Rio de Janeiro, 23 de Abril de 2025

Das Primaveras Árabes ao Outono do Império

Houve um tempo, ainda no Brasil Império, em que cidades como Damasco, capital síria, ou Beirute, no Líbano, eram oásis humanistas em um mundo com a Europa em guerras constantes

Sexta, 16 de Outubro de 2015 às 12:00, por: CdB
Por Gilberto de Souza - do Rio de Janeiro Houve um tempo, ainda no Brasil Império, em que cidades como Damasco, capital síria, ou Beirute, no Líbano, eram oásis humanistas em um mundo com a Europa em guerras constantes, quando os EUA eram menos selvagens do que hoje. A construção de uma sociedade plurireligiosa e cada vez mais socialista, nestes países situados no entroncamento da Humanidade, ameaça o stablishment e coloca em risco a City londrina e sua filial, na Wall Street.
russia-siria.jpgSoldados russos treinam em base na Síria, onde combatem o Estado Islâmico
O extremismo religioso originário da Arábia Saudita, e sunita, sempre foi uma ameaça às sociedades seculares e democratas na região. A corrida ao petróleo promovida pelo Ocidente com os yankees na liderança, no auge do American Way of Life, desestabilizou o já frágil equilíbrio de forças e, com o advento da criação do Estado de Israel e a Guerra dos Seis Dias que se seguiu, o Oriente Médio passou a viver aos solavancos os dias que antecederam a atual crise humanitária que atinge centenas de milhares de pessoas. A Síria tem suas peculiaridades, como a manutenção dos Al Assad no poder há décadas mas, na outra extremidade, o profundo respeito à convivência entre todos os credos, os mais diversos e ancestrais de que se tem notícia. Imobilizados na luta contra o Estado Islâmico — de longe o grupo extremista mais consistente desde os califados medievais — os EUA se veem presos, de um lado aos acordos com os sauditas e, de outro, ao declínio da supremacia diplomática e bélica após fracassos na Líbia e no Magreb como um todo, sem contar o enclave no Iêmen. Para a distinta audiência, Washington esbraveja contra o EI mas, de fato, vinha mantendo os confrontos em fogo baixo, à espera de uma possível reação dos grupos religiosos tão extremistas quanto as bandeiras negras que proliferam na Síria, na luta contra o governo secular do presidente Bashar Al Assad. A intervenção russa, extremamente eficaz e precisa, em apenas alguns dias minou as defesas do EI, bem guarnecidas com equipamentos norte-americanos de última geração, e redefiniu o desenho geopolítico do Oriente Médio. Com a presença chinesa no Mar Mediterrâneo, segundo relatos de especialistas, aumenta a possibilidade dos coturnos marcharem sobre as áreas hoje dominadas pelos extremistas, entre elas Palmira, onde destruíram monumentos milenares, e Aleppo, onde decapitam e crucificam ‘infiéis’ de toda sorte. Esta nova realidade política na região serve como um janela aberta aos novos ares de um mundo plural, cada vez mais livre do domínio norte-americano na vida dos países onde resolve impor, à força, seu ponto de vista e seus costumes, na máxima: "If you want it. Take it. If you take it. Pay it" que, traduzido livremente, significa "se eu quiser, pego. Se pegar, pago por isso o quanto e quando achar mais conveniente". Por essas e outras, após patrocinar as desastradas 'Primaveras Árabes', os EUA agora vivem o 'Outono do Império'. Gilberto de Souza é jornalista, editor-chefe do jornal Correio do Brasil.
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