Uma pausa nas teclas de preços. Foi assim que as duas atendentes de um supermercado de Bangu receberam sua dança, encomendada por um amigo. Do estranhamento ao deleite, foram dois toques. “Adorei. Tudo o que faz parte da dança e da arte é maravilhoso”, disse Maria Elizabete Leocádia, 49 anos.
Uma pausa nas teclas de preços. Foi assim que as duas atendentes de um supermercado de Bangu receberam sua dança, encomendada por um amigo. Do estranhamento ao deleite, foram dois toques. “Adorei. Tudo o que faz parte da dança e da arte é maravilhoso”, disse Maria Elizabete Leocádia, 49 anos.
Na hora do exame pré-natal, realizado no Centro Municipal de Saúde Wladimyr Franco, em Bangu, a grávida Jane Teixeira, 28 anos, recebeu a dança encomendada pelo marido Lourenço, que assistira ao vídeo Fora de Campo na Lona Cultural. Ficou lisonjeada. Quem assistiu com ela também: “Linda a desenvoltura, os movimentos. Tá aprovado”, disse Lucinete Moraes de Oliveira, 60 anos.
O Pedra Branca Sport Clube estava deserto na segunda-feira à tarde. Zidane Alves Lima, 52 anos, radialista, abriu as portas do lugar para ali, no salão de festas, receber sua Dança Contemporânea em Domicílio. Depois da apresentação, contou que o espaço é também ocupado pela dança de salão e pela capoeira. Acha que a Zona Oeste precisa mais dança. Quer que o projeto volte mais para lá. Acredita que a dança ajuda, enleva.
- Aplausos para o artista - exclamou. Após uma trajetória de sete anos em festivais, eventos e espaços culturais e públicos no Brasil, Europa e África, o projeto Dança Contemporânea em Domicílio,da bailarina e coreógrafa Cláudia Müller, está realizando sua primeira temporada no Rio de Janeiro. Os casos citados acima são alguns dos 100 solos que a artista vem realizando, sempre a convites ou por sugestão de alguém, em locais nos quais este tipo de manifestação cultural não seja esperado, buscando espaços despercebidos, brechas no cotidiano. De graça, sempre.
- O objetivo é chegar ao público transformando qualquer lugar em espaço para a arte, integrando-a ao cotidiano - destaca esta paulista que adotou o Rio para viver há 16 anos.
O projeto foi contemplado pelo FADA 2012e patrocinado pela Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro e Secretaria Municipal de Cultura. Nas últimas duas semanas, Cláudia Müller se apresentou no Andaraí, Tijuca, Grajaú, Maracanã e Pavuna, entre outros. Dias 27 e 29 apresenta-se em Copacabana e Leme. Para agendar as apresentações, os interessados devem ligar para 21 9300-7896. Cada “sessão” tem duração de 5 minutos.
Cláudia Müller realiza apresentações nesta quinta-feira e sexta na Glória, Catete, Laranjeiras e Cosme Velho. A itinerância termina dia 30 de outubro atendendo a pedidos de interessados que vivam ou trabalhem em Santa Teresa.
Nascida e criada em São Paulo, Cláudia Müller tem 42 anos e 24 anos de carreira profissional, tempo em que atuou em companhias de SP, RJ e Alemanha. Sua formação inclui balé clássico, dança contemporânea e performance. Adotou o RJ há 16 anos, hoje vive em Santa Teresa. Aqui concluiu o mestrado em Artes Processos Artísticos Contemporâneos na UERJ com a pesquisa “Deslocamentos da dança contemporânea: por uma condição conceitual”, orientada por Ricardo Basbaum.
Integrou a Lia Rodrigues Companhia de Dança entre 1998 e 2000, quando partiu para uma carreira independente. Este é o quarto solo desde então. A criação do Dança Contemporânea em Domicílioabriga olhares pontuais para a produção artística e o fazer cultural. “Me interessam duas questões: o lugar do ofício do artista e a arte no cotidiano das pessoas. Não existe outro contexto para este trabalho, que lida diretamente com intervenção urbana, por exemplo”, reflete. Cláudia frisa que é fundamental dissociar o trabalho do artista de uma visão romântica. “Ao longo destes sete anos pude constatar a potência política do trabalho e a diversidade de reações que ocorrem nesta troca com o público”, conta.
A artista coleciona histórias marcantes de quem recebeu o seuDança Contemporânea em Domicílio. Em Belo Horizonte, um interessado viu a matéria sobre as apresentações e marcou uma sessão. Tratava-se de um grupo de dança afro que recebeu a exibição e depois retribuiu mostrando seu próprio trabalho à bailarina. De outra vez, um filho viu o telefone e o cartaz do projeto e convidou Cláudia para oferecer o solo para sua mãe no pós-operatório de uma cirurgia cardíaca. “O tempo todo ela ficou de mãos dadas comigo. Ao longo das apresentações cria-se um laço e o público me dá um retorno que raramente eu teria num palco convencional, com plateia formal etc”, diz.
Ironia das ironias, foram muitos anos de tentativa até Cláudia Müller conseguir mostrar este seu trabalho no Rio de Janeiro. Explica-se: os patrocinadores tinham certa dificuldade em compreender como a dança podia acontecer fora de um palco convencional. “Comecei sem dinheiro nenhum. Mesmo assim, é praxe a cada apresentação eu digo que a pessoa está recebendo uma entrega grátis, paga por alguém antes, ou seja, leio o nome dos apoiadores. Só então começo o solo”.
Ao longo da temporada no RJ no mês de outubro será realizado um blog com o registro da passagem do projeto pelos locais visitados através de depoimentos, textos e imagens (www.dancacontemporaneaemdomicilio.blogspot.com.br).
Até 2013, a artista lançará um livro com imagens, textos de críticos e jornalistas como Christianne Galdino, Isabel de Naverán, Ivana Menna Barreto, textos especialmente produzidos para o livro por Carlinhos Santos, Christine Greiner e depoimentos do público que receberá as entregas de Dança Contemporânea em Domicílio.
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