Desmatamento

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Publicado Quarta, 01 de Junho de 2005 às 17:22, por: CdB

Dramaturgia à parte, o drama existe. E já é uma tragédia, pronta e acabada. Até onde a Amazônia resistirá à destruição - feroz e veloz - da sua floresta?

No primeiro ano do governo de Fernando Henrique Cardoso, em 1995, o desmatamento na Amazônia foi recorde, impulsionado pelo sucesso (de custeio altíssimo, como se veria depois) do Plano Real. O primeiro ano do governo Lula, em 2003, manteve num patamar alto a média de desmatamento do consulado tucano, como se não houvesse mudança de direção no comando da administração federal, ideologias e retóricas à parte. Ainda era a inércia da gestão anterior - justificavam os petistas.

No primeiro ano com a indescartável marca do governo do PT, em 2004, porém, o desmatamento na Amazônia manteve a tendência de crescimento contínuo desde 2002 e infletiu ainda mais na direção da marca de 1995, que devolveu a Amazônia aos anos 80, do final do regime militar e do começo do populismo oligárquico, com José Sarney, em 1985.

Essa tendência manda um recado claro ao distinto público: sempre que a atividade econômica aquecer, por mais artificial que seja o aquecimento, tudo que canta a musa da ciência, da informação, do conhecimento e do saber sobre o melhor trato da Amazônia será mandado às calendas gregas, metaforicamente falando em linguagem neoliberal, ou às favas, em dialeto neoproletário.

A ordem de avançar será dada à ampla frente econômica sobre a maior fronteira de recursos naturais do planeta, com seus bulldozers e seu modo de fazer convencional, indiferentemente às sutilezas escondidas na maior floresta tropical da Terra e às recomendações do saber humano organizado sobre a maneira adequada de lidar com ela, no ainda onírico "desenvolvimento sustentável". A mata continuará a ir abaixo para que seu lugar seja ocupado pela forma de gerar produtos com lugar certo no mercado mundial (soja, gado, dendê, minério, etc). O resto é vã filosofia nesta carnavalesca Dinamarca tropical, com seu Hamlet otimista.

Entre 1960 e 1996 a Amazônia cresceu muito mais do que o Brasil. A evolução do PIB (Produto Interno Bruto) da região nesse período foi de 8,6% ao ano; o do país, 5,2%. A década do "milagre econômico" do regime militar, a dos anos 70, foi recorde: 11,7% de aumento médio anual do PIB no Norte e 8,5% no Brasil.
Nos anos 80, o dinamismo amazônico foi ainda mais destacado: seu PIB se expandiu a 7,8% a cada ano, enquanto a média nacional foi de bem menos do que a metade, 3,1%. Os seis anos tabulados por Aristides Monteiro Neto na década de 90 foram de baixa, mas ainda assim a taxa na Amazônia alcançou 4,8% ao ano, enquanto a brasileira ficou em 3,1%.

Antes da década de 60 do século passado, a perda da floresta nativa da Amazônia não havia chegado a 1% da superfície da região, que estava completamente por fazer. Agora a proporção é de 17%, ou 680 mil quilômetros quadrados, correspondendo a 8% do Brasil inteiro. Se a Amazônia Legal fosse só floresta, faltariam três pontos percentuais para chegar ao limite legal de desmatamento. Com justo título, teria que passar a chamar-se Amazônia Ilegal.
Os anos 70 e 80 certamente foram os mais devastadores (com o recorde total, muito superior ao de 1995, em 1987, durante o funcionamento da Assembléia Nacional Constituinte, que se dispunha a desapropriar imóveis rurais produtivos para a reforma agrária, provocando a ira devastadora dos proprietários rurais, na busca da benfeitoria, que os livraria da ameaça expropriante, afinal não consumada). Mas entre 1994 e 2004, período demarcado pelo Plano Real, o desmatamento alcançou um terço do total, ou 220 mil quilômetros quadrados. Uma área de tamanho equivalente a quase o São Paulo perdeu sua cobertura florestal em apenas 11 anos.

Nessas quatro décadas, o que se desmatou na Amazônia equivaleu a quase 20% da área desflorestada em todo mundo, 90% dessa destruição concentrada na América do Sul, África e Ásia. Nada indica que essa situação mude significativamente a curto

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