autor da biografia “Marighella – O guerrilheiro que incendiou o mundo”. Direto da Redação é um fórum de debates com jornalistas de opiniões diversas, editado pelo jornalista Rui Martins
Tags:
Edição digital

 

Utilizamos cookies e outras tecnologias. Ao continuar navegando você concorda com nossa política de privacidade.

Concordo